Enfrentando o perigo, o medo e o preconceito

Responda rápido: Você entraria em uma jaula com leões ferozes para alimentá-los? Ou quem sabe subiria em uma torre de 45 metros com linhas de transmissão de 525 kv? Ou ainda se prontificaria a maquiar pessoas que já morreram? Pois essas são algumas das profissões escolhidas por pessoas que encontram nessas atividades uma forma de ganhar o pão de cada dia. Profissionais que muitas vezes arriscam a própria vida, mas que garantem que isso vale á pena, já que amam o que fazem.

Enquanto a energia elétrica chega à casa de milhares de pessoas, um grupo de homens, realiza um trabalho perigoso. São eletricistas da Eletrosul, que lembrando o Homem-Aranha das histórias em quadrinhos escalam torres que chegam a mais de 45 metros. Mas o risco não pára aí. Além de enfrentarem a altura, eles ainda deparam com o perigo da eletricidade. É que toda a manutenção é feita em “linha via”, ou seja, com a rede ligada.

Para se ter uma idéia do potencial de energia que os eletricistas entram em contato durante a manutenção, uma linha de 525 kv pode alimentar a Região Metropolitana de Curitiba e todo o Leste do Estado de Santa Catarina. A manutenção em linha viva é fundamental para evitar problemas de blecautes, como o que ocorreu em janeiro em São Paulo.

A Eletrosul possui no Paraná sete subestações de energia elétrica localizadas nos municípios de Curitiba, Areia, Salto Santiago, Salto Osório, Campo Mourão, Ivaiporã e Londrina. Estas subestações operam nas tensões de 525 mil volts e 230 mil volts e estão interligadas com 3.480 km e 8 mil torres de linhas de transmissão, que têm 31 mil km de cabos. A energia produzida nas usinas é transmitida para os estados do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul.

Medo de altura

O eletricista Mário Luiz Candiolo tem 43 anos de idade e 24 de profissão. Ele recorda cm nitidez a primeira vez em que subiu em uma torre para fazer a manutenção. Foi em Londrina. A subida foi de 50 metros. “O que senti era ansiedade por causa da altura. Mas venci essa etapa”, lembra.

Para Candiolo, um bom eletricista tem que ter acima de tudo disposição. Além disso, ter consciência de que o trabalho é perigoso. Mas ele garante que, embora arriscado, o profissional eletricista tem à disposição inúmeros equipamentos de segurança. Entre eles trajes especiais que permitem com que a eletricidade passe pela roupa sem atingir os eletricistas.

Airton Marcondes Brito há 17 anos trocou a profissão de estofador pela de eletricista. Ele foi aprovado em um concurso público com 1730 concorrentes. “Na época fazia até trabalho de encanamento. Mas fiquei sabendo por acaso do concurso. E deu certo”, recorda.

Foram três meses de treinamento antes de subir pela primeira vez em uma torre. O “batizado” foi em Foz do Areia. Marcondes diz que a sensação é indescritível. O maior problema foi a altura. “Mas não senti medo. Hoje não trocaria de profissão por nada desse mundo”, garantiu.

O “caçula” entre os eletricistas é Edson Conceição. Aos 28 anos de idade tem apenas oito de profissão. A escolha profissional foi por incentivo da própria família. São vários eletricistas. Hoje Edson já não teme mais subir nas torres, ou fazer a manutenção com a rede ligada. Assim como os colegas, afirma que o maior desafio é controlar o medo da altura. “Mas estou satisfeito com a profissão. Hoje vejo as coisas com mais naturalidade”, disse.

 

Maquiadora convive com a morte

Viviane Ongaro

Diferentemente da maioria dos trabalhadores, Edelgard Noe Malafia, de 41 anos, deixa filho e marido em casa para trabalhar 24 horas a cada dois dias em uma profissão que pode ser considerada por algumas pessoas no mínimo assustadora. É que Edelgard faz maquiagem nos corpos de pessoas que já morreram. A profissão da maquiadora é chamada oficialmente de tanatopraxista.

Até há 15 anos ela jamais imaginaria que um dia pudesse desempenhar tal função. Lembra que, quando criança, sequer entrava em velórios. Ver cadáveres era motivo para perder horas de sono. Mas ela sempre acompanhava a mãe em velórios de pessoas conhecidas.Foi aos 26 anos que a maquiadora viveu um dilema. Separada e com um filho pequeno para criar foi obrigada a encontrar uma profissão. “Eu nunca havia trabalhado antes. Não sabia o que iria fazer”, lembra.

Durante um longo período Edelgard procurou trabalho sem sucesso. Até encontrar no jornal o anúncio de uma empresa funerária. Mesmo com medo dos mortos, não hesitou. Fez curso de maquiagem e começou a trabalhar.

A primeira maquiagem

A maquiadora recorda do primeiro corpo que arrumou. Além do banho, chegou a pintar de vermelho o cabelo da mulher. “Era um pedido feito quando ela estava viva. Arrumei unha e até fiz escova”, conta. Hoje Edelgard é amiga da filha da mulher que ajudou a arrumar.

Ela explica que vários são os pedidos feitos pelas famílias. Até mesmo fotografias são trazidas para que a pessoa morta fique o mais parecida possível de quando era viva.

Com anos de profissão, Edelgard garante que já perdeu o medo. Mas conta que chega a se envolver com as histórias. “Em uma das vezes tive que maquiar o corpo de uma criança. Foi muito triste. Acabei me abraçando com o pai e chorando. Essa é a parte triste da profissão”, conta.

