Quem tem medo de CPI?

O estrago político está feito. O governo petista já reproduz a política econômica tucana e patina na área social. Agora o escândalo envolvendo o ex-assessor parlamentar da Casa Civil, Waldomiro Diniz, num esquema de propina e achaque, macula o que lhe restava de genuíno – o padrão petista de fazer política. E esse padrão, se já tinha o lado feio escondido por detrás do biombo da ética, agora descamba para o inimaginável: o governo ordena, com todas as forças, que a idéia da apuração através de uma CPI seja rejeitada.

Trava-se um falso debate em Brasília. Em vez de mostrar que não transige, de fato, com a corrupção, o governo de Lula se enrosca nas tentativas de rotular como essencialmente políticas as questões que são de ordem eminentemente policial envolvendo políticos importantes. A crise, assim, se aprofunda. O ministro José Dirceu some do mapa, o Executivo faz de conta que o problema é com o partido, e o Congresso, que reabre em temporada normal para outra legislatura, em vez dos altos temas de interesse da Nação, tromba com esse prato indigesto que azeda todo o programa de reformas já adiadas pelo caldeirão eleitoral do ano em curso.

O presidente do PT, José Genoíno, garante que a agremiação que preside “não será conivente com nenhum tipo de corrupção”. Mas e esta sobre a qual acabamos de receber a notícia não seria corrupção? E não estaria a envolver (pela proximidade, amizade, e tudo o mais) exatamente o presidente anterior do partido, hoje ocupando as elevadas funções de ministro chefe da Casa Civil – o homem forte do governo de Luiz Inácio Lula da Silva? Tem o PT uma oportunidade de ouro – talvez não lhe restem outras – para mostrar que é diferente.

Mas o que se desenha no cenário de um governo atordoado pela violência de um fato que não pode ser contestado (afinal, dizem, as gravações são de boa qualidade!) vai numa direção diferente. Dizem em Brasília que o que interessa é chegar logo aos autores das gravações. Como se elas, que denunciam os crimes, constituíssem ato pior que os próprios crimes. “Com certeza alguém facilitou as filmagens”, afirmam agentes do Estado destacados para investigar o imbróglio. Ora, o que interessa saber, no fim das contas, é todo o envolvimento de Diniz numa teia de corrupção, propina e achaque, e todos os que se beneficiavam dela, sejam candidatos, partidos ou não. Nem que, de fato, tais investigações venham a minar a reputação de homens importantes no atual (ou em qualquer) governo.

Os indícios à mostra recomendam – já dissemos aqui – o aprofundamento das investigações em todas as frentes. Incluindo essa Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI, instrumento que o governo do PT soube usar e abusar em seu longo e produtivo período de oposição. É preciso saber como é que um homem como Diniz pode, durante tanto tempo, gozar de privilégios, amizades e obter cargos sem que seu, ou seus patrocinadores, se não estavam com ele conluiados, ao menos não desconfiassem de suas atividades. Como se sabe, Diniz já prestava serviços à CUT e ao PT em 1992. De lá para cá, apenas cresceu – além de cargos maiores, certamente com interesses maiores, incluindo aqueles de figura-chave nas negociações com parlamentares para a liberação de emendas.

Assegura-se em Brasília que por trás deste episódio existe um dossiê do Ministério Público Federal dando conta de que a relação de políticos importantes com jogos de azar, do bicho, bingos e coisas do gênero não se restringe a Brasília, mas avança sobre estados como Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul. Ora, isso já é suficiente para corroborar a tese segundo a qual a desenvoltura com que agia Diniz (mas era só ele?) tinha como pressuposto a conivência, e provável participação, de gente muito graúda e importante. Como se disse alhures, ele seria apenas a ponta de um enorme iceberg. Então – quem tem medo de CPI? – por qual motivo não ir logo até o fundo, doa a quem doer?

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