Medo atinge muçulmanos em Foz do Iguaçu

Islamofobia. Esta é a palavra usada por Jamil Ibrahim Iskandar, presidente da Sociedade Beneficente Muçulmana do Paraná, para definir o que está acontecendo com a comunidade islâmica de Foz do Iguaçu, na região oeste do Estado. Os muçulmanos vêm sofrendo diversas represálias por causa da divulgação de informações sobre supostas participações de pessoas ligadas à comunidade em organizações terroristas. Nesta semana, mais uma reportagem de uma revista de circulação nacional mostrou a possibilidade da existência de uma célula terrorista na região da tríplice fronteira, entre Brasil, Paraguai e Argentina.  

A imigração de muçulmanos para aquela área começou em 1960 e teve o seu ápice com a guerra do Líbano, em 1979. Há cinco anos, 20 mil muçulmanos estavam na região da tríplice fronteira. Hoje, o número chega a 15 mil. A queda aconteceu com a mudança de muitos imigrantes para outras cidades, devido ao estigma originado pela afirmação de que os muçulmanos estão diretamente ligados ao terrorismo.

A revista Época desta semana traz uma lista de imigrantes árabes que vivem na tríplice fronteira, acusados de estarem envolvidos com o terrorismo, segundo um relatório do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos. A revista mostra os depoimentos de alguns deles, que negam as denúncias. A principal delas é o envolvimento com o Hezbollah, que é um partido político que luta contra a presença de Israel no território libanês.

Segundo Iskandar, a população islâmica de Foz do Iguaçu está em uma situação grave no aspecto psicossocial. A comunidade fica receosa em expressar a sua cultura e a sua religião com medo de represálias. Se sentem constrangidos em se comportar como muçulmanos. ?Chegou ao ponto em que as pessoas estão temendo relações com muçulmanos. Foi criado um estigma muito forte na tríplice fronteira. O problema é muito grave na região. Muçulmanos viraram sinônimos de terroristas. Parece que ser muçulmano é pré-requisito para ser terrorista. Mas e o ETA, na Espanha? Não são cristãos? Ninguém diz o grupo terrorista cristão ETA. Ninguém?, avalia.

Iskandar acredita que todo o problema tenha começado com a divulgação de uma matéria feita pela rede de televisão norte-americana CNN depois dos atentados terroristas de 2001. A reportagem citava que Osama Bin Laden já teria passado alguns dias na tríplice fronteira e que havia o envolvimento da comunidade islâmica local com grupos de terroristas. ?Quem começou tudo foi a CNN, que disse haver uma célula terrorista na região. Na época, o procurador do município de Foz entrou com uma ação contra a CNN alegando difamação. Antes dessa reportagem, ninguém falava de terrorismo na região?, lembra.

O presidente da Sociedade Beneficente Muçulmana do Paraná acredita que o estigma contra o Islamismo seja alimentado pelos Estados Unidos, com o objetivo de conseguir álibi para as ações contrárias aos países árabes. ?A imprensa internacional estigmatizou o Hezbollah, que virou um sinônimo de terrorismo. O Hezbollah é um partido político e suas ações estão concentradas no Líbano. Ficou estigmatizado porque é contra a presença de Israel em parte do território do Líbano?, comenta.

Comunidade árabe exige provas

A comunidade árabe quer as provas de que existam células terroristas na tríplice fronteira. ?Se realmente tiver envolvimento com terrorismo na região, queremos as provas. Por que até agora não apareceram os fatos que comprovam o terrorismo em Foz? Se houver, seremos os primeiros a aplaudir a prisão dos envolvidos. Só queremos resolver isto. Só queremos que abandonem a expressão  terrorismo islâmico?, opina Jamil Iskandar, presidente da Sociedade Beneficente Muçulmana do Paraná.

Sobre a remessa de dinheiro para países árabes, ele ressalta que isto é uma prática comum entre os imigrantes, que mandam dinheiro para os familiares que permaneceram no Oriente Médio.

Rotina

Enquanto isso, a colônia árabe de Foz do Iguaçu tenta manter uma rotina. Cabura Issa é um exemplo disso. Ela é brasileira, filha de libaneses e mora há 20 anos em Foz.

?A gente tenta seguir com o nosso dia-a-dia. Mas não deixamos de estar indignados com as reportagens tendenciosas que falam que aqui existem células terroristas. Aqui não existe nada disso. Estamos seguindo a vida com a consciência tranqüila?, afirma.

Cabura lembra que a comunidade árabe é de paz, além de ser muito hospitaleira. Para ela, os imigrantes e os descendentes de árabes só querem trabalhar e cuidar de suas famílias.

Acusações não afetam turismo

Andréa Bordinhão

Apesar das suspeitas sobre a existência de grupos envolvidos com terrorismo divulgadas várias vezes por órgãos norte-americanos nos últimos anos, a Prefeitura de Foz de Iguaçu garante que isso nunca afetou o turismo local. ?As pessoas já cansaram de escutar isso e nunca foi comprovado nada. Os turistas não dão mais bola para isso?, afirmou o prefeito de Foz, Paulo MacDonald Ghisi. Nos últimos anos, a média de turistas que visitaram Foz é de cerca de 1 milhão por ano. Em 2006, este número baixou para 980 mil, mas a Prefeitura acredita que foi por causa do baixo preço do dólar e da Copa do Mundo.

Segundo o prefeito, prova de que as suspeitas nunca afetaram o turismo de Foz é que a Prefeitura teve que desistir da ação judicial contra a rede de televisão norte-americana CNN por falta de subsídios. ?Nós não conseguimos dados concretos de que aquela divulgação prejudicou a cidade?, explicou. Já quanto às pessoas acusadas, Ghisi afirmou que não é possível a intervenção da Prefeitura porque ?são ofensas pessoais?.

Acusados

A reportagem do O Estado entrou em contato com uma das pessoas que constam na lista de acusados pelos EUA de financiar o terrorismo, publicada em uma revista nacional. Esta pessoa, que se mostrou bastante indignada com o assunto, afirmou à reportagem que ?não fala mais sobre este problema? e disse que boa parte das pessoas citadas na reportagem moram no Paraguai. ?Acho que não vamos fazer mais nada com relação à isso?, respondeu ao ser questionada sobre uma possível ação na Justiça.

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