O prazo dos embargos à execução no processo do trabalho

O problema da constitucionalidade da Medida Provisória nº 2.180-34/35, e o posicionamento do E. TRT da 9ª Região

Luiz Eduardo Gunther e Cristina Maria Navarro Zornig

1. Introdução

Desde a edição da CLT, em 1943, sempre prevaleceu o prazo de cinco dias para o executado apresentar embargos, uma vez garantida a execução ou penhorados os bens. Igual prazo cabia ao exeqüente para a impugnação. Essa a redação original do caput do art. 884.

2. O significado da MP n.º 2.180-34/35

A Medida Provisória n.º 2.180-34 (art. 4.º) alterou para trinta dias o prazo referido no caput dos artigos 730 do CPC e 884 da CLT, sendo reeditada pela MP n.º 2.180-35, de 24..08.01. Essa alteração seria o novo art. 1º-B da Lei n.º 9.494/97.

Considera-se em vigor a MP n.º 2.180-35, eis que: a) a Emenda Constitucional n.º 32, de 11/9/01, assim permitiu; b) não foi revogada explicitamente por outra lei posterior; c) ainda não ocorreu deliberação a respeito pelo Congresso Nacional.

3. O prazo para os devedores da iniciativa privada

Essa alteração legislativa, via medida provisória, segundo uma corrente doutrinária, atingiria todos os devedores indistintamente.

O argumento central é que se a mudança atinge o caput do art. 884 da CLT, que se dirige a todos os devedores, e o caput do art. 730 do CPC, que é voltado à Fazenda Pública, a conclusão só poderia ser que: na justiça cível continuaria com dez dias o devedor comum, e trinta dias a Fazenda Pública, mas para o processo do trabalho todos os devedores passaram a ter o prazo ampliado para trinta dias. Alinham-se nesse entendimento José Augusto Rodrigues Pinto, Christóvão Piragibe Tostes Malta e Sergio Pinto Martins.

Em sentido contrário é a doutrina de Manoel Antonio Teixeira Filho, asseverando que a Medida Provisória tratou apenas dos prazos da Fazenda Pública, uma vez que, quanto ao CPC, só mencionou o art. 730, que se refere à Fazenda Pública, e não ao art. 738, que trata do prazo do devedor particular. Segundo esse autor, então, a menção aos dispositivos do CPC e da CLT pela Medida Provisória significa que apenas à Fazenda Pública pretendeu-se ampliar o prazo dos embargos à execução para trinta dias.

A jurisprudência ainda acresceu outro argumento: só se aplica a mudança do prazo à Fazenda Pública porque adotada por inserção de dispositivo na Lei n.º 9.494/97 (art. 1.º-B), de aplicabilidade restrita às pessoas jurídicas de direito público.

O E. TRT da 9.ª Região, através do seu Órgão Especial, em sessão realizada no dia 26/08/02, concluiu, por maioria absoluta, que a MP n.º 2.180-34/35, relativamente ao art. 4.º, que acresce o art. 1.º-B à Lei n.º 9.494/97, somente aplica-se à Fazenda Pública, e não aos devedores particulares (ARI n.º 01/02, originária do AP 3.907/01 da E. 5.ª Turma.

4. O prazo para a Fazenda Pública

Tem-se, assim, que a alteração do prazo para trinta dias, prevista na MP 2.180-34/35 atingiria somente a Fazenda Pública. A questão é saber se essa mudança pode ser considerada constitucional.

Havia séria controvérsia, antes dessa MP, sobre esse prazo. Uma corrente aplicava o prazo de cinco dias, indistintamente, a todos os devedores, por aplicar a regra expressa no art. 884 da CLT. Outra corrente, aplicava subsidiariamente o art. 730 do CPC, que fixa o prazo de dez dias para a Fazenda Pública apresentar embargos à execução, em face de ser omissa a CLT a respeito (não trataria de embargos sem existência de penhora).

Considerando-se que, agora, também o art. 730 do CPC teria o prazo elastecido para trinta dias, pela MP 2. 180-34/35, pergunta-se: essa mudança pode ser considerada constitucional?

O E. TRT da 9.ª Região entendeu que não. Baseou-se em dois argumentos principais: a) não estariam presentes os requisitos obrigatórios de relevância e urgência exigidos no art. 62 da CF/88; b) os prazos processuais não poderiam ser objeto de mudança através de Medida Provisória.

O Ministério Público do Trabalho, oficiando nesse feito, em parecer da lavra da Eminente Doutora Marisa Tiemann, Procuradora Regional, afirmou: “a alteração processual não tinha e não tem caráter de urgência e/ou relevância, razão pela qual, uma vez editada sem legitimar a prerrogativa o Chefe do Executivo Federal, decorrente do preceito contido no artigo 4.º da Medida Provisória n.º 2.180-34, de 27/7/2001, reeditada em 24.8.01, sob o n.º 2.180-35, pertinente ao prazo estabelecido no artigo 884 da CLT, é formalmente inconstitucional” (ARI 01/03, parecer de 31.3.03, fl. 511).

