Curitiba, o grande palco do teatro nacional

Há 16 anos, a história se repete. No mês de março, durante alguns dias, Curitiba respira teatro. Em todos os cantos da cidade, em palcos ou espaços alternativos, a população tem acesso a uma vasta programação, pensada para agradar gente de todas as idades e gostos. É o Festival de Teatro de Curitiba (FTC), o maior do Brasil e um dos maiores da América Latina.

Na edição deste ano, o público foi de 120 mil pessoas, que se dividiram para assistir a 25 espetáculos da mostra oficial e a 219 do Fringe, a mostra paralela que foi criada em 1998 para permitir que mais espetáculos participassem do FTC.

Quando as cortinas se abrem, os holofotes são direcionados para os atores, mas por trás de cada espetáculo, há muita gente que brilha. São técnicos, produtores, camareiras, motoristas e toda a sorte de trabalhadores que fazem a coisa toda funcionar. O time dos bastidores é formado por 500 pessoas e uma delas, Nany Semicek, é responsável por toda a organização do FTC. No comando há seis anos, ela conta que a preparação do festival começa praticamente um ano antes. ?Quando um está acabando, já estamos planejando o próximo?, explica. Em abril começa a produção. Em junho iniciam as reuniões da curadoria, que é uma comissão formada por quatro pessoas em estados estratégicos, que trabalham na escolha dos espetáculos da mostra oficial. Em agosto, as inscrições para espetáculos, oficinas, eventos e trabalhos temporários se abrem e vão até dezembro. ?Em janeiro, enquanto todos estão na praia, nós damos um gás para definir a grade da programação e preparar o guia, que tem que estar disponível no início de fevereiro?.

O coração do festival é bombeado no site, que concentra todas as informações e através do qual a organização se comunica com pessoas do mundo inteiro. ?No site, os espetáculos interessados em participar do festival podem se inscrever, o público pode comprar ingressos de outras cidades e as pessoas podem se candidatar às vagas de empregos. Tudo é canalizado ali?, diz.

Com tantos espetáculos na cidade, o número de atores e diretores nesta edição girou em torno de 1.800. Parte deles, ligados à mostra oficial, ficaram sob os cuidados da organização, que pagou de hotel à alimentação. ?Nós fazemos parceria com restaurantes, que entram como roteiro gastronômico. Nós os divulgamos durante o festival e eles, em troca, alimentam gratuitamente o pessoal?. A turma do Fringe, que veio de todos os cantos do país, teve que se virar para arranjar estada e alimentação. ?A eles damos a oportunidade de participar.?

Evento é o ?Natal? das companhias

Foto: Ciciro Back

Arones: transformação.

Pode parecer curioso, mas o ?cabeça? do Festival de Teatro de Curitiba (FTC), Victor Arones, é gaúcho. Ele vive em Curitiba há 20 anos e há 16 mergulhou de cabeça no festival para não mais largá-lo.

Hoje, ele colhe os louros de não ter desistido do projeto que nasceu com o interesse de trazer mais espetáculos do circuito nacional para Curitiba. ?A gente não imaginava que o festival ia ganhar essa grandiosidade. No início, só havia a mostra oficial, com poucos espetáculos. Mas a cada ano, fomos agregando coisas novas e ele se tornou o que é hoje?, diz. Para Arones, essa constante transformação é o segredo para a continuidade do festival. ?A gente vai adaptando conforme o interesse do público. E ele cresceu assim como o festival em si?, diz. Depois de 16 anos, ele se orgulha do papel que o festival ganhou na vida dos curitibanos, inclusive daqueles que não têm o hábito de ir ao teatro. ?Antes do festival, tinha gente que nunca tinha ido ao teatro. Nós chamamos a atenção destas pessoas e elas responderam?. E a resposta do público é tão positiva que, no meio artístico, o festival de Curitiba é considerado o Natal das companhias. ?É uma grande festa. O público realmente responde. Há peças, especialmente do Fringe, que já estiveram em cartaz e a presença de público foi mínima. Durante o festival, as apresentações costumam lotar?.

E não é só a alegria de quem faz teatro que o festival faz. Com fama nacional, 10% do público – algo em torno de 12 mil pessoas -, vêm de fora. O festival movimenta vários setores, como o ramo hoteleiro, gastronômico, de transporte e até mesmo do turismo. ?Muita gente lucra com o festival. É um evento que já faz parte do mapa cultural brasileiro. Com o FTC, ganha a cidade, ganham os artistas e principalmente, o público?.

Sucesso depende muito do trabalho de bastidores

Foto: Aliocha Mauricio

Camareira Cristiane é parte fundamental do sucesso.

O produtor Áldice Lopes, que trabalha desde a primeira edição do festival, é uma das muitas figuras que ficam por trás das cortinas, com um papel fundamental para que um bom espetáculo aconteça. Pau para toda obra, ele não se limita a auxiliar na produção dos espetáculos que acontecem no Guairão. Ele está sempre disposto a ajudar e faz até mesmo as vezes de cicerone para os colegas que vêm de fora para se apresentar na capital paranaense.

?Também sou ator e viajo muito. Sei como é ruim estar em outra cidade sem conhecê-la direito. Estou sempre pronto a ajudar, a quebrar um galho?, diz. Nesse trabalho, o que poderia dar lugar à tietagem, para Lopes funciona mais como oportunidade de fazer novos amigos. ?A gente acaba se aproximando. Aconteceu isso, por exemplo, com o Paulo Autran?, diz. A boa vontade do produtor é tanta que mesmo que não seja a tarefa, ele não se furta de passar um cafezinho para os atores. ?Passo numa boa. É algo que ajuda a pessoa a se sentir bem. Porque não fazer??. Durante os dias em que acontece o festival, ele fala que todos têm que ficar ligados o tempo todo. ?É um trabalho praticamente de 24 horas. Mas vale a pena, porque quando se faz o que gosta, acaba sendo um grande prazer.?

Se para Lopes o teatro já estava no sangue, a camareira Cristiane Yoshioka começou a gostar de teatro depois que começou a trabalhar no FTC. ?Eu não ia a peças e hoje curto muito. Quando a peça não é aquela correria, dá até para assistir da platéia ou da coxia?, diz. Responsável pela organização dos camarins dos atores, ela fica feliz em saber que é parte fundamental do sucesso do festival. ?Cada um tem um papel e exercê-lo com empenho é a garantia de que tudo vai dar certo e o público terá um ótimo espetáculo?.

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