Retrocesso

Já estamos comemorando meio ano de crise com um desfile de CPIs sobre um mar de lama e a nossa política está longe de melhorar. Certamente não satisfazem os anseios da população duas, três ou mesmo que seja uma dúzia de cassações, algumas renúncias premiadas e ninguém indo para a cadeia. Revela-se que dinheiro do grosso, recolhido de forma irregular ou mesmo ilegal, e muito provavelmente pertencente à nação, financiou campanhas. Que muita gente, de cabo a rabo, de baixo ao topo, foi eleita ilegalmente, financiada com dinheiro obtido até via chantagens. E que, mesmo sendo nulas ou anuláveis tais eleições, eles continuam nos cargos, salvo uns poucos que renunciaram para não serem cassados e perderem por alguns anos seus direitos políticos. Agora voltarão de barriga cheia para os postos eletivos.

Tudo o que aconteceu e ainda está acontecendo, descoberto ou denunciado, indica a urgente necessidade de uma reforma política imediata e profunda, mas ela não acontecerá para 2006 e talvez nem para 2008 e 2010. É que a turma do mal é maior e mais ativa que a turma do bem. E entre os desta última, há os que ficam no difícil dilema de moralizar ou deixar tudo como está, pois, assim, só o Brasil e a nossa democracia são prejudicados. Eles próprios aproveitam os defeitos do sistema.

De mudanças, a única que parece vai sair é o fim da verticalização, a única mudança do bem que havia sido feita. Seu fim significa um escandaloso retrocesso, mas parece certo que vai acontecer. A verticalização passou a obrigar que as alianças partidárias se fizessem de cima até em baixo. Que quando dois ou mais partidos se aliassem nas eleições para cargos federais, só pudessem realizar alianças, nos níveis estadual e municipal, com os mesmos partidos. Nada de um petista aliado a um liberal para presidente e, em cada estado, coligações as mais variadas, ao sabor de interesses políticos de grupos ou mesmo pessoais.

A inexistência da verticalização significa a falência declarada dos partidos políticos que, assim, revelam que não têm ideologias nem programas ou projetos. As agremiações se descaracterizam e o povo é obrigado a votar em pessoas e não em idéias. Ou em pessoas sem idéias. Isto é ruim, péssimo, pois os eleitos sobem ao poder, seja Executivo ou Legislativo, sem obrigação de seguir programas e idéias, podendo lá realizar o que bem entendam. Ou nada fazer. E ao eleitor não resta mais que lamentar as promessas não cumpridas.

Alguém já escreveu um dia que se deve discutir idéias e que é mediocridade discutir pessoas. A nossa política adota um sistema de indiscutível mediocridade. O ideal seria que, votando em partidos e seus programas e ideologias, a gente pudesse assistir à realização de nossas aspirações. E se não as realizassem, mudando de legendas ou no município seguindo uma linha, nos estados outra diferente e no governo federal coisas distintas, a gente pudesse ver os vira-casacas sendo defenestrados, excluídos, cassados. Vale mais a expressão defenestrar, que significa jogar pela janela.

A crise, além de estar ameaçada de se transformar em uma enorme pizza, nada ensinou aos nossos políticos. A única mudança que estão fazendo é o fim da verticalização, um retrocesso, tornando o sistema eleitoral pior ainda do que está. Se é que pode ficar pior.

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