Curto-circuito pode ser causa de incêndio em depósito de gás

Um curto-circuito no motor de um caminhão pode ter sido o que provocou o incêndio na revenda de gás Prado & Santos, da Liquigás, no bairro Mercês, em Curitiba, no início da noite de quarta-feira. O caminhão, assim como outras três caminhonetes e um carro de passeio, estava dentro do pátio da revenda na hora da explosão, procedimento considerado irregular pelas normas que regem o setor. Além disso, o estabelecimento armazenava uma quantidade de botijões superior à permitida para sua classe de atuação.

Apesar de possuir alvará de funcionamento expedido pelo Corpo de Bombeiros (CB), a revenda apresentava problemas logo na entrada. Uma placa fixada ao lado da porta indicava que o local era classe 1, o que permite armazenar até 40 botijões de gás. No entanto, numa contagem preliminar, foram contabilizados mais de 600 botijões. Segundo explicou o relações públicas do Corpo de Bombeiros, tenente Leonardo Mendes dos Santos, a classificação varia de 1 a 5, conforme a capacidade de armazenamento da revenda. ?Eles tinham alvará para classe 1, ou seja, 520 quilos – 40 botijões – , mas pelo levantamento abrigavam mais de 8 mil quilos, o que passa de 600 botijões?, ponderou.

Aliado a esses problemas, o CB também identificou que na área da revenda havia instalações como cozinha e quarto, o que pode indicar que existem pessoas morando no local, o que também não é permitido. O proprietário do estabelecimento, Arlei Reis da Silva, confirmou que o fogo começou no caminhão e que seu cunhado ainda tentou apagar o foco de incêndio jogando uma camisa no tanque do caminhão. Ele negou que havia pessoas morando na revenda. Disse que as instalações serviam apenas para uso dos funcionários. Silva revelou ainda que os veículos destruídos no incêndio não ficavam no local e que os cerca de 500 botijões que estavam no caminhão estavam vazios e seriam levados para carregar. Ele assumiu a revenda há três anos e afirmou que o estabelecimento não tinha seguro.

O perito criminal do setor de engenharia do Instituto de Criminalística, Marcos Gabriel Pereira Bueno, esteve pela manhã no local da explosão. Ele fez o levantamento da situação e recolheu alguns botijões e válvulas para serem periciados. Bueno disse que ainda é cedo para confirmar se o fogo que se iniciou no caminhão foi o causador do incêndio. ?Essa é uma hipótese, mas nós vamos analisar todas as possibilidades?, comentou. O laudo com a causa do incidente deve sair em até 20 dias. Segundo informações do governo do Estado, ?um inquérito policial deve ser aberto no 3.º Distrito Policial, no bairro Mercês, para investigar os motivos do incêndio?.

Vizinhos sofreram com o acidente

Foto: Átila Alberti

Sandra: vidros quebrados.

Durante o incêndio, a Defesa Civil interditou, por medida de segurança, três casas que ficavam bem próximas à revenda. Todas foram liberadas na mesma noite, após o fogo ser controlado. Somente ontem pela manhã foi possível verificar os estragos.

A casa da microempresária Sandra Maria Mendonça Buchen, que fica em frente à revenda de gás, teve dez vidros quebrados. Além disso, as floreiras do jardim chegaram a derreter com o calor. Um botijão que explodiu bateu no muro e derrubou parte do reboco. Ela disse que só verificou que se tratava de incêndio quando viu os vizinhos gritando. ?Eu e meu marido saímos correndo. Só deu tempo de soltar o cachorro, tirar o carro da garagem e pegar uma bolsa com documentos?, lembra. Eles voltaram para casa por volta das 21h, quando o local já havia sido liberado pelos bombeiros.

Na casa de outra vizinha, Vanessa Penteado, apesar de a parede do imóvel fazer divisa com a revenda,  apenas os vidros de uma janela foram quebrados e parte do beiral queimado. ?O estrago só não foi maior porque os bombeiros agiram rápido e foram muito cuidadosos ao resfriar a parede?, comentou. Na hora do incêndio, apenas o pai de Vanessa, um senhor de 70 anos, estava em casa.