Ela evita comentar assuntos de trabalho em casa. Principalmente com o marido que trabalha em uma funerária. “Procuro não comentar o que aconteceu durante o dia”, disse. “Das pessoas mortas que arrumo, costumo rezar apenas para que Deus as proteja. É um hábito de todos que trabalham comigo.”

Um dia-a-dia com as feras

Viviane Ongaro

Enquanto seus colegas de juventude pensavam em ir às matinês, namorar e sair com os amigos, Antônio Marcílio Medeiros, hoje com 52 anos, tinha um sonho diferente: ser tratador de animais. Até aí nada anormal, se a preferência não fosse pelos grandes felinos. Apaixonado por leões, leopardos, tigres e onças, queria enfrentar as feras todos os dias alimentado-as e cuidando do seu bem-estar. Hoje, 21 anos depois, ele se sente realizado. Antônio é um dos tratadores do zoológico de Curitiba.

A mãe de Antônio foi a responsável pelo amor que ele sente pelos animais. Preocupada com o fato de o filho se interessar apenas por filmes de faroeste, passou a incentivá-lo a assistir programas que falassem de animais. Assim começou sua história de amor pelos felinos.

Mesmo colecionando revistas sobre essas espécies, jamais havia tido contato com elas. Ao ser informado que haveria uma vaga na Prefeitura de Curitiba, em 1981, foi saber se era possível trabalhar no Passeio Público. “Na época era vigilante. Mas quando soube da possibilidade de trabalhar com animais não hesitei. E deu certo”..

Rei das selvas

Antônio, mais conhecido como Tarzan entre os colegas de trabalho, lembra que no inicio recebeu apenas algumas instruções para começar a tratar os animais. Na época não fez cursos. Ele lembra que, quando foi transferido para o zoológico, os leões ficavam soltos na mata. “Era bem diferente. Hoje eles ficam fechados. Não temos contato direto com os animais. Limpo as jaulas e dou o alimento. Só depois eles são soltos”, conta.

Embora tenha trabalhado com todos os tipos de animais, inclusive grandes primatas, sua maior paixão continua sendo pelos felinos. Apenas uma vez teve um susto com eles. Um leão acabou correndo em sua direção. O tratador conseguiu contornar o problema.

Ele garante que mesmo sendo considerados inofensivos, os chimpanzés são os mais perigosos. Explica que nossos parentes mais próximos são muito inteligentes.

Mas o grande xodó do tratador é um filhote de leão chamado Simba. “Ele é como uma criança”, brinca. Outra que tem sua atenção redobrada é uma tigresa batizada de Fofa. Antônio chega a acariciá-la pela grade de proteção. O animal atende pelo nome.

Quando se aposentar no próximo ano, o Tarzan do zoológico de Curitiba tem um novo sonho. Trabalhar com Beto Carrero. “Se me aceitarem, ficarei muito feliz. Não sei mais viver sem os animais”, pondera.

O pecado mora ao lado

Viviane Ongaro

Em apenas um ano e meio exercendo essa profissão Aparecida da Luz, de 31 anos, já encontrou os mais diferentes tipos de objetos no seu local de trabalho. Celulares, documentos e roupas íntimas são os mais comuns encontrados no dia-a-dia. Mas para quem trabalha como camareira em um motel encontrar objetos, no mínimo estranhos, se tornam coisa corriqueira.

A necessidade fez com que Aparecida procurasse um motel para trabalhar. Além de um horário que permitia ficar a maior parte do tempo com os filhos, o local de trabalho é próximo de casa. Ela começa às 18h e termina apenas às 2h da madrugada.

A camareira conta que no inicio estranhou o serviço. Mas depois teve a certeza de que aquele era apenas um trabalho como outro qualquer. Ela descobriu que as pessoas ao menos imaginam o que pode ser encontrado em um quarto de motel.

“Também são comuns os documentos e jóias”, conta a camareira. “Alguns ainda esquecem dinheiro. Mas há aqueles mais desligados que chegam a deixar vibradores e legumes no quarto”.

Nos finais de semana, Aparecida chega a arrumar 25 quartos por noite. Nos dias de semana o movimento é menor. Ela diz que só deixaria de ser camareira de motel se aparecesse emprego melhor. “A única diferença em relação a outras profissões é que se conhece um pouco mais sobre o intimo das pessoas”, disse.

Imitando vozes

Lucia Helena Azevedo, 43, há 33 segue a profissão que sua mãe exerceu durante anos: a profissão de dubladora. Além de desenhos animados e seriados, Lucia ainda dubla filmes pornográficos.

Ela já perdeu as contas do número de filmes desse gênero que já dublou. E conta que dependendo da situação, o profissional pode ficar um pouco constrangido ao dublar cenas pornográficas. Se as imagens forem apelativas isso geralmente acontece. Mas se o filme for carregado de sensualidade, diz que o profissional desempenha sua função com maior naturalidade.

Lucia, que já dublou desenhos como Charlie Brown e o seriado O Elo Perdido, explica que cada dublador tem maior facilidade para uma determinada história. Uns preferem comédia, outros drama. “No meu caso a dificuldade maior é a comédia. Tenho mais facilidade para chorar”, conta.

Hoje ela já não se vê longe da profissão. Embora já tenha trabalhado em outros ramos nenhum causou tanta satisfação profissional e foi tão bem remunerado. Os dubladores ganham em média R$ 48 por hora. E chegam a levar dois dias para dublar um longa metragem.

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