Lixo é última alternativa de sobrevivência para 500 mil brasileiros

Para muitas pessoas, a última alternativa de sobrevivência é ?cair no lixo?. Segundo a pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública Denise Juncá, a expressão é muito usada pelos que sobrevivem do lixo para definir o sentimento comum sobre suas condições de vida.

“Cair no lixo, como os catadores costumam dizer, não é uma escolha e sim uma necessidade. Mas não deixa de haver entre eles a certeza de que executam uma tarefa digna, que exige habilidades específicas, uma rotina e normas de conduta”, explica a pesquisadora.

Denise estudou três tipos de catadores: os que trabalham em cooperativas, os que fazem parte de associações e os que moram em aterros sanitários. A maior diferença entre eles é a percepção de que o lixo é matéria prima, e não resto. Segundo a pesquisadora, as pessoas que se organizam em cooperativas ou associações sentem-se empregadas, com direito à cidadania e com responsabilidade social. “Em cooperativas e associações, os catadores se percebem como agentes ambientais, vencendo o estigma que cerca o trabalho com o lixo”, disse.

Não existe idade para trabalhar com o lixo. Crianças e até idosos vivem em aterros sanitários. “Já conheci mulheres que amamentavam recém-nascidos no lixão”, recorda Denise, que percebeu uma pequena predominância de adultos entre 35 e 40 anos nesta atividade. A maioria recorre aos lixões por falta de trabalho.

Denise citou até mesmo o caso de um catador que tinha nível universitário, mas, por falta de oportunidade, trabalhava como catador de lixo. Porém, essa não é a regra. A pesquisadora observou que as pessoas que trabalham nos lixões tem pouco ou nenhum grau de escolaridade e, por causa disso, foram expulsas do mercado de trabalho.

Trabalhar no lixo, segundo Denise, é uma profissão passada de pai para filho. Na maioria das vezes, os catadores tem alguém na família que cata lixo. ?Geralmente a pessoa que se vê numa situação extrema, lembra de alguém na família que trabalha com lixo e vai trabalhar também?, contou a pesquisadora.

Tanto nos aterros quanto nas cooperativas ou associações, a noção de saúde é a mesma. “Os catadores reconhecem doenças de pele e é comum ouvir reclamações sobre dores articulares ou problemas alérgicos, mas sempre de forma vaga e sem relação direta com o lixo. O catador só se considera doente quando fica impossibilitado de trabalhar”, disse.

Os acidentes provocados por materiais cortantes e pelo intenso trânsito de caminhões nos locais de coleta são apontados como os maiores riscos no trabalho com o lixo. “Muitas vezes, os catadores improvisam proteção para os braços e pernas, mas o acidente é atribuído, na maioria das vezes, ao descuido do trabalhador”, explica.

De acordo com cálculos da Associação do Compromisso Empresarial para Reciclagem, existem mais de 500 mil catadores de lixo trabalhando oficialmente no Brasil. Grande parte dessas pessoas está organizada em pequenas cooperativas, que surgem com apoio de comunidades locais.

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