Guerrilha no campo

Nas cidades, já temos uma guerrilha. Como tal, tem-se qualificado a guerra entre traficantes e as autoridades policiais, principalmente no Rio de Janeiro. Não é, óbvio, um movimento subversivo com motivação ideológica ou em busca do poder político, mas um crescimento da criminalidade, que se organiza, introduz-se nos organismos da sociedade supostamente organizada, com o fim de realizar seus intentos ilegais. É desrespeito às leis e às autoridades. É enfrentamento direto, na busca de saber quem manda mais: se os criminosos ou as autoridades armadas com uma polícia falha, não raro corrupta e incapaz de vencer o crime organizado.

Talvez merecessem melhor a qualificação de guerrilha urbana as invasões dos sem-teto, embora aqui os fatos ilegais se dêem com menor violência, maiores justificativas sociais e morais e envolvam famílias de desempregados, trabalhadores mal remunerados e famílias marginalizadas da sociedade. Este é, entretanto, um movimento que se organiza a olhos vistos, enquanto o governo pouco ou nada faz para resolver os problemas habitacionais que afligem milhares de brasileiros. Guerrilha urbana será quando e se as invasões se derem em próprios habitados, edifícios e casas que têm moradores, inquilinos ou proprietários residentes. Por enquanto, é uma eloqüente manifestação de protesto, visando fazer com que as autoridades se mexam, entendendo que o problema habitacional é mais grave do que pensam, e exige providências mais rápidas e radicais que as que se vêm planejando e ainda não se realizam.

Corremos o palpável e iminente risco de uma guerrilha no campo, com as invasões de propriedades pelos diversos movimentos de sem-terra.

Na opinião do ex-deputado federal constituinte Plínio de Arruda Sampaio, que é promotor público e consultor da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, além de professor universitário e coordenador da equipe responsável pelo esboço do atual Plano Nacional de Reforma Agrária, “se prosseguirem os obstáculos à implantação do Plano Nacional de Reforma Agrária, o Brasil corre o risco de ter uma guerrilha no campo, a exemplo do que ocorre na Colômbia”. Ele entende que as ocupações de terras serão intensificadas. São uma forma de pressionar ao governo a acelerar os assentamentos. Sampaio critica a revisão da meta de assentamentos, de um milhão para 520 mil famílias, em quatro anos, em função da falta de recursos. Afirma que a reforma agrária está sendo “empurrada com a barriga” há 160 anos.

A análise e a advertência merecem atenção. Os movimentos de sem-terra já foi engrossado com desempregados, trabalhadores urbanos favelados e mal remunerados e, para que se pareça com a guerrilha que ocorre na vizinha Colômbia, só falta a intromissão do narcotráfico. Mas este, quando participa da chamada “guerrilha urbana” em São Paulo, e principalmente no Rio de Janeiro, explora uma crise social aguda sofrida em especial pelos favelados. E estes, embora tenham objetivos mais nobres, acabam juntando-se ao crime organizado até mesmo por falta de opção. Ou em busca do apoio e cobertura que não recebem das autoridades constituídas. Pois não é diferente a situação dos sem-terra. Vivem na mesma miserabilidade, no mesmo desamparo e ainda têm, sobre os sem-teto, a vantagem de portarem bandeiras ideológicas. A reforma agrária é, hoje, uma questão social e de segurança nacional.

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