Pesquisa

Violência é uma questão de saúde pública

Ainda este ano, o Ministério da Saúde vai repetir uma pesquisa que mostra o perfil da violência no País. Um levantamento semelhante, cujos dados compõem o Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes (Viva), foi realizado em 2006 e em 2007. As informações ajudam na composição de políticas públicas para o enfrentamento do problema. No entanto, o assunto é complexo e envolve diversos segmentos da sociedade.

A última pesquisa do Viva, feita em 84 unidades de atendimento de urgência e emergência em 37 municípios brasileiros – o único paranaense foi Curitiba -, mostra o perfil das pessoas vítimas de acidentes e da violência que procuram atendimento na rede pública. Entre setembro e outubro de 2007, foram recebidas 5.488 notificações de vítimas. As agressões foram o motivo principal dos atendimentos (90% do total de notificações).

Depois vieram as tentativas de suicídio (8%) e os atendimentos por intervenção da polícia (1%). Do total de vítimas, 71% eram homens, também apontados como os principais agressores. Em cerca de 39% dos casos havia a suspeita de uso de álcool por parte da vítima. Sobre o agressor, 38% eram conhecidos da vítima, 34% desconhecidos e 19% eram familiares.

Quanto à violência doméstica e sexual, o estudo demonstrou que as mulheres são as principais vítimas, desde a infância até a terceira idade. O agressor é familiar ou pessoa conhecida, na maioria dos casos. A violência acontece principalmente em casa. “O perfil mostrado pela pesquisa era o que a gente esperava. Mas esse levantamento foi além e também mostrou a violência doméstica e sexual, com dados então inéditos. Deixou em evidência um grave problema de saúde pública”, afirma Marta Maria Alves da Silva, coordenadora da área técnica de vigilância e prevenção de violências e acidentes do Ministério da Saúde.

Para o secretário de Estado da Saúde, Gilberto Martin, esse é o perfil mais aproximado da realidade que já foi traçado. Ele também avalia a violência como um caso de saúde pública, pois impacta o sistema e é uma das principais causas de óbitos no Brasil.

Sobre os acidentes, as unidades de urgência e emergência apresentaram, em 57.984 notificações, atendimentos por quedas (35,7%) e acidentes de trânsito (26,5%). A maior parte de vítimas no trânsito foi de motoqueiros (48,5% do total de atendidos). Também houve registros de acidentes com objetos perfuro-cortantes e choques contra objetos ou pessoas, além dos relacionados ao trabalho.

Saúde atua implantando ações em redes de proteção social

Esse tipo de pesquisa tem como objetivo monitorar e servir de base para a formulação de políticas públicas para o enfrentamento dos diferentes tipos de violência. E o que está sendo feito? “O Ministério da Saúde tem investido nas secretarias municipais de saúde para a implantação de ações em redes de atendimento de proteção social às vítimas de violência”, comenta Marta Maria Alves da Silva, do ministério.

De acordo com ela, desde 2001 existe uma política nacional para a redução dos acidentes e da violência. Mas como esses são problemas complexos, as soluções e ações também são. “A violência não é uma doença. Não tem remédio ou vacina. A prevenção também é complexa e exige ações múltiplas”, esclarece Silva. Ela destaca como resultado positivo a lei seca, que deixou mais rígida a punição para quem dirige alcoolizado.

O secretário de Estado da Saúde, Gilberto Martin, acredita que ainda se investe muito para tratar as consequências da violência, em vez das causas. Um exemplo seria a ampliação de leitos e veículos para o Siate (atendimento de urgência). “Na prevenção do risco temos várias iniciativas em estágio inicial, mas ainda demandam organização e estruturação”, aponta. Segundo Martin, o ideal seria inverter a prioridade dos recursos.

“Não basta somente a ação da saúde. O enfrentamento da violência é multissetorial. O que ainda falta é assumir a violência também como um problema nosso e usar a estrutura que temos para agir nas bases, como é feito com a prevenção de doenças cardíacas, de câncer. Isso não é uma coisa de curto prazo. Mas incorporar como um problema de saúde pública, isso já é um avanço”, explica Martin.

Em vez de punir, prevenir

A sociedade pede o fim da violência no País com diversas manifestações. Mas a diminuição, quando acontece, vem a passos lentos. O advogado e professor de Direito Penal da Universidade Positivo Pedro Luciano Evangelista Ferreira afirma que há uma postura no Brasil centrada na punição da violência, e não na prevenção. “Por isso não há resultado suficiente. O Estado, como um todo, age aumentando a pena de um crime ou criminalizando tal conduta.

A punição vem só depois que o crime já aconteceu. A prevenção tem resultado melhor”, diz. E alerta: a mesma sociedade que pede uma solução também compra a violência. “A sociedade tem esta atração e permite este estímulo. É um viés que ainda não foi trabalhado”, expõe Ferreira.