Preparando a guerra

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aconselha à nação que tenha a paciência de um pescador. Mas essa linguagem paz-e-amor não encontra ressonância na cabeça das lideranças do Movimento dos Sem-Terra – MST. “Está na hora de falar menos e fazer a reforma agrária, pois (isso) vai começar a ser cobrado pelo povo”, respondem os principais cabeças do movimento já um dia considerado um dos braços do partido criado e, durante muito tempo, presidido pelo ex-sindicalista Lula. E como a ordem é falar menos e agir mais, o MST promete fazer a sua parte: até o final deste ano, quer o trunfo de 120 mil acampados de norte a sul. O objetivo? Forçar o governo do companheiro Lula a acelerar a reforma agrária.

O número colocado à frente como um objetivo não envolve os acampados matriculados em outros movimentos, e representa exatamente o dobro do pessoal envolvido na mesma situação no último mês de governo do presidente Fernando Henrique Cardoso.

Porque “não dá mais para aguardar”, a ordem é radicalizar. Num primeiro tempo, a mobilização próxima de cidades, com a máxima “visibilidade” possível. Se o governo não entrar no ritmo esperado (e esse ritmo pode ser apenas um discurso), o plano é invadir o que estiver pela frente. “Do acampamento para a ocupação, esse é o nosso arroz com feijão”, avisa o coordenador nacional do movimento, João Paulo Rodrigues.

“Existe muita terra para ser distribuída” e por isso os mais radicais do movimento – incluindo José Rainha – passaram a assumir a linha de frente das ações. Mas, apesar dos métodos, eles não aceitam o rótulo de radicais. Um desses líderes – Jaime Amorim -, que responde a 120 processos na Polícia Federal, se autoclassifica de pacifista, pois “temos sido muito complacentes com o latifúndio que extorquiu nosso povo durante 500 anos”. Outro, de nome Gilmar Mauro, filosofa: “Se a classificação de radical é feita por fazermos ocupações em latifúndios num País onde 1% dos proprietários detém quase 50% das terras, onde não há no campo assistência médica e ainda existem resquícios de trabalho escravo, onde há 30% de camponeses analfabetos, diria que nós não somos radicais, nós somos pacatos demais”.

Apesar da rima, não é o que pensam, do outro lado, os que dirigem entidades de fazendeiros e produtores rurais, que acompanham com preocupação a mobilização dos sem-terra. O presidente da União Democrática Ruralista, Luiz Antônio Nabhan Garcia, teme que o governo perca o controle da situação. Por isso garante que os produtores rurais também estão se mobilizando para reagir em caso de invasões previsíveis. E adverte: “A continuar nesse ritmo, teremos uma convulsão no campo”. O presidente do Movimento Nacional dos Produtores – MNP, João Bosco Leal, por sua vez, entende que o governo deve expor de forma rápida e clara seus objetivos na questão agrária e abrir diálogo com as partes. Antes que seja tarde.

Os preparativos para o confronto, assim, estão sendo realizados em todo o Brasil. Excetuam-se apenas o Amazonas, Acre e Amapá. Somente no Paraná, sem os números de maio e junho, formaram-se 28 novos acampamentos – passando de nove mil para treze mil o número de famílias acampadas. Segundo Roberto Baggio, um desses líderes à frente da nova investida, “tínhamos uma demanda reprimida durante o governo de Jaime Lerner que agora aflorou”. Segundo ele, “o Paraná é de camponeses e isso faz com que mais gente se aliste no movimento”. Em todo o Brasil, o número estimado de acampamentos passaria já de 650.

Diz um velho ditado que “quem semeia vento colhe tempestades”. Esperemos que as tempestades, já previsíveis, sejam amenas. E o companheiro presidente Lula saiba como tratar a questão para evitar o pior para o País.

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