Proposta de emenda à Constituição elimina a unicidade sindical

O Departamento Intersindical de Assessoria Sindical (DIAP) teve acesso a anteprojeto de proposta de emenda à Constituição (PEC) que altera os artigos 8.º, 11 e 37, com base na sistematização do Fórum Nacional do Trabalho, elaborado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, a ser encaminhado ao crivo da Presidência da República. Em destaque, o anteprojeto revoga o inciso II do artigo 8º, eliminando o sistema da unicidade sindical, pelo qual, na redação vigente, “é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município”. Com a revogação deste inciso, não somente é eliminada a unicidade, assim como desconstituído o conceito de categoria profissional e econômica. Também é excluída a limitação geográfica do sindicato nunca inferior ao município, podendo, em conseqüência, ser fundado o sindicato por empresa. A proposta introduz o sistema do plurisindicalismo, como acentua Marcos Verlaine, assessor parlamentar do DIAP em seus comentários ao texto na página eletrônica do DIAP. Consideramos que o anteprojeto é nocivo à organização sindical dos trabalhadores e dos empregadores, ao eliminar o sistema da unicidade sindical, desconstituir a organicidade existente pela representação por categorias, fragmentar a representação ao permitir a existência do sindicato por empresa. No inciso IV, a alteração proposta pretende eliminar o sistema confederativo de representação profissional e econômica. Embora não mencionado, deverá ser mantido o inciso VIII, sobre a estabilidade no emprego do dirigente sindical e do candidato nos pleitos sindicais, embora não haja explicitação a respeito. Publicamos a versão divulgada pelo DIAP na esperança de que a mesma não venha a ser acatada pelo governo federa, não sendo remetida ao Congresso Nacional.

“PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO: Altera dispositivos dos artigos 8.º, 11 e 37 da Constituição Federal e dá outras providências.

Art. 1.º Os arts. 8.º, 11 e 37 da Constituição passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 8.º É assegurada a liberdade sindical, na forma da lei observando o seguinte:

I – A – o Estado não poderá exigir autorização para fundação de entidade sindical, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção nas entidades sindicais;

I – B – as entidades sindicais deverão atender a critérios de re-presentatividade, liberdade de organização, democracia interna e de respeito aos direitos de minoria;

I – C – as entidades sindicais têm o direito de filiação às organizações internacionais;

II – (revogado)

III – às entidades sindicais cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais no âmbito da representação, inclusive em questões judiciais e administrativas; (NR)

IV – a contribuição de negociação coletiva fixada em assembléia geral e a mensalidade dos associados da entidade sindical serão descontadas em folha de pagamento; (NR)

V – ninguém será obrigado a filiar-se ou manter-se filiado a entidade sindical; (NR)

VI – é obrigatória a participação das entidades sindicais na negociação coletiva; (NR)

VII – o aposentado filiado tem direito a votar e ser votado nas entidades sindicais. (NR)

“Art. 11 – É assegurada a eleição de representantes dos trabalhadores com a finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os empregadores, na forma da lei”. (NR)

Art.37 ….

VII – a negociação coletiva e o direito de greve serão exercícios nos termos e nos limites definidos em lei específica;”(NR)

Art. 2.º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação”.

Além da publicação da versão divulgada pelo DIAP relativa ao texto da proposta de emenda constitucional, teria sido elaborada proposta de exposição de motivos do Ministro do Trabalho e Emprego, que também consideramos oportuno divulgar:

