Para companheiros

Um escândalo mais grave que o caso Waldomiro Diniz, no dizer de um deputado do Distrito Federal, acaba de explodir nas mãos do já enfraquecido ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu. Ele nega, mas não consegue desfazer o mal-estar criado com a denúncia de que teria comandado o processo para dar a “uma entidade fechada de previdência complementar, multipatrocinada, com personalidade de direito privado e autonomia patrimonial, administrativa e financeira” a exclusividade no atendimento nos planos de saúde dos servidores públicos federais em Brasília e nos estados.

A entidade chama-se Geap – Fundação de Seguridade Social e tem como presidente Regina Parizi Carvalho, outra petista derrotada nas últimas eleições. O monopólio que atende à direção do PT foi concedido por decreto do presidente da República, assinado pouco antes de explodir o caso Waldomiro. Além da exclusividade, a Geap tem garantidos repasses que somam cerca de um bilhão de reais anuais. Negócio de companheiro para companheiro.

Assim que o jornal O Estado de S. Paulo denunciou o fato, na edição do último domingo, a Casa Civil da Presidência da República apressou-se em desmentir que o processo contenha irregularidades. Longa nota procura tirar qualquer responsabilidade do ministro José Dirceu e remete a questão para anos antes, como se o ato do presidente Lula tivesse tido o objetivo apenas de regularizar uma irregularidade já preexistente. Sim, algum problema já existia, mas no ato de “regularização”, segundo consta, as cláusulas teriam sido redigidas pelo próprio pessoal do Geap, de acordo com sua inteira conveniência, de olho na concorrência inexistente.

Segundo o deputado paulista Alberto Goldman, esta foi “uma operação para atender ao PT e seus filiados”. Isso tudo é muito grave, é assustador, disse ele. “O que é que a Casa Civil tem a ver com o problema de saúde?”, perguntou o presidente do PPS, o circunspecto Roberto Freire. José Agripino, líder do PFL, observa que “o PT estava com a canga solta. Achava que estava protegido pela blindagem de guardião da ética, mas está nu, está sendo desmoralizado”. Parece – segundo o líder do PDT, Jefferson Peres -, que há dois movimentos em marcha: o de arrecadar dinheiro para o caixa de campanha (referência ao caso Waldogate) e o de aparelhar o Estado com pessoas do PT.

O próprio senador Eduardo Suplicy, com sua voz de sacerdote experiente, quer que a Casa Civil dê explicações. Curiosamente, o presidente do partido, José Genoino, vê na denúncia mais um capítulo do “vale tudo contra o PT”. Um vale tudo que conta com 11 processos contra a fundação Geap no Tribunal de Contas da União. Tudo porque, entre outros vícios, os contratos (que, do lado do governo, insistem em chamar de “convênios”) foram realizados sem a salutar licitação. O TCU questiona também o enquadramento da fundação no chamado sistema de autogestão, que seria de empresas criadas para prestar serviços a seus próprios funcionários, enquanto a fundação têm contratos com 37 órgãos públicos diferentes, um milhão de clientes diretos e indiretos, com a possibilidade de chegar a três milhões…

Um mercado de três milhões de usuários não é coisa desprezível. Ainda mais numa área onde se conta com a ajuda do “empregador”, o governo que entra com um repasse de R$ 35,00 por servidor que, de resto, paga mais se mais idoso, como em qualquer outro negócio do ramo. Não é à toa que a própria Confederação Nacional de Saúde – CNS, que representa hospitais e operadoras de planos de saúde em todo o Brasil, anuncia que deverá recorrer ao Supremo Tribunal Federal contra o fatídico decreto presidencial, assinado sob aconselhamento, entre outros, do ministro “capitão” do time de Lula, José Dirceu. O decreto alijou do processo outras operadoras de planos de saúde, mesmo as que já mantêm contratos com ministérios, empresas públicas e autarquias.

Aguardemos os próximos capítulos de outra novela triste, que nada tem a ver com o espetáculo do crescimento, prometido repetidamente e esperado ansiosamente por todos os brasileiros.

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