Morte súbita: O prazer de muitos agora é risco de vida

Primeiro foi a morte do camaronês Marc-Vivien Foe, depois do húngaro Miklos Fehér que atuava no futebol português, mas foi com o trágico acontecimento que vitimou o zagueiro Serginho, do São Caetano, que a notícia de morte súbita no esporte abalou a opinião pública brasileira. De uma hora para outra, atletas profissionais, praticantes de atividades físicas nas academias e “domingueiros”, aqueles atletas de final de semana, perceberam que o prazer que o esporte lhes proporciona pode, também, lhes tirar a vida.

Mesmo com o clima eleitoral acirrado em várias cidades, a morte súbita do vigoroso atleta tornou-se tema principal das rodas de bate-papo e de infindáveis discussões nas mesas-redondas dos programas esportivos. Até mesmo quem não é acostumado a acompanhar jogos de futebol, tinha sua opinião a dar sobre o assunto. Afinal, imaginam, se aconteceu com um atleta de alta performance, que passa por avaliações constantes, o que dizer dos pobres mortais que nunca passaram por um eletrocardiograma ou por uma ecocardiografia. Teste de esforço, então, nem falar.

Avaliações, quem faz?

É justamente aí que mora o problema. Quem disse que esses ditos atletas profissionais passam por exames regulares? Quem disse que eles são, realmente, monitorados freqüentemente? Salvo raríssimas exceções, poucos são os clubes e academias que proporcionam essa segurança aos seus praticantes. Mesmo antes da morte de atletas ter se tornado rotina entre as notícias do esporte, a Sociedade Brasileira de Medicina do Esporte vem tentando implantar consensos que definam quais exames e qual esporte é o mais indicado à sua condição, “obviamente depois de passar por uma bateria de exames específicos”, salienta o médico paranaense, Marcelo Leitão, diretor da entidade.

“Não queremos proibir ninguém de praticar esportes, não é nada disso”, enfatiza o cardiologista Pedro Michelotto, que há 30 anos vem se dedicando a orientação de exames físicos para quem tem problemas cardíacos. “O que estamos tentando evitar é que pessoas normais e atletas, tanto profissionais como domingueiros, corram menos riscos de sofrer morte súbita”, emenda, completando que, sem nenhum acompanhamento, esse risco torna-se muito mais evidente.

Esporte é vida!

Parece não haver dúvidas de que o risco de morte súbita em um esportista eventual é muito maior do que em alguém que pratica esportes todos os dias. A grande maioria das pessoas, infelizmente, entra no esporte sem se submeter a nenhum exame ou avaliação. Segundo Michelotto, isso acontece com os maratonistas eventuais, os praticantes de triathlon e, até mesmo, com os recrutas que participam anualmente da tradicional corrida do “facho” em Curitiba, exemplifica.

Marcelo Leitão diz que as pessoas precisam se conscientizar sobre a importância de um acompanhamento médico efetivo antes de se iniciar em algum esporte. O médico não quer que se entre numa paranóia, da qual o esporte se torne o grande vilão, afinal atividade física é saúde. “O que não queremos é que o esforço demasiado na prática de algum esporte se torne um gatilho que acione alguma doença preexistente no atleta, seja ele profissional ou de final de semana”, frisa Leitão.

As notícias sobre a morte de Serginho ainda são contraditórias. Segundo informações não oficiais, o atleta passou por uma bateria de exames que indicou a necessidade de um cateterismo. Segundo amigos, o jogador teria afirmado que não abandonaria o futebol, pois, segundo ele, era como lhe tirar a vida. “Se ele quiser continuar em atividade correndo riscos desnecessários, mesmo sabendo das suas reais condições de saúde, não existe avaliação no mundo que o proteja da morte súbita”, enfatiza Leitão.

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Ah, se tivesse um desfibrilador por perto

O médico intensivista Alvaro Réa Neto, responsável pela UTI do Instituto de Neurologia de Curitiba ? Hospital Ecoville, adverte que 150 mil brasileiros são vítimas anuais da morte súbita ? a exemplo do episódio que tirou a vida do jogador Serginho, do São Caetano. Para ajudar a reverter esses índices, o médico alerta para a necessidade de autoridades e empresários formarem brigadas de leigos capacitadas em utilizar um desfibrilador, aparelho que solta uma descarga elétrica no coração da pessoa enfartada para que ele volte a bater. Estatísticas mostram que o mecanismo que provoca a fibrilação ventricular (distúrbio nas contrações do coração em decorrência do infarto) responde por 80% das paradas cardíacas. O desfibrilador é a única forma de garantir temporariamente a sobrevida desses pacientes. No Paraná já existe uma lei que obriga a manutenção do desfibrilador em locais com grande fluxo de pessoas, como aeroportos, shopping centers, estádios de futebol, entre outros. Em Curitiba, de acordo com lojas especializadas, ele custa entre R$ 12 e R$ 13 mil. Os equipamentos compactos, com menos recursos, mas com a mesma eficácia, podem ser adquiridos por até R$ 6 mil.

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