Rumo à ética universal – Ronald Dworkin e o jurista-filósofo

Auto-análise. Os momentos de crise são oportunidades para reavaliação, pois atingem principalmente ?a raiz dos problemas? (Vieira, Waldo; Homo sapiens reurbanisatus. CEAEC Ed; Foz do Iguaçu, PR; 2003).

Crise Jurídica. Pensamos que o paradigma kelseniano, ainda predominante na prática jurídica tanto quanto nos meios acadêmicos, gerou a presente crise no Direito.

Perda. Este modelo – ultrapassado – desencadeou perda de identidade científica da ciência jurídica.

Núcleo. Constatamos com essa realidade que chegamos ao cerne do problema: a criação de uma geração de tecnocratas conseqüência do modelo das ciências naturais imposto ao Direito restringindo a ciência jurídica à tecnocracia.

Oportunidade. Aproveitar a crise é fundamental para desencadearmos profundas mudanças, reciclagens na maneira de compreender e agir e buscar soluções sem tentar justificar ou encontrar saídas intermediárias, conciliadoras e insuficientes, que procuram manter algo ultrapassado.

Renovação. A resposta passa pela adoção de novo paradigma científico, mais próximo da realidade do Direito como uma ciência social aplicada.

Neoperspectiva. Este tempo de reflexão nos permite olhar para novas abordagens e novas conclusões.

Filósofos. Nesta época de transformação encontramos pensadores que marcam presença com suas propostas ?controvertidas?, dentre eles, o professor de Harvard, Ronald Dworkin, importante marco histórico para ciência jurídica devido às suas idéias.

Ditadura filosófica. Conforme menciona o professor Ricardo Lobo Torres, os governos autoritários tiveram ambiente propício para se instalar, principalmente na América Latina, pois estavam sob a proteção, ideologia e prevalência da teoria positivista e kelseniana que forneciam os elementos necessários para legalizar e justificar seus atos (In. I Congresso Internacional de Direito Constitucional da Cidade do Rio de Janeiro; 30.11.05; Anotações pessoais).

Influência. As idéias de Hans Kelsen foram influenciadas por Weber o que nos faz questionar qual relação existente entre positivismo, facismo, controle e poder.

Formação acadêmica. Lembra-nos o professor Lenio Luiz Streck que, ainda sob o efeito positivista, nossas faculdades de Direito adotam currículo que privilegiam a formação de tecnólogos do Direito: escravos da lei e mero intérpretes desta, sem visão crítica mais aprofundada. (In. I Congresso Internacional de Direito Constitucional da Cidade do Rio de Janeiro; 30.11.05; Anotações pessoais).

Preguiça mental. Hoje, segundo o Doutor Lenio, a política educativa na área jurídica estimula a ?educação manualesca? em detrimento à leitura crítica, profunda, reflexiva dos tratados, da bibliografia clássica e dos pensadores da humanidade.

Fast food. Trata-se de fast food educativo, formação imediatista, com visão empresarial na sua maioria, descomprometidos com a construção de pensadores e profissionais polivalentes, críticos, autônomos e interdependentes.

Receita. O ?bom professor? passa a ser aquele que fornece respostas prontas e soluções matemáticas às controvérsias sociais e não aquele que ensina a pensar.

Ilusão. A resolução lógico-matemática é incapaz de dar conta do complexo universo humano e suas inter-relações.

Robotização. A ideologia kelseniana transformou-se em ditadura tecnológica, escravizando o pensador do Direito, limitando sua capacidade mental a aspectos técnicos, hermeneuticamente regrados, unidimensionais em sua concepção.

Rigidez. Esta estrutura científica atual enrijece a ciência, cria dogmas, afasta o questionamento e mantém lacuna intransponível, pois justifica sua incapacidade de dar conta dos conflitos sob o argumento de que ?o Direito é separado da moral? como se fosse possível dividir e segmentar os atributos humanos.

Lei e moral. O professor Luís Roberto Barroso afirma que vivemos uma crise moral e valorativa em todos os segmentos sociais inclusive no Direito, e que Ronald Dworkin representa a interpretação moral da Constituição.

