O mínimo sem milagres

Pouco importa se o mínimo está vigendo desde 1.º de abril, ontem, ou se deveria voltar a ser decretado para entrar em vigor na data tradicional, Dia do Trabalho, 1.º de maio. Primeiro de abril é o dia da mentira e, de qualquer forma, o salário mínimo é uma mentira. Mentira porque está longe de satisfazer as necessidades básicas do trabalhador e de sua família, objetivo para o qual foi criado. Mentira porque, em certas regiões do Brasil, por microscópico que seja, nem assim é pago. Não obstante, quando Lula anunciou o novo mínimo de R$ 240,00 perante líderes de trabalhadores, concedendo um aumento nominal de 20% sobre o até então vigente, de R$ 200,00, houve condescendência. Quase todos consideraram o aumento razoável porque contém uma majoração real. Ínfima, mas real, pois é de apenas 3,5% considerando o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) medido pelo IBGE nos últimos 12 meses, terminados em fevereiro. Protestos só ocorreram em relação ao de somenos: a data, ou seja, se a mentira do mínimo deveria ser dita em 1.º de abril ou em 1.º de maio.

Justificando o tamanho do salário mínimo decretado, Lula disse que quando não há dinheiro, não há milagre. Acrescentou que tem de pensar no País para os próximos vinte anos e, por isso, prefere dizer não do que dizer sim. Adicionou que assim é melhor do que não conseguir depois cumprir promessas feitas. A fixação em R$ 240,00 é uma decisão política. Milagre será se, com majorações tão pequenas, o presidente venha a cumprir sua promessa de dobrar o poder aquisitivo dos trabalhadores em quatro anos.

O andar da carruagem começou arrastando-se. De acordo com estudos do Cesit -Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Unicamp, para dobrar o mínimo até o final de 2006, os 3,5% de aumento real concedidos deveriam ser de 19%. Dezenove por cento neste ano e também nos anos subseqüentes da administração petista. Nos cálculos daquele centro de estudos, o mínimo de agora deveria ser de R$ 275,72. E seguir, nos anos seguintes, com majorações reais significativas para efetivamente dobrar o poder aquisitivo dos trabalhadores. Milagre será repor essa defasagem nos quatro anos prometidos. A mentira matemática melhor cabe no 1.º de abril do que no Dia do Trabalho.

Há quem imagine que o governo possa, para adiantar o passo da carruagem, decretar ainda neste ano um novo salário mínimo. E mais um ou dois no ano que vem e nos subseqüentes. Para tanto, retiraria o assunto do âmbito político para dar-lhe suporte técnico. E isso dependerá da reforma da Previdência, pois sabe-se que o salário mínimo brasileiro hoje funciona mais como um freio à expansão das aposentadorias e pensões do INSS do que como piso dos ganhos dos trabalhadores. Mesmo como indexador, vem perdendo suas funções.

Comparativamente ao mínimo pago em outros países, sejam desenvolvidos, em desenvolvimento e até subdesenvolvidos, é ínfimo, para não dizer, vergonhoso. Mas, majorá-lo para um patamar decente não depende de vontade política e, sim, de milagres econômicos e reformas de base que Lula, para cumprir suas promessas, terá de promover. E fazer aparecer o dinheiro que, quando candidato, imaginava fluir de acordo com a vontade política dos governantes e hoje entende que só nasce com inflação, empréstimos ou desenvolvimento econômico com aumento de produção.

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