Multa com uso de radar é abusiva

O desrespeito maior, em Curitiba, em se tratando de multas de trânsito pelos sistemas de pardal (radar eletrônico) e “lombada eletrônica” (redutor eletrônico de velocidade), está na delegação de poder de polícia a empresas particulares. A contratação de empresas privadas para exercer atividades de detenção de infrações de trânsito e análise das imagens, na prática e, em verdade, escolhendo quem deve ou não ser multado, para posterior processamento e notificação, já é absolutamente ilegal, por estar exercendo atividade privativa do poder público e indelegável.

O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) não admite a delegabilidade do poder de polícia: “Artigo 5 ? O Sistema Nacional de Trânsito é o conjunto de órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que tem por finalidade o exercício das atividades de planejamento, administração, normatização, pesquisa, registro e licenciamento de veículos, formação, habilitação e reciclagem de condutores, educação, engenharia, operação do sistema viário, policiamento, fiscalização, julgamento de infrações e de recursos e aplicação de penalidades.”

Não se pode entender diferente. Há clareza na definição de órgãos e entidades da União, Estados, DF e dos municípios na constituição do Sistema Nacional de Trânsito.

Não há qualquer eventualidade de delegação dessas atividades a empresas privadas, principal e especificamente quanto a operação do sistema viário, policiamento e fiscalização e julgamento de quem abusou de velocidade.

O CTB não admite delegação. Não permite, claramente, a contratação de empresa privada para qualquer fase dessas atividades.

Legislação específica

Em se tratando de empresas privadas de segurança, segurança orgânica e segurança de estabelecimentos financeiros, transportes de valores e outras, cujas atividades exigem o exercício de parcelas do poder de polícia há legislação federal autorizadora (por exemplo a Lei Federal 7.102, de 20/6/83; Lei Federal 9.017, de 30/3/95, com respectivos decretos).

Na legislação sobre o trânsito, fundamentalmente o Código de Trânsito Brasileiro (Lei Federal 9.503, de 23/9/1997) não existe essa autorização para empresas privadas receberem delegação de exercício do Poder de Polícia.

Só a legislação de trânsito, editada pela União, poderia prever delegação do Poder de Polícia administrativa de trânsito a entidades privadas e particulares. Nenhuma lei estadual, distrital ou municipal pode fazê-lo.

Voltando ao que diz o CTB: “Artigo 24 ? Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos municípios no âmbito de sua circunscrição:

III ? implantar, manter, operar o sistema de sinalização, os dispositivos e os equipamentos de controle viário.

VI ? executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis, por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, no exercício regular do Poder de Polícia de Trânsito.

VI ? Notificar as penalidades de advertência por escrito e multa, por infrações… e arrecadamento as multas que aplicar.”

Poder de polícia

É precisa a legislação: trata de órgãos e entidades executivos de trânsito dos municípios e até trata do “exercício regular do poder de polícia de trânsito”. Em nenhum ponto acena ou abre possibilidade desse poder de polícia ser delegado a empresas privadas. Nada se encontra permitindo transferência desse poder mediante terceirização, ou seja, contratação de empresa privada.

No Anexo I ao CTB, que trata dos conceitos e definições, encontra-se o verbete: “Fiscalização: ato de controlar o cumprimento das normas estabelecidas na legislação de trânsito, por meio do poder de polícia administrativa de trânsito, no âmbito de circunscrição dos órgãos e entidades executivos de trânsito e de acordo com as competências definidas neste Código.” Nenhuma brecha, qualquer margem, para a delegação de poder de polícia administrativa de trânsito à empresa privada.

Essa comprovada indelegabilidade do poder de polícia é um dos principais fundamentos para ações civis públicas que tenham sido ou venham a ser propostas pelo Ministério Público. Qualquer medida ou decisão administrativa tem de estar de acordo com a lei. Não há lei autorizando a delegação de poder de polícia, implícito na realização de serviços de trânsito por empresas privadas/particulares.

Assim apenas poderia ser delegado qualquer aspecto do Poder de Polícia de trânsito a particulares se a lei, no caso do Código de Trânsito Brasileiro (lei federal) o admitisse.

No caso das multas de trânsito em Curitiba, (uso de pardal e “lombada eletrônica”) a delegação do poder de polícia está caracterizada pela Prefeitura de Curitiba (pelos seus órgãos) porque a empresa particular instalou o equipamento, também no administra, faz manutenção, flagra o infrator por meio de uma prova fotográfica que serve para a autuação e multa.

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