Repercussão no âmbito estadual da criação dos Juizados Especiais Federais

Com o advento da Lei 10.259/01, a qual instituiu os Juizados Especiais na Justiça Federal, acha-se inserido no nosso ordenamento jurídico um novo conceito de infração de menor potencial ofensivo, ante o disposto no art. 2.º, parágrafo único da nova lei:

“Consideram-se infrações de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, ou multa”.

Primeiramente, é importante ter em mente que o comando do art. 98, inciso I, da Carta Magna, o qual prevê a criação dos Juizados Especiais, não fez distinção entre o âmbito federal e estadual.

Nesse contexto, o novo conceito formulado pela Lei 10.259/01 deve-se estender também as infrações de competência estadual, seja em razão do princípio constitucional da igualdade, instituído no art. 5.º da Magna Carta, seja pela aplicação do art. 2.º, parágrafo único, do Código Penal, segundo o qual: “A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado”.

Ademais, a Justiça Federal não é considerada uma Justiça Especial, mas Comum e, simplesmente o fato de ser da esfera federal não justifica o tratamento diferenciado dado às duas leis, no que se refere à conceituação do que sejam crimes de menor potencial ofensivo.

Aceitar definições diferentes implica em agredir a igualdade Constitucional, pois por exemplo: quem desacata autoridade estadual não pode estar impedido de valer-se dos direitos que são concedidos a quem desacata autoridade federal. A desigualdade de tratamento para situações idênticas configura evidente desproporcionalidade e fere o tratamento isonômico que deve ser aplicado.

Outrossim, a Lei Federal não fez qualquer ressalva aos procedimentos especiais, motivo pelo qual se entendemos que a nova norma redefiniu quais são as infrações penais de menor potencial ofensivo, devemos entender, também, que foi eliminada a antiga exceção de forma a incluir agora no âmbito dos Juizados Criminais Estaduais os delitos com rito especial.

Nessa linha de entendimento, tem-se o posicionamento do renomado Luiz Flávio Gomes:

“Se a fonte normativa dos Juizados é a mesma (legislação federal: Lei n.º 9.099/95 e Lei n.º 10.259/01) não se pode concordar com o argumento de que ele quis instituir dois sistemas (distintos) de juizados: um federal diferente do estadual. Se o legislador pretendesse isso não teria mandado aplicar (por força da Lei n.º 10.259/01) praticamente in totum a Lei n.º 9.099/95 aos juizados federais. Teria criado um sistema jurídico ex novo” (…)

O art. 2.º, parágrafo único, da Lei n.º 10.259/01, alterou (derrogou) o conceito anterior em dois pontos: a) no limite máximo (agora crimes até dois anos são de menor potencial ofensivo) e b) no que diz respeito aos procedimentos especiais (porque a nova lei nada fala sobre isso)”.

(Luiz Flávio Gomes, Lei dos Juizados Criminais Federais e seus Reflexos no Âmbito da Competência dos Juizados Estaduais, Artigo publicado no Jornal Síntese n.º 60 – Fevereiro/2002, pág. 18).

Ante o exposto, atendendo ao princípio constitucional da igualdade e ao princípio da retroatividade da lei mais benigna, a competência para processamento e julgamento do delito cuja pena máxima não exceda a dois anos, passou a ser das respectivas Turmas Recursais Estaduais, para onde os feitos devem ser remetidos.

Cássia Becker

é advogada e pós-graduanda do Curso de Especialização em Direito Penal e Processual Penal do UnicenP – Centro Universitário Positivo.

Voltar ao topo