Preocupação com as reformas

O professor Boaventura de Souza Santos, da Universidade de Coimbra, denuncia a estranheza das críticas que têm sido feitas ao Judiciário com a globalização e o intrigante interesse político pelos Tribunais e pela reforma do sistema judiciário. A Agência Americana de Apoio ao Desenvolvimento (Usaid) tem como prioritários os programas de reforma judicial, tanto assim que o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) têm proporcionado valiosos financiamentos para a denominada reforma do Judiciário em diversos países. Será que o objetivo das agências internacionais é tornar o Poder Judiciário ágil, rápido, acessível ao povo e eficaz?

A resposta, segundo as luzes do próprio professor Boaventura de Souza Santos, é de que esses objetivos globais são a criação de um sistema jurídico e judicial adequado à nova economia mundial de raiz neoliberal. Um quadro legal e judicial que favoreça o comércio, o investimento e o sistema financeiro. Longe de fortalecer a democracia esse sistema favorecerá o mercado. É desejo dos juízes uma reforma efetiva que possa tornar o Poder Judiciário ágil e eficiente. Acredita-se ser possível alcançar tal intento, desde que a classe política formada por deputados e senadores conscientes de suas altas responsabilidades perante a nação denunciem a iniqüidade e temeridade de algumas propostas que retiram garantias de independência dos magistrados com objetivos escusos e não justificáveis.

Os investimentos dirigidos à reforma do Poder Judiciário pelas agências internacionais só têm enfraquecido o Judiciário como Poder. De regra, o dinheiro entra no País por meio do Ministério da Justiça (Poder Executivo) que ao invés de investir no Poder Judiciário, só dirige investimento nas soluções alternativas. É o recente exemplo da Argentina que, após os investimentos internacionais, instituiu a mediação obrigatória sem qualquer preocupação com o Poder Judiciário que está a cada dia mais enfraquecido e desmoralizado. No Brasil, a tentativa de alguns senadores da República de acabar com a Justiça do Trabalho até agora não foi bem explicada. As reformas já conseguiram o enfraquecimento dessa justiça que é exemplo de justiça social e tem processo e procedimento célere e muito avançado.

De 1990 até 1998 a Justiça do Trabalho recebeu 15.473.880 novos casos e, apenas no ano de 1998, julgou 2.333.912 casos. Se fosse extinta a Justiça do Trabalho, como queriam alguns congressistas, o que faríamos com mais de dois milhões de ações recebidas por ano? Alguns indicam o caminho da arbitragem como ocorre no Japão. Será que aqui os direitos do cidadão seriam respeitados? Parece que não. No fundo, os neoliberais de hoje continuam acreditando na idéia de que “o mercado tudo resolve”. Sob o discurso de corrigir impropriedades do sistema, escondem-se interesses não muito claros. O desejo geral dos juízes é acabar com a corrupção e proporcionar uma justiça rápida, ágil e eficaz. Se o verdadeiro interesse dos operadores do direito é propiciar uma melhor resolução dos conflitos para o povo, nada impede que assim se faça. É essa a reforma que todos querem e de que o povo tanto precisa. Não se tem percebido que problema fulcral do Judiciário é a falta de investimento, para melhor estruturá-lo, notadamente em primeiro grau, onde os juízes mantêm o primeiro contato com o povo.

Continuemos nossa luta por uma Justiça melhor.

Só assim se justificam as reformas.

Roberto Portugal Bacellar

é presidente da Associação dos Magistrados do Paraná.

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