Sensibilidade de elefante

Segundo divulga o governo, as companhias inicialmente cadastradas devem aos cofres públicos a bagatela de R$ 150 bilhões. Isso cobriria com folga os buracos do quase certo atraso na renovação da CPMF e da Previdência Social. Só nos dois anos e quatro meses de vigência do programa, o governo amealhou R$ 3,5 bilhões que dava como perdidos e anuncia que pretende chegar ao final deste ano com mais R$ 2 bilhões em caixa.

O Refis foi criado no final de 1999 e permitiu que as empresas parcelassem suas dívidas com impostos e contribuições federais em suaves prestações, independentemente do tamanho da dívida. Pagando por mês um percentual mínimo sobre o faturamento, que vai de 0,3% a 1,5%, a maioria das empresas ganhou em média 50 anos para quitar seus débitos, mas algumas chegaram ao absurdo de 500 anos. O parcelamento implica, entretanto, o reconhecimento do débito de forma irretratável e a desistência de ações em curso na Justiça.

Mais: ao aderir ao programa, as empresas se comprometem a não atrasar mais o pagamento dos tributos, além, é claro, de quitar os valores convencionados da dívida. A falta de pagamento por três meses consecutivos ou seis intercalados pode levar à exclusão do programa. E foi isso que aconteceu. Agora, milhares de empresas estão num beco sem saída: reconheceram a dívida e, outra vez não podendo pagar, serão executadas pela Receita Federal. Isso representa o fim da linha em massa para a maioria delas, com todas as conseqüências que isso traz.

O coordenador-geral da dívida ativa da União, Agostinho Neto, assegura que as exclusões foram motivadas basicamente por inadimplência. E reconhece que, entre os diversos motivos para não pagar está aquele mais comum: não tinham condições de pagar. Sem separar o joio do trigo, isto é, os inadimplentes de má-fé daqueles em apuros, o governo atirou todos na vala comum dos sonegadores.

Ora, falta um pouco de sensibilidade ao governo. A lei que instituiu o Refis, mais que um ato de prodigalidade com contribuintes inadimplentes, foi o reconhecimento de que era necessário fazer alguma coisa para dar fôlego a quem está sufocado por uma excessiva e injusta carga tributária. De 1999 para cá, essa carga não só continua a mesma como aumentou. Seria natural que entre os inadimplentes de ontem, mesmo imbuídos de boa fé, houvesse recaída em massa. A execução pura e simples por parte do governo é apenas um dos erros na gestão de um programa que poderia – segundo cálculos otimistas – obter a adesão imediata de mais de meio milhão de empresas em dificuldades. Em sua sensibilidade de elefante, o governo não apenas mata a galinha dos ovos de ouro como, trabalhando contra si próprio, deixa de arrecadar.

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