Outros temas na análise comparativa da reforma sindical

Na primeira parte da análise comparativa inicial e esquemática do anteprojeto de substitutivo do deputado Tarcísio Zimmermann, que condensa quatorze projetos de lei de regulamentação da organização sindical, e do anteprojeto de lei de relações sindicais do governo federal, destacamos questões essenciais para possibilitar conhecimento básico das proposições quando da retomada do encaminhamento da matéria na Câmara dos Deputados. Questões relacionadas com o conceito de categoria profissional, econômica, preponderante e diferenciada; unicidade sindical, Federações, Confederações e Centrais Sindicais; registro sindical e os dirigentes sindicais; eleições sindicais; custeio das entidades sindicais. Outros temas relevantes devem ser analisados, para completar este quadro inicial sobre a matéria.

Representação dos Trabalhadores nos Locais de Trabalho: O substitutivo assegura "a representação dos trabalhadores nos locais de trabalho, com a finalidade de promover-lhes o entendimento direto com a empresa" e "atua em colaboração com as entidades sindicais", sendo constituída na seguinte proporção: I – de 30 (trinta) a 80 (oitenta) trabalhadores: 1 (um) representante; II – de 81 (oitenta e um) a 150 (cento e cinqüenta) trabalhadores: 2 (dois) representantes; III – de 151 (cento e cinqüenta e um) a 300 (trezentos) trabalhadores: 3 (três) representantes; IV – de 301 (trezentos e um) a 500 (quinhentos) trabalhadores: 4 (quatro) representantes; V – de 501 (quinhentos e um) a 800 (oitocentos) trabalhadores: 5 (cinco) representantes; VI – de 801 (oitocentos e um) a 1.000 (mil) trabalhadores: 6 (seis) representantes. Nas empresas com mais de 1.000 (mil) trabalhadores, devem ser acrescidos 2 (dois) representantes para cada 1.000 (mil) ou fração superior a 500 (quinhentos) trabalhadores. Nas empresas com menos de 30 (trinta) trabalhadores, a representação pode ser criada por acordo coletivo de trabalho. Nas empresas que possuam, na mesma base territorial do sindicato profissional, mais de um estabelecimento com menos de 30 (trinta) trabalhadores cada um, mas que, somados, alcancem esse número, a representação é constituída com base no total de trabalhadores.

A questão da representatividade: No que concerne a representatividade, esta matéria está enfocada no anteprojeto do governo federal (art.131), fixando que "o sindicato de trabalhadores obtém representatividade para a habilitação sindical mediante a filiação de número igual ou superior a 20% (vinte por cento) dos trabalhadores do âmbito de representação. Para a aferição de representatividade, será considerada a relação entre o número de empregados filiados e o número de trabalhadores empregados no âmbito de representação do sindicato. A aferição de representatividade do sindicato organizado por atividade profissional regulamentada, na forma do art. 11, considerará a relação entre o número de profissionais filiados e o número de profissionais da base de representação do sindicato. A federação de trabalhadores obtém a representatividade para a habilitação sindical mediante o cumprimento dos seguintes requisitos: I – filiação de, no mínimo, 5 (cinco) sindicatos habilitados junto ao MTE, no seu âmbito de representação; e II – filiação de trabalhadores aos sindicatos a ela filiados em número igual ou superior a 10% (dez cento) do total de trabalhadores empregados no âmbito de representação da federação. A confederação de trabalhadores obtém a representatividade para a habilitação sindical mediante a filiação de, no mínimo, 5 (cinco) federações habilitadas junto ao MTE. A central sindical obtém a representatividade para a habilitação sindical mediante a filiação de, no mínimo, 20 (vinte) sindicatos habilitados em cada uma das 5 (cinco) regiões do país".

Outros temas: os projetos de lei ainda tratam da negociação coletiva de trabalhoe das normas sobre a conduta anti-sindical. O do governo federal é mais extenso em fixar regras relativas a criação do Conselho Nacional das Relações de Trabalho, das ações coletivas das ações em matéria de greve, do conflito coletivo de interesses, das ações normativas, da arbitragem, das ações de anulação, declaração e revisão de norma coletiva, ações declaratórias de normas coletivas.

Breve conclusão crítica: O governo caiu na realidade, desistiu de insistir na emenda constitucional do artigo 8.º (PEC 369/05), absolutamente inviável, e, agora, faz circular um anteprojeto de relações sindicais menos ambicioso, de apenas 153 artigos contra os anteriores 238. Anteprojeto que continua com o vício anterior da inconstitucionalidade, insistindo na quebra da unicidade sindical e da eliminação do conceito de categoria profissional/econômica, tentando fazer passar o sindicato pluralista por ramo de atividade-preponderante, com prova de representatividade atestada pelo oficialismo do Conselho Nacional de Relações do Trabalho.

