Senadores se livram de responsabilidade sobre boletins

Quase quatro meses depois da revelação da existência de atos secretos no Senado, um relatório feito por dois funcionários, a pedido do presidente José Sarney (PMDB-AP), isenta os senadores de qualquer responsabilidade pela prática ilegal de esconder medidas administrativas. A conclusão afirma ainda que o conteúdo desses boletins sigilosos – usados para nomear parentes, amigos e criar privilégios a parlamentares e funcionários – é “corriqueiro”. “Não continha sequer dúvida quanto à legalidade (do conteúdo)”, diz o texto.

O documento é assinado pelo diretor-geral, Haroldo Tajra, e pelo advogado Luiz Augusto Geaquino dos Santos. Tajra foi designado em julho por Sarney para analisar a validade dos atos secretos. A revelação do conteúdo desses documentos abriu uma crise que levou senadores a pedirem a renúncia de Sarney após a descoberta de que parentes e afilhados do senador foram beneficiados. Depois de um acordo com os colegas, o senador ficou livre de processo de cassação no Conselho de Ética.

Partiu do diretor Haroldo Tarja, ex-assessor de Efraim Morais (DEM-PB), a determinação para a convalidação, nos últimos dois meses, de cerca de 190 atos secretos, entre 511 descobertos, incluindo as medidas que beneficiaram familiares e amigos do presidente da Casa e as 36 assinadas pela Mesa Diretora para a criação de cargos de confiança. Não entraram nessa leva os outros 467 boletins identificados em agosto, editados entre 1998 e 2000, e que ainda estão em fase de investigação.

Na quarta-feira à noite, Tajra entregou a sua conclusão ao presidente do Senado. O argumento é que assinar um ato secreto não é irregular. “A legalidade de seu conteúdo no momento da assinatura não sofre sequer um arranhão pela falta de publicação posterior. Uma vez assinado, este passou a existir”, diz o texto. O erro, dizem, é não publicar as medidas administrativas. O relatório lembra então que o diretor-geral e o diretor de Recursos Humanos, subordinadas à Mesa Diretora, são os responsáveis pela publicação dos atos.

Processados

Esse documento deve pôr um fim na investigação administrativa sobre o conteúdo dos atos secretos. Restam agora dois processos disciplinares, um contra o ex-diretor-geral Agaciel Maia e o outro que apura a responsabilidade de João Carlos Zoghbi, ex-diretor de Recursos Humanos. Ambos foram acusados por servidores de determinarem a não publicação desses atos. O Ministério Público e a Polícia Federal conduzem, desde junho, inquérito sobre o caso.

O relatório da Diretoria-Geral contradiz posição adotada pelo MP em recomendação enviada pelos procuradores em junho ao Senado. A conclusão dos servidores da Casa afirma: “a publicação é uma formalidade posterior à prática do ato e não lhe fundamenta a validade material”.

Os procuradores discordam: “quando determinado ato que exige ampla publicidade não é publicado ou não observa o instrumento adequado de divulgação, diz-se que o ato é nulo”.