Licença ou chantagem

Ao anoitecer de quinta-feira, o presidente do Senado, Renan Calheiros, gravou um pedido de licença por 45 dias do seu cargo na mesa do Senado Federal. Assumiu Tião Viana, do PT, vice-presidente. A licença de Renan deu-se quando não só os oposicionistas pediam que se afastasse do cargo e na planície se defendesse das múltiplas denúncias que contra ele vêm sendo apresentadas na Comissão de Ética, algumas com conteúdos que podem, em prosseguimento, resultar em ações no Judiciário, tanto de natureza cível como criminal. Peemedebistas e petistas também o queriam fora.

A gota d´água que levou a crise no Senado a uma situação insustentável foi a denúncia de que o senador alagoano vinha usando seu cargo para mandar espionar senadores que são contra ele, fato confirmado por terceiros e inclusive funcionários do Senado. A situação deteriorou-se a ponto de a própria líder governista Ideli Salvatti haver declarado da tribuna que o melhor seria que ele deixasse o trono para se defender.

Mais ainda quando, em plenário, discutiu com vários senadores do PMDB, do PT e da oposição que queriam o seu afastamento e chegou a cassar-lhes a palavra e retirar-se virando-lhes as costas, numa atitude ofensiva que evidenciou toda a sua arrogância. Pior ainda foi o afastamento, pelo líder do PMDB, senador Valdir Raupp, dos senadores peemedebistas Pedro Simon e Jarbas Vasconcellos da Comissão de Constituição e Justiça, substituídos por colegas da tropa de choque de Renan. Os senadores que ainda levam a sério a necessidade de preservar a dignidade do Senado consideraram a medida ofensiva. Afinal de contas, os dois senadores são o que há de melhor em dignidade, no maior partido das hostes governistas, o PMDB. Nas vésperas da renúncia temporária de Renan Calheiros, os dois ilustres senadores foram reconduzidos ao cargo, pois o grupo situacionista sentiu que dera um tiro no próprio pé.

Deve ter influenciado a decisão de licenciamento a inesperada designação do pedetista Jefferson Peres como relator, na Comissão de Ética, do mais recente processo contra Renan Calheiros. O presidente da comissão declarava que ninguém queria o cargo de relator até que Jefferson disse que, se convidado, aceitaria. E foi convidado, aceitando, para espanto de Renan Calheiros. Jefferson Peres é um dos mais ferrenhos defensores da ética do Congresso Nacional e de sua seriedade e severidade já deu sobejas provas. Ele já deixou bem claro que não amolece em relação ao presidente do Senado e que tem posição favorável à cassação do seu mandato.

Teria o presidente do Senado posto a mão na consciência e tomado uma posição digna, afastando-se temporariamente do cargo para que se esclareçam as denúncias que contra ele pesam? Há quem duvide e com argumentos bastante lógicos. Renan estaria sentindo o claro recuo dos situacionistas, senadores do PT e mesmo do PMDB que se uniram aos partidos de oposição para forçá-lo a descer do trono e submeter-se a julgamento. Isso significaria uma posição neutra ou mesmo contrária à sua manutenção por parte do presidente Lula, embora este dê a entender que lava as mãos.

Acontece que a tão desejada CPMF prorrogada até 2011 pelo governo, pois lhe dá algo como R$ 40 bilhões por ano, vai ser votada no Senado em duas rodadas, a última pouco antes do término da licença de Renan Calheiros. Voltando ao cargo antes do final da votação, Renan estaria chantageando o governo. Ou Lula e os situacionistas o apóiam, ou ele não vai manobrar para a aprovação, em última votação, da CPMF, o que se dará no final de dezembro. E terminando dezembro sem a aprovação, a CPMF extingue-se.

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