Já o parlamentar petista no seu substitutivo foi mais sensato: manteve a unicidade sindical, o conceito de categoria profissional/econômica, o registro sindical pelo mesmo sistema atual, ampliou a representação numérica sindical para até 81 dirigentes com estabilidade no emprego, estabeleceu regras para as eleições sindicais, trocou a contribuição sindical obrigatória pela confederativa/associativa/negocial e regulamentou a representação no local de trabalho. Entretanto, sua proposição derrapa em algumas questões, como (1) a extinção da contribuição sindical obrigatória (2) a limitação a apenas um dirigente sindical em empresa de até 200 empregados, a grande maioria no nosso universo empresarial (3) a possibilidade de opção entre sindicato específico e o da categoria preponderante, ou seja, um pluralismo disfarçado, fórmula também presente no anteprojeto do governo (4) restrição nas categorias diferenciadas, limitando-as às que possuem legislação própria, excluindo, por exemplo, a numerosa e importante categoria dos trabalhadores rodoviários, entre outros pontos a serem melhor analisados.

O Ministério do Trabalho deixou a autosuficiência arquivada e partiu para discutir seu anteprojeto com todos os segmentos sindicais, sem discriminação, o que já deveria ter sido efetivado desde o início do Fórum Nacional do Trabalho. No mesmo sentido, o deputado Zimmermann abre-se ao debate. Esta nova postura certamente levará a que as partes em divergência/antagonismo possam tentar efetivos e duradouros consensos. Por certo, esse entendimento caminhará mais rápido se o governo retirar seu anteprojeto de lei de relações sindicais, face a suas incongruências, complexidades, confusões e inconstitucionalidades. E o deputado Zimmermann em aceitar a fusão de sua proposta com um novo substitutivo que nascerá da conjugação dos projetos de lei n.º 4554/04 e n.º 5275/05, as melhores proposições em debate na Câmara dos Deputados, possibilitando uma proposta consistente sindicalmente e sustentável constitucionalmente.

Este o caminho que poderá aperfeiçoar o sistema vigente, abrindo campo para a legalização das Centrais Sindicais, o fortalecimento da unicidade sindical contra as entidades fantasmas/de gaveta, a ampliação da ação sindical pela base, a garantia dos recursos financeiros nascidos das negociações coletivas, o efetivo controle do registro sindical pelas entidades representativas dos empregados/empregadores sem a ingerência do Estado, a representação sindical nos locais de trabalho, os avanços nas relações coletivas de trabalho. Desde o início do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva temos defendido uma proposta simples e objetiva para o aperfeiçoamento do atual sistema sindical, criando condições para podermos nos endereçar a uma nova etapa, consensuada a partir da legalização das Centrais Sindicais. As Centrais que, junto com as Confederações e Federações de Trabalhadores e Empregadores, sem discriminações, poderão estabelecer novos padrões de representação democrática sindical, firmando um pacto de ação sindical e de construção organizativa com objetivos claros de curto, médio e longo prazos.

O notável crescimento da economia social, com geração de renda e emprego, equilíbrio e valorização da moeda, expansão do mercado exportador, a elevação da massa salarial, os ganhos reais nas negociações coletivas, a redução do custo da cesta básica, dentre outros fatores, abrem perspectivas a que os trabalhadores aproveitem esta fase para definir os novos padrões para a expansão da base sindical, com a interelação direta com os demais movimentos da sociedade civil para participar na luta pela superação das desigualdades econômicas, sociais e culturais.

As lições colhidas nestes quase três anos de debates, de antagonismos, de encontros e desencontros, devem ser analisadas profundamente para que se possa estabelecer um novo patamar nas relações sindicais e de trabalho, assim como nas relações institucionais, dentro dos paradigmas do contrato social proposto pelo Presidente Lula. Deve-se ter firmeza em retomar a análise e acreditar na aprovação da reforma sindical na Câmara dos Deputados, dentro dos parâmetros do amplo debate democrático e dentro da realidade constitucional.

Edésio Passos é advogado, assessor jurídico de entidades sindicais de trabalhadores, integrante do corpo técnico do DIAP e ex-deputado federal (PT/PR). E.mail: edesiopassos@terra.com.br 

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