Moral e Direito. Diz o professor americano que o Direito deriva dos direitos morais e que os juízes, sendo aplicadores do Direito, precisam tornar-se filósofos uma vez que eles e a ciência jurídica lidam com questões que os filósofos se deparam há séculos (Dworkin, Ronald. A Matter of Principle. Harvard University Press; Cambridge, Massachusetts; 1995).

Solução. Recorda que o Direito sendo ciência social aplicada precisa se responsabilizar e resolver estas questões filosóficas.

Conceito. Mostra o filósofo americano que o dia-a-dia do Direito necessita resolver os fatos e responder questões cujos desenlaces só aparecerão se recorrer a conceitos morais intimamente conectados aos conceitos legais, tais como:

– significado de liberdade

– compreensão de vida

– noção de igualdade

Fatos. Algumas situações exemplificam estes dilemas com os quais o jurista precisa aprender a lidar:

– liberdade sexual e casamento de homossexuais;

– aborto de bebê anencéfalo; pesquisas com células-tronco; eutanásia; transplante facial;

– cotas universitárias, meritocracia, acesso à educação.

Desmitificação. Dworkin faz cair os mitos da imparcialidade e da separabilidade entre Direito e moral.

Falácia. Analisa argumentações judiciais e menciona que, quando matérias políticas chegam às cortes, as análises são mais principiológicas do que político-legais.

Responsabilidade. Assevera o pensador que o desafio da área jurídica neste século é assumir sua responsabilidade e parar de utilizar escapismos protegidos pela égide positivista normalmente encobertos por frases do tipo: ?não precisamos?, ?nem somos filósofos?, ?isto é do âmbito e da competência da moral?.

NeoDireito. Aponta ser fundamental para auto-superação do Direito que os juristas assumam suas responsabilidades não se escondendo ou se justificando atrás de tecnicismos puros ou sofismas cuja finalidade é fugir ao posicionamento diante dos casos difíceis – hard cases.

Educação. Propõe que a mudança deve iniciar pela educação e pela reestruturação do currículo das faculdades de Direito.

Revisão. Compreendemos que o novo Direito repassa pelo imperativo categórico de Kant e avança para a ética universal aplicável, diária.

Separação. Kant separava ?ser? e ?dever ser?, ou seja, moral e Direito.

Re-interpretação. O novo olhar kantiano implica em nova hermenêutica de seu imperativo categórico: seria norma de caráter jurídico e não apenas de caráter moral.

Inserção. Pensadores modernos afirmam que a solução das crises passa pela moralização do Direito e pelo ingresso dos princípios morais. Como fazer isto?

Paradigma. Através da introdução e aplicação do paradigma multidisciplinar e do neoparadigma consciencial.

Abertura. Alguns desenlaces têm sido alcançados por princípios de ordem moral, mas que agora, são também princípios jurídicos, uma vez que entraram no direito brasileiro, permitindo legitimar os primeiros, dentre outros: princípio da ponderação, princípio da coerência e princípio da razoabilidade.

Função. A visão principiológica auxilia o papel do jurista que pode compreendê-los e aplicá-los concretamente com lucidez, discernimento e ética.

Assistência. Lenio Streck diz que o Direito existe para resolver problemas práticos, para enxergar o sujeito no mundo e ajudá-lo: trabalha com a hermenêutica filosófica.

Visão. Na esteira deste movimento, concluímos que nosso problema é paradigmático.

Significado. É fundamental reassumirmos que o sentido está na pessoa e não na coisa: o paradigma da consciência nos auxilia a aproximar Direito e ética, mas principalmente, Direito e ética universal (ou cosmoética).

Adriana de Lacerda Rocha é doutoranda em Ciências Jurídicas e Sociais pela UMSA – Universidad Del Museo Social Argentino, mestre em Direito Constitucional pela PUC-RJ. Advogada da OIC – Organização Internacional de Consciencioterapia e voluntária da Conscienciologia em Foz do Iguaçu – PR. Autora de vários artigos e do livro ?Autonomia Legislativa Municipal?, Ed. Lumen Juris. alrocha@kiwiocas.net

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