Há dois acórdãos recentes de Tribunais do Trabalho encaminhando-se nesse sentido. O primeiro deles é do TRT da 4.ª Região, que declarou, incidentalmente, a inconstitucionalidade da medida provisória 1984/2000 e edições subseqüentes (atualmente n.º 2.180-35/2001), na parte em que acrescenta o art. 1º-B à Lei n.º 9.494, de 10/9/1997, com a seguinte ementa:

“PRAZO PROCESSUAL – MEDIDA PROVISÓRIA – INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTAL. A definição de prazo processual, ante a segurança e continuidade de vigência que as regras procedimentais devem proporcionar às partes, não se pode dar por medida provisória, especialmente quando ausentes os pressupostos de urgência e relevância. Configurada afronta ao artigo 62 da Constituição da República. Inconstitucionalidade incidental que se declara”.

O segundo é do TRT da 21.ª Região, cuja ementa é a seguinte:

“A Medida Provisória n.º 2.102/2001, que elevou o prazo para oposição de embargos à execução, previsto no artigo 884 da Consolidação das Leis do Trabalho, de (05) cinco para 30 (trinta) dias, é inconstitucional porque o instrumento utilizado não é válido para legislar sobre processo, considerando a manifesta incompatibilidade entre o disciplinamento de prazos processuais e uma eventual relevância e urgência a autorizar a edição da excepcional medida. Agravo de Petição improvido”.

Por maioria absoluta, entendeu o Órgão Especial do E. TRT da 9.ª Região, em sessão de 30/6/03, por declarar a inconstitucionalidade do artigo 4.º da Medida Provisória n.º 2.180-35/2001, no que alterou o prazo para interposição de embargos do devedor da Fazenda Pública para 30 dias (ARI 01/03).

Estabelece o Regimento Interno do TRT da 9.ª Região que, proclamada a inconstitucionalidade, não caberá qualquer recurso para instância superior (§ 2.º do art. 122), e, também, não será admitida nova alegação sobre a mesma matéria, quando apresentada à Seção Especializada ou às Turmas, salvo demonstração de que, posteriormente, o Tribunal Superior do Trabalho ou o Supremo Tribunal Federal haja julgado em sentido contrário (§ 1.º do art. 122).

Obviamente que não há efeito vinculante em relação às Turmas ou a Seção Especializada, da inconstitucionalidade reconhecida. Ocorre que, em se tratando de matéria voltada à execução, o recurso próprio (Agravo de Petição é sempre julgado, no TRT da 9.ª Região, pela Seção Especializada – art. 20, II, “a”). E dos nove juízes componentes da Seção Especializada apenas um não pertence ao Órgão Especial. Portanto, é lícito concluir que a decisão tomada pelo Órgão Especial valerá como precedente a ser adotado em todos os casos em que se discutir o prazo dos embargos à execução, relativamente aos devedores particulares ou à Fazenda Pública.

Enquanto o Congresso Nacional não examina a MP n.º 2.180-35, ou o Excelso STF a ADIn n.º 2.418-DF, na qual é requerente o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, ao menos no Paraná, para a Justiça do Trabalho, definiu-se o prazo dos embargos à execução.

5. Conclusão

Tendo em vista que a Medida Provisória n.º 1.984/2000 e edições subseqüente (por último a n.º 2.180-35/2001), quando acrescentaram o art. 1º-B à Lei n.º 9.494, de 10.9.97, modificou o prazo dos embargos à execução na Justiça do Trabalho, conclui-se, neste estudo, o seguinte:

5.1. Continua em vigor, no processo do trabalho, o prazo de cinco dias, previsto no caput do art. 884 da CLT para oposição de embargos à execução pelos devedores particulares, por três motivos principais: a) a mudança só se dirige ao art. 730 do CPC, e não ao art. 738; b) dirigindo-se a MP à introdução do art. 1.º-B na Lei n.º 9.494/97, só poderia ser de aplicabilidade restrita às pessoas jurídicas de direito público; c) finalmente, porque esse foi o posicionamento do Órgão Especial do E. TRT da 9.ª Região, na ARI 01/02 (em 26/8/02;

5.2. Relativamente à Fazenda Pública, considera-se como sendo o prazo de dez dias o correto para opor embargos à execução, em face do art. 730 do CPC, em seu texto originário, anterior à MP 1.984/00 (e subseqüentes no mesmo sentido), porque, nesse particular, é inconstitucional a Medida Provisória, uma vez que: a) não há relevância e urgência exigidas pelo art. 62 da CF/88; b) em matéria processual é incabível a Medida Provisória, como já disciplina a EC n.º 32/01 (que alterou o art. 62, I, “b”, da CF/88).

Luiz Eduardo Gunther

é juiz no Tribunal Regional do Trabalho da 9.ª Região.
Cristina Maria Navarro Zornig é assessora no Tribunal Regional do Trabalho da 9.ª Região.

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