Tahyana Schenkel Gomes

Inconstitucionalidade da impronúncia

O Código de Processo Penal brasileiro, desde sua edição, em 1940, já prevê a pronúncia do acusado caso haja prova da materialidade e indícios de autoria do fato tido como crime.

Somente se provada além de qualquer dúvida sua inocência teria lugar a absolvição, segundo o princípio do in dubio pro societate, aplicável ao rito especial previsto para crimes dolosos contra a vida.

Por outro lado, havendo dúvida sobre a materialidade ou na inexistência de indícios de autoria, o acusado seria impronunciado, ou seja, não é considerado inocente nem culpado.

A recente alteração legislativa trazida pela http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/-Ato2007-2010/2008/Lei/L11689.htm#art1 Lei n.º 11.689, de 2008 manteve o instituto, sem grandes alterações.

A doutrina é pacífica em conceituar a decisão de impronúncia como decisão interlocutória mista não terminativa. Entretanto, pode-se perceber que a impronúncia é duramente criticada pela maioria dos autores que se aprofundaram em sua análise.

Os motivos para tais críticas fundam-se principalmente no fato de que a impronúncia apenas perpetua a sensação de insegurança trazida pela pendência na solução de um caso penal, seja para a vítima, para o réu, bem como para o Estado.

É o que a doutrina chama de non liquet: uma decisão em que o Estado não declara a inocência do acusado, mas também não o condena, apenas tangencia a disputa penal, sem solucionar o caso.

A decisão de impronúncia seria como a espada de Dâmocles, pois o réu não é declarado culpado, não ficará preso, mas sim atormentado com a hipótese de que um dia o possa ser.

Outro motivo questionado é a consagração do princípio da presunção de inocência em nosso sistema constitucional. Se todos são presumidamente inocentes até sentença penal condenatória definitiva, como sustentar uma decisão que não absolve o acusado, mesmo após toda a investigação policial e instrução processual? Cresce na doutrina a posição de inconstitucionalidade de tal instituto.

O professor Paulo Rangel, no seu livro Direito Processual Penal, destaca que a decisão de impronúncia traz resquícios de um sistema inquisitorial, que remonta à época em que o réu deveria, a todo custo, ser condenado.

Um exemplo de tais resquícios é o fato de que logo a seguir à decisão de pronúncia, imediatamente o legislador ressalva que até a extinção da punibilidade surgindo novas provas contra o acusado, poderá ser proposta nova ação contra este.

Quanto à hipótese de surgimento de provas da inocência do acusado, entretanto, há o que se pode chamar de “silêncio eloquente”, demonstrando claramente que tal hipótese jamais foi pensada sob o prisma da presunção de inocência, mas sim da presunção de que o réu é culpado, mas que o Estado não o conseguiu provar.

Tahyana Schenkel Gomes é assessora jurídica e aluna do curso de preparação à Magistratura da Escola da Magistratura do Paraná. Esse artigo é parte da monografia de conclusão de curso que obteve nota 10.

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