Enforcamento do pinheiro-do-Paraná

Só um salva-vidas muito trapalhão tentaria salvar uma vítima, puxando-a por uma corda, que estrangula o pescoço do afogado. A vítima estaria salva das águas, mas morreria enforcada… Com o pinheiro-do-Paraná está acontecendo exatamente isso. Quem o quer salvar está usando meios que aceleram seu desaparecimento.

Os tempos negros da Araucaria angustifolia tiveram seu auge nos anos 1960 e 1970, quando volumes irracionais de cortes saquearam, impiedosamente, essa riqueza florestal, em troca de efêmeras divisas no mercado internacional. O então Instituto do Pinho e, logo depois, o nascente IBDF – hoje metamorfoseado no Ibama – foram criados, dito, para o desenvolvimento florestal, mas registravam os volumes cortados que teriam chegado ao impressionante volume de três milhões de metros cúbicos ao ano. Os números oficiais estão no estudo sobre os pinheirais paranaenses realizado em meados de 60 pela Codepar, antecessora do Badep. Números certamente bem inferiores ao real, mesmo assim excediam em mais de 10 vezes a capacidade de recomposição anual das matas então existentes.

A corrida a este ouro durou pouco, coisa de duas décadas, e, hoje, esta economia, digo, fonte de renda, já está extinta. Por que não economia? Porque, para ser econômico, tem que ser sustentável, e do que se vê hoje se concluiu que não houve economia, houve saque, gatunagem de patrimônio natural apossado por uma geração que, em sua ânsia pelo capital, se esqueceu de economizar para o futuro. Triste herança cultural dos exploradores, digo, primeiros colonizadores que, nestas terras do pau-brasil, aportaram (é verdade que eles só começaram: a biopirataria que hoje nos saqueia não é coisa da nação lusa…).

Os tempos atuais não deixam de continuar muito difíceis para o pinheiro-do-Paraná. Já são raros os cortes para o setor madeireiro, mas essa espécie virou maldita entre os agricultores onde quer que ocorra a Araucária. A proibição radical de seu aproveitamento futuro faz com que todo pinheiro que venha a nascer seja, compulsoriamente, morto, arrancado, pisoteado, cortado, queimado, num infanticídio ambiental sem precedentes na história brasileira. Os ambientalistas de gabinete, os juristas e os legisladores, que escreveram a promovem uma legislação florestal conflituosa, puseram a corda no pescoço do afogado e estão puxando a corda. Não se corta mais pinheiros, mas também não se planta e não se deixa nenhum crescer. As árvores hoje existentes morrerão sem deixar descendência. Hoje, a espécie está ameaçada na classe “vulnerável”, mas a nossa geração assistirá à mudança das categorias, para “rara”, depois, para “extinta”. O único lugar em que se poderá ver algumas poucas dezenas de exemplares será no Museu do Capão da Imbuia, uma área de intensa urbanização – um museu, percebe? já que nossos governantes, até hoje, não conseguiram sequer criar um parque estadual dedicado a essa espécie.

Veja o impasse: com uma lei, os órgãos ambientais dizem que pinheiro plantado poderia ser depois aproveitado, mas nenhum agricultor consegue licença para corte dos plantados, porque os técnicos dizem que outra lei não autoriza corte de espécie que está na lista das em extinção. Então, pinheiro adulto hoje não mais se corta, plantado ou não, com manejo ou não. Sem uma mínima expectativa de se poder fazer uma poupança econômica, na forma de estoque futuro de madeira de pinheiros, ninguém mais planta essa espécie. Se nascer algum pinheirinho – especialmente em área que se pode cultivar – este é destruído, porque representa perda de área agrícola necessária à subsistência. Bem que poderia ser de futura poupança.

Esta realidade contra o pinheiro está sendo levantada pelo Plano Grimpa, um projeto do Instituto do Desenvolvimento Sustentável, uma ONG paranaense, que também se preocupa com nossa espécie-símbolo. Com os dados obtidos, duas campanhas serão ativadas. A primeira proporá ajustes na legislação que está levando a espécie à morte; a segunda, pretende converter os corações dos agricultores em favor dessa espécie, evocando sua importância na promoção de emprego, de combate à fome, de proteção de mananciais, de proteção a toda a biodiversidade dos planaltos sulinos. Um projeto muito grande, já apoiado pela PUCPR e UFPR, mas que precisa do apoio de todos os que (ainda) amam essa espécie florestal. Informações sobre o plano e como participar podem ser obtidas no site: www.grimpa.org.br.

Arnaldo Carlos Müller

é professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e coordenador do Instituto de Desenvolvimento Sutentável.

Voltar ao topo