Os números enganam

Na propaganda oficial, há um intrigante jogo de números que visa levar a opinião pública a acreditar que tudo vai muito bem, obrigado. Percentuais muito pequenos, até inexpressivos, de aumentos da produção são apontados como vitórias retumbantes. É uma técnica que muito se aproxima da propaganda enganosa, mas que serve de combustível ao otimismo, nova força motriz do desenvolvimento, conforme a vontade dos atuais governantes.

"O homem que calculava", do escritor luso-brasileiro Malba Tahan, dimensionava uma boiada com a maior facilidade: contava as pernas e dividia por quatro. E se o resultado fosse ímpar é porque algum animal era aleijado, tinha uma perna a menos.

Nos números que os governos nos oferecem, para ampliar o nosso entusiasmo, que imaginam ser muito grande, existem elevações microscópicas e comparações convenientes. Uma matemática complicada como a do "homem que calculava".

Apenas como exemplo: se são produzidas cem unidades de algum produto em determinada época, um número insuficiente e irrisório, anuncia-se que a produção cresceu 100%. E boquiabertos, muitos dos alvos dessa propaganda nem pensam que para crescer 100%, nesse caso, basta chegar a 200. E que isto não é difícil se tomarmos um número de produção de uma época sazonalmente desfavorável ou deprimida, comparando-a, por exemplo, ao período em que a indústria prepara os estoques para as vendas de fim de ano; e o comércio busca encher seus depósitos para as vendas natalinas.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE, acaba de constatar que a produção industrial brasileira não cresce pelo terceiro mês seguido. Em novembro, a produção industrial teve queda de 0,4%. Em outubro, houve crescimento zero. Uma revisão nos cálculos apontou esse crescimento, quando antes calculava-se uma baixa de 0,4%. Em setembro houve queda de 0,2%. Antes, de março a agosto, a indústria havia crescido ininterruptamente.

Ainda bem que os analistas não detectam neste movimento decrescente ou de estabilização produtiva a perda de fôlego do setor e uma reversão na tendência de crescimento. As apostas do mercado eram ainda mais pessimistas.

A parada do crescimento industrial coincide com a alta dos juros adotada pelo Banco Central. Essa taxa (básica) foi de 16% para 17,75% ao ano. E o mercado tem a expectativa, segundo boletim do BC, de que em janeiro haverá nova alta, para 18,25%.

Tudo isso demonstra que é preciso traduzir os números, pois o que parece espetacular pode ser algo sem expressão. E um movimento ascendente desprezível pode estar indicando um início de crescimento efetivo, sustentado.

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