Irregularidades identificadas no local

Embora a revenda tivesse alvará para funcionar, diversas irregularidades foram identificadas no local. O tenente do Corpo de Bombeiros Leonardo Mendes dos Santos disse que é muito comum na hora da vistoria as empresas ?maquiarem? uma situação. Por isso pede que a população fique atenta a esses problemas e denuncie os casos ao Corpo de Bombeiros.

O presidente do Sindicato das Revendas de Gás de Curitiba e Região Metropolitana, José Carlos Rocha, voltou a frisar que o botijão de gás é seguro e que acidentes como o de quarta-feira podem ocorrer devido a problemas no armazenamento. ?A empresa estava legalizada, mas foi o excesso de estoque que não estava adequado?, disse.

Segundo ele, a população precisa ajudar a fiscalizar o setor, que hoje conta com cerca de 3 mil pontos de revenda ilegais em Curitiba e região, contra 600 pontos regulares de venda.

Órgãos procuram respostas

Nájia Furlan

Além do Instituto de Criminalística do Paraná, o Ministério Público (MP), a Prefeitura de Curitiba, a Agência Nacional de Petróleo (ANP) e a própria distribuidora Liquigás buscam esclarecimentos para a explosão da última quarta-feira. A principal preocupação é verificar se havia mesmo irregularidades. Ontem, representantes desses órgãos estiveram na revendedora de gás Prado & Santos Ltda., local do acidente.

O promotor João Henrique da Silveira, da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor de Curitiba, afirmou que a visita ao local da explosão foi para se inteirar das circunstâncias em que ocorreu o sinistro. ?Aguardamos o laudo dos bombeiros e da perícia para saber quais serão os procedimentos?, diz. Ainda segundo o promotor, ontem, um processo foi instaurado pelo MP e, assim que os laudos forem analisados, pode ?acabar em ação penal, ação civil pública, cassação do alvará e multa; em separado ou concomitantemente?.

A Comissão de Segurança em Edificações e Imóveis (Cosedi), ligada à Secretaria Municipal de Urbanismo, também prepara um laudo sobre o acidente. Segundo o diretor de fiscalização da secretaria, José Luiz Filipetto, a Cosedi esteve no local para verificar se existiria a necessidade de interditar a área. ?Segundo o engenheiro da Cosedi me adiantou, a demolição das paredes do estabelecimento seria necessária e urgente, mas as edificações vizinhas não correriam risco, pois apenas tiveram poucos danos, como rachaduras e vidros quebrados?, adiantou.

Sobre o alvará de funcionamento do estabelecimento, Filipetto explicou que desde 1999 eles têm o documento, válido. No entanto, ele disse que o alvará foi dado para ?comércio varejista de GLP?. ?Pelas informações que recebi ontem, o alvará fica descaracterizado pelo volume de gás que tinha no local, que seria quantidade de distribuidor. A atividade exercida era diferente do alvará emitido, a forma de trabalho estava desvirtuada?, esclarece.

Em nota encaminhada para O Estado, a assessoria de imprensa da ANP, órgão que controla a distribuição e revenda de GLP (gás), informou que agentes de fiscalização estavam em Curitiba para buscar informações junto ao Corpo de Bombeiros. Como traz o texto, além de verificar ?se a revenda estava de fato armazenando botijões além do total permitido, também será levantado se o distribuidor estava fornecendo o produto acima da capacidade de armazenamento do revendedor. Caso constatada a irregularidade, tanto a revenda quanto a distribuidora estão sujeitas a autuação, com abertura de processo administrativo que pode resultar em multa de R$ 20 mil a R$ 2 milhões?.

A ANP ainda confirmou que o revendedor estava credenciado como classe 1 (capacidade para 40 botijões P13) e que eles teriam sido informados pelo Corpo de Bombeiros que ?o revendedor estava armazenando aproximadamente 500 botijões P13 e 40 cilindros P45?.

Procurada, novamente, para comentar o ocorrido, a Liquigás apenas informou que está acompanhando a situação e que aguarda a apuração dos fatos para se pronunciar.

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