Arqueologia no Iraque: Sincronismos históricos

Sincronismo é o termo usado para designar as ocasiões em que uma personagem bíblica, geralmente reis, teve contato com reis contemporâneos de outras nações. Um bom exemplo de sincronismo se encontra em Jeremias capítulo 25, verso 1: “Palavra que veio a Jeremias acerca de todo o povo de Judá no ano quarto de Jeoaquim, filho de Josias, rei de Judá, ano que era o primeiro de Nabucodonosor, rei de Babilônia.”


Se a data do primeiro ano de Nabucodonosor é bem-estabelecida por informações contidas em fontes extrabíblicas, então temos a possibilidade de atribuir a mesma data para o quarto ano de Jeoaquim, e deste modo obter um ponto seguro a partir do qual a cronologia dos últimos reis de Judá pode ser construída. Assim, se o primeiro ano de Nabucodonosor foi 604 a.C., então a mesma data se aplica ao quarto ano de Jeoaquim.

Outro sincronismo interessante se encontra em Jeremias capítulo 52, verso 31: “No trigésimo sétimo ano do cativeiro de Joaquim, rei de Judá…, Evil-Merodaque, rei de Babilônia, no ano em que começou a reinar…” Ora, o ano em que Evil-Merodaque começou a reinar é conhecido por outras fontes como sendo o ano 560 a.C. Logo, o ano em que levaram Joaquim cativo para Babilônia foi 597 a.C. Esta é a data geralmente aceita para a primeira tomada de Jerusalém por Nabucodonosor e para a primeira grande deportação de judeus para Babilônia.

Precisão

O primeiro sincronismo com uma data precisa que se encontra na Bíblia é o de I Reis capítulo 14, verso 25: “No quarto ano do rei Roboão, Sisaque, rei do Egito, subiu contra Jerusalém.” Lamenta-se que neste caso não é dado o ano correspondente do reinado de Sisaque. Neste exemplo, é a cronologia bíblica que melhor se estabelece. Como o cisma que resultou na separação do reino de Israel do de Judá ocorreu em 931 a.C., e este foi o primeiro ano de Roboão, então seu quinto ano só pode ser 926 a.C.

Se a cronologia egípcia para este período é pouco confiável, tem-se felizmente, ao menos, confirmação de que esta expedição contra Jerusalém de fato ocorreu. Com efeito, Sisaque, um faraó da 22.ª dinastia, fez gravar numa das paredes do templo de Karnak uma descrição detalhada desta expedição, que afetou muitas cidades de Judá e Israel fora Jerusalém, se a dita inscrição merece fé.

Em alguns exemplos de sincronismo, a informação toda se encontra em fontes não-bíblicas. Assim, Salmaneser III, rei da Assíria, menciona em inscrições vindas à luz, graças a descobertas arqueológicas feitas na Mesopotâmia, que Acabe, rei de Israel, fez parte da aliança de vários reis que o enfrentaram na Batalha de Qarqar, em 853 a.C. Esta data é muito bem-estabelecida graças às listas de epônimos conservadas nos arquivos dos reis da Assíria. Os assírios não datavam os acontecimentos segundo uma era, como fazemos, mas davam a cada ano o nome de um alto-funcionário do governo.

País de Onri

Tais funcionários é que chamamos de “epônimos”. Várias listas com os nomes de centenas de epônimos são conhecidas, o que permite colocar a cronologia da Assíria numa base bastante segura.

O mesmo rei Salmaneser III menciona, noutra inscrição, que Jeú, rei de Israel, pagou-lhe tributo em 841 a.C. É curioso que Jeú seja designado nas inscrições assírias como rei do país de Umri (Onri). Onri, o fundador de uma nova dinastia em Israel e pai de Acabe, aparentemente alcançou uma grande projeção internacional, fato que não se poderia deduzir dos poucos versos que o livro de Reis lhe atribui. Tão significativas são estas duas datas, 853 e 841 a.C., que elas servem de âncora para a cronologia dos reis de Israel e Judá proposta por E. R. Thiele, em seu livro, The Mysterious Numbers of the Hebrew Kings.

Siegfried Júlio Schwantes

é Ph.D em Línguas Semíticas pela Universidade Johns Hopkins. Brasileiro, atuou durante décadas em diversas escavações no Oriente Médio. Aposentado, reside em Silver Springs, Maryland, EUA.

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