Negros dizem que não têm o que comemorar hoje

Teoricamente, os negros teriam motivos de sobra para comemorar o dia de hoje. Em 28 de setembro de 1871 foi promulgada a Lei do Ventre Livre, em que os negros filhos de escravas não eram mais escravos. Quatorze anos depois, foi a vez de escravos com mais de 65 anos serem libertados, conforme previa a Lei dos Sexagenários. Passados mais de 130 anos, o que se percebe é que eles ainda são alvo de discriminação e estão na periferia social.

“Nunca comemoramos essas datas. As duas leis foram um crime contra a comunidade negra do Brasil”, sentencia o presidente da Associação Cultural de Negritude e Ação Popular (Acnap), Jaime Tadeu da Silva. Ele compara as crianças “beneficiadas” com a Lei do Ventre Livre àquelas que estão abandonadas nas ruas das cidades. “As leis foram uma maneira de se libertar do ônus de responsabilidade por esse povo”, aponta.

Hoje Jaime diz que a discriminação e o racismo ainda imperam. “A população afrodescendente tem dificuldade de permanecer na escola, de conseguir um trabalho, de se firmar socialmente”, lamenta. Segundo dados do IBGE, quase 23% da população paranaense é de origem negra.

Mesmo com a proposta do Ministério da Educação (MEC) de destinar 20% das vagas das universidades públicas aos negros, Jaime diz que no Paraná ainda se está em negociação. “Temos conversado com o reitor da UFPR e estamos bem avançados. Mas só deve valer para 2004”, explica. Mesmo sem ter o direito de vagas reservado, Jaime conta que um grupo de quase cem afrodescendentes vêm se preparando para o vestibular.

“Os negros fazem parte de um grupo étnico que ajudou a construir o Brasil. Mas o próprio Estado insiste em colocar a ideologia branca, de que tudo o que é europeu é bom. Com o que nossas crianças vão se identificar?”, questiona.

Pai de três crianças, de um a oito anos de idade, Jaime revela que um de seus sonhos é que seus filhos vivam em uma sociedade mais madura em se tratando dos negros. “Não estamos só reclamando, mas construindo. Quero construir um país diferente para eles.”

Voltar ao topo