“PROPOSTA DE EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA: Honra-me elevar à sua apreciação anteprojeto de Emenda Constitucional que permitirá viabilizar uma ampla reforma sindical, dentro dos princípios da liberdade e autonomia sindical. A Reforma da Legislação Sindical é um dos mais caros compromissos de mudança desta gestão, em função do atraso estrutural das normas vigentes. Permitir uma organização sindical realmente livre e autônoma em relação ao Estado, além de fomentar a negociação coletiva como instrumento fundamental para a solução de conflitos, são objetivos essenciais para o fortalecimento da democracia e estímulo à representatividade autêntica. A proposta altera os art. 8.º e 11.º do vigente Texto Constitucional, exatamente no que tange aos comandos fundamentais para que de aprove posteriormente uma legislação ordinária que atenda aos objetivos supra citados. Além disso, com o objetivo de viabilizar a negociação coletiva no serviço público por meio de lei específica, adaptando-se aos postulados de liberdade sindical no âmbito da Administração, necessário se faz o acréscimo ao inciso VII do art. 37 da Constituição Federal, conforme proposto. As alterações que são exigidas no art. 114 da Constituição serão oferecidas após a conclusão da votação da Proposta de Emenda destinada à Reforma do Poder Judiciário, que se encontra em estado avançado de tramitação no Congresso Nacional. A superação dos obstáculos constitucionais à modernização do sistema de relações coletivas de trabalho é a base para a constituição de uma atmosfera de ampla liberdade e autonomia sindicais, sem a qual persistiremos prisioneiros de um sistema estigmatizado pelo artificialismo em seus mecanismos representativos. Para deixar absolutamente transparente o debate público e parlamentar, já foi elaborada, de acordo com os compromissos construídos pelo Fórum Nacional do Trabalho, o projeto de lei que dará conseqüência ao processo de Reforma Sindical, se o Congresso aprovar esta Proposta de Emenda Constitucional, da forma como a propomos. Se ocorrerem alterações pelo soberano Poder Legislativo, providenciaremos as adequações pertinentes. Assim, Exmo. Senhor Presidente da República, damos mais um passo inequívoco ao processo de modernização institucional liderado por Vossa Excelência. Com meus respeitos, segue à consideração de Vossa Excelência. Brasília, … 2004. O Ministro de Estado do Trabalho e do Emprego”.

No ver do jornalista Antônio Augusto de Queiroz, do DIAP, a proposta de emenda constitucional remete “(a) para a lei a regulamentação dos preceitos constitucionais em matéria sindical, inclusive no que diz respeito à abrangência do poder de negociação, dando ampla liberdade ao legislador para desenhar o modelo de negociação e de organização sindical, desde que não contrarie os enunciados do texto constitucional modificado; (b) institui o critério de representatividade, de liberdade de organização, de democracia interna e de respeito aos direitos de minorias, o que poderá ensejar, na lei e no próprio estatuto, a proporcionalidade de chapas na direção sindical; (c) autoriza a instituição da pluralidade sindical, desde que respeitados os critérios previstos no item anterior; (d) elimina o conceito de categoria profissional e econômica, sem instituir ramo ou qualquer outro conceito, podendo a entidade sindical representar apenas e exclusivamente seus associados; (e) acaba com a unicidade sindical, com o sistema confederativo e com a contribuição sindical compulsória; (f) reconhece as centrais sindicais como entidades sindicais, podendo, nos termos da lei sindical, se estruturar organicamente, criando suas confederações, federações e sindicatos; g) reconhece, nos termos de lei específica, o direito de negociação e de greve dos servidores públicos; h) deixa para a reforma do Judiciário a definição do papel da Justiça do Trabalho, inclusive a eliminação do chamado poder normativo; e i) não altera o texto sobre o direito de greve, mantendo a possibilidade de os líderes sindicais responderem penal e civilmente por eventuais abusos no exercício do direito de greve”(vide www.diap.org.br).

Em verdade, a prevalecer este anteprojeto – o que esperamos não aconteça, com sua revisão pelo próprio Ministro do Trabalho e pelo Presidente da República – ocorrerá a absoluta fragilização do movimento sindical dos trabalhadores.

A notícia do DIAP inclui, ainda, a informação de que estaria finalizado o trabalho de redação do anteprojeto de lei de relações do trabalho com 237 artigos abrangendo, dentro vários temas, a nova organização sindical, organização por local de trabalho, direito de greve, custeio das entidades sindicais, negociação coletiva e contrato coletivo, criação do Conselho Nacional de Relações do Trabalho Este anteprojeto também está em revisão pelo Ministério do Trabalho para encaminhamento ao Presidente da República (maiores detalhes: www.diap.org.br). Finalmente, cumpre lembrar que o Fórum Nacional do Trabalho, sob coordenação do Ministério do Trabalho e Emprego, já deu início aos debates sobre a reforma da legislação do trabalho. Para análise das questões sobre a reforma sindical estará em Curitiba, no mês de novembro, o Secretário de Relações do Trabalho do MTE, Osvaldo Martinez Bargas, dentro da programação de debater com o movimento sindical dos trabalhadores e empregadores a proposta do Fórum Nacional do Trabalho.

Edésio Passos

é advogado. E.mail:
edesiopassos@terra.com.br

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