Fábio Botelho Egas

O leão e a leoa

O desfeito casal senta-se à mesa de audiências do juiz, devidamente acompanhados de seus respectivos advogados, a fim de tratar de uma possível conciliação no processo que o ex-marido move em face da ex-mulher pleiteando a liberação do ônus de pagar pensão alimentícia anteriormente fixada, quando da separação judicial. Haviam se passado cinco anos da ruptura do casamento.

Abertos os debates, de imediato, a audiência se incendiou, com ríspidas palavras de lado a lado, numa demonstração de que o diálogo estava muito distante e o acordo era natimorto.

Não bastasse a aguda animosidade do ex-casal, entra o juiz no meio da discussão e em alto e bom som afirma: “Mas esta cláusula é leonina, Doutor!”

Referia-se o digno magistrado à determinada cláusula da separação judicial que havia estabelecido o direito do então marido de parar de pagar pensão alimentícia à sua então mulher, na hipótese dela se remaridar.

Desnecessário dizer que tal categórica afirmação do juiz caiu como uma bomba naquela já tensa audiência. Enfim, havia se conseguido reascender a chama de discórdia, aparentemente abrandada ao longo dos cinco anos da separação daquele ex-casal.

Sem pretender adentrar no mérito do dever do magistrado de manter-se isento e imparcial até que profira seu julgamento, após terem as partes debatido no processo seus pontos de vista, produzido suas provas etc., é necessário colocar a questão sobre a perversidade ou não de uma cláusula posta de comum acordo no corpo de uma separação judicial dispondo acerca da dispensa do marido de pagar alimentos para mulher, vindo ela a viver com outro homem.

Tão pouco deve-se entrar na questão pela porta que obriga as pessoas a cumprirem o que estabelecem contratualmente, pois não é esse o propósito central.

Ora, quão tolerável é pagar pensão alimentícia para ex-mulher ou mesmo ao ex-marido, dado que a lei é igualitária nesse sentido ou seja ao “Ex” -, sabendo que este vive com outrem?

Existe, mesmo, plena liberdade de vida nesses casos?

A lei que prevê a pensão alimentícia baseia-se no princípio da solidariedade humana que deve reinar, também, entre aqueles que um dia formaram um núcleo familiar. De outro lado, é também a lei que possibilita cessar o pagamento da mesma pensão quando da nova união do credor desta quantia.

Se assim é, lembrando-se de que Justiça e Lei ora se combinam, ora nem tanto, de que lado, então, nesta selva, ficar, no do Leão ou no da Leoa?

Fábio Botelho Egas é advogado especialista em Direito de Família e Sucessões, na área contenciosa e consultiva.

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