UM MONTE DE IRREGULARIDADES

Tribunal de Contas diz que toda publicidade da Câmara de Curitiba é inconstitucional

Concluída no último dia 21, a instrução inicial da Diretoria de Contas Municipais (DCM) do Tribunal de Contas do Estado, que pede uma tomada de contas especial dos contratos de publicidade da Câmara de Curitiba considera todo o processo, em que a Câmara investiu R$ 33,9 milhões em publicidade entre os anos de 2006 e 2011, inconstitucional.

A DCM considerou que houve direcionamento da licitação, disse ser irregular a participação de Cláudia Queiroz Guedes na licitação por ela ser funcionária da Casa, percebeu itens do edital não cumpridos pelas duas agências, remunerações acima do estabelecido por contrato e ausência de retenção de impostos devidos pelas empresas ao município, entre outras irregularidades.

Mas a principal questão levantada na instrução foi a inconstitucionalidade da contratação, pela Câmara, de qualquer serviço de publicidade, considerando o gasto de R$ 33,9 milhões como despesa indevida.

A instrução inicial é apenas a fase inicial do processo no TCE, que se acolhida pela Corte e transformada em tomadas de conta especial, terá um trâmite de três meses, para averiguações in loco notificação das partes e análise da defesa. É na tomada de contas que eventuais sanções poderão ser sugeridas.

A instrução lembra que a Constituição Federal libera a publicidade de órgãos públicos para atos oficiais, divulgação de atos, programas, obras, serviços e campanhas, e os anúncios deverão ter “caráter educativo, informativo ou de orientação social, não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”.

De acordo com o documento, assinado por três analistas da DCM, os recursos gastos pela Câmara com publicidade tratam-se de “notícias pagas veiculadas em meios de comunicação, dentre as quais diversas pouco têm de institucional, sendo voltadas mais a promover o trabalho de determinado vereador, quase nada tendo de caráter educativo, informativo ou de orientação social. Aliás, é emblemático que a amostra trazida aos autos pela Câmara contenha, inclusive, notícias pagas sobre a Câmara e seus vereadores em colunas sociais”, diz o documento.

“Além da possível inconstitucionalidade dos gastos da Câmara, discute-se a própria necessidade de a Câmara contratar agência de propaganda para sua publicidade. É muito provável que a publicidade da Câmara não tenha tido amparo na Constituição, constituindo-se em despesa indevida”, complementa.

Veículos múltiplos

Os analistas também ficaram impressionados com a quantidade de veículos de comunicação em que a Câmara divulgou sua publicidade. A relação, contida na instrução, contém 302 veículos e aponta desde grandes empresas de comunicação até jornais de bairros e associações, passando por rádios, sites e blogs.

Até mesmo jornais de outros municípios (Colombo, Mandirituba e Almirante Tamandaré, por exemplo) receberam recursos da entidade. Segundo a instrução, a contratação de tantos veículos de comunicação desperta dúvidas quanto à finalidade da publicidade da Câmara.

“Presumindo-se que a absoluta maioria dos veículos beneficiados não possua circulação verificada, indaga-se se o que importava à Câmara era dirigir mensagens aos cidadãos curitibanos com racionalidade e eficácia, ou se almejava tão somente a contratação do maior número possível de veículos de comunicação. Eventual busca desse último objetivo levaria à séria ponderação a respeito da ocorrência de lesão ao patrimônio público, além de ofensa à orde,m democrática e à isonomia nas eleições”, diz o documento.

Transformação da agência

A instrução apresentou, ainda mais uma coincidência na participação da agência de Cláudia Queiroz, mulher do presidente da Câmara, João Cláudio Derosso (PSDB), na licitação.

Além da vedação de sua participação por ser funcionária da Casa e de já ter um relacionamento com Derosso quando o contrato foi renovado, a instrução aponta que a agência Oficina da Notícia alterou o objeto social, incluindo agência de publicidade como uma de suas atividades, e se filiou ao sindicato das agências de publicidade do Paraná dias antes da licitação.

Câmara em Ação

Os analistas dedicaram um capítulo da instrução ao caso do periódico “Câmara em Ação”, para onde foram destinados R$ 14 milhões. A instrução levanta dúvida sobre o número de exemplares do jornal que circularam, com tiragem mensal média de 201 mil exemplares.

“O elevado número de exemplares do Informativo impressos deveria acarretar na difusão da publicação à boa parte da população, mas, aparentemente, não foi isso o que ocorreu, pois o jornal é pouquíssimo conhecido”, diz o relatório, que lembrou que essa tiragem é mais que quatro vezes superior à tiragem do jornal de maior circulação no Estado e que “os exemplares da Gazeta do Povo são encontrados com facilidade na cidade de Curitiba, ao contrário das edições do ‘Câmara em Ação’”.

A DCM questionou a Câmara sobre a distribuição do jornal e foi informada que era feita por oito pessoas, divididas em 4 equipes. As equipes atuavam 28 dias por mês, em pontos movimentados de Curitiba – como terminais de ônibus, praças e ruas.

“O modo de distribuição dos exemplares do Informativo é, sem dúvida, inusitado, e, no mínimo, desperta dúvidas quanto à economicidade e à eficácia dos gastos com a publicação”, aponta o documento.