Greves e silêncio

A realização de eleições, sejam concomitantes ou não, funciona como um tônico para a democracia no Brasil, mais que em muitos países, pois aqui o sistema democrático, embora exista, é tísico, parcial e restrito. Embora existam os três poderes que são os pilares do sistema e pelo voto os governantes sejam eleitos, faltam a democracia econômica e social. E a política tem tantos vícios que por vezes ficamos com a impressão que está caindo pelas sarjetas.

Há que se aperfeiçoar o sistema, se preciso até abandonando certos tabus, como a imprescindibilidade dos pleitos diretos, e, antes de mais nada, estabelecer clara transparência, seja nos partidos e nas campanhas, como nos governos. Este ano, por exemplo e especialmente nos dias que correm, já vésperas do pleito que vai eleger até um novo presidente da República, muita coisa é revelada de forma distorcida e muito silêncio proposital esconde fatos que, se sabidos e entendidos, influiriam nas escolhas do eleitorado.

Estamos vivendo um período de greves no setor privado e também ou principalmente no setor público. A paralisação dos procuradores da Fazenda Nacional, que já dura quatro meses, já causa ao País um prejuízo estimado em R$ 1,4 bilhão. Tal prejuízo também se traduz pela retenção de mercadorias importadas, falta de insumos essenciais para a indústria, inclusive de medicamentos, e como efeitos de onda (wave efects) há gente doente sem tratamento e até morrendo à espera de, por exemplo, sessões de hemodiálise, essenciais para os doentes com insuficiência renal. Transplantes têm sido adiados e cirurgias urgentes e essenciais ficam para depois, se os pacientes não morrerem antes.

Dessa greve nada fala o governo, embora seja uma luta dos procuradores contra o poder público que deve ser objeto de sérias negociações, concessões ou negativas. Mas, de qualquer forma, soluções. As paralisações no INSS põem os pobres a sofrer nas filas. Paralisações também têm ocorrido nos organismos de fiscalização sanitária, com graves prejuízos para a população e mortes já contabilizadas por falta de assistência médica e medicamentosa. Os medicamentos só podem ser liberados com a licença do sistema. Há greves no setor privado e, num país em que a economia sofre tantas intervenções positivas ou negativas dos governos, não há como isentar autoridades por sua eclosão e permanência. E causam prejuízos econômicos, financeiros e desemprego. Mas o poder público silencia como se nada tivesse com isso.

Esse silêncio é proposital. Não convém a quem está no poder fazer com que o povo, que vota, descubra a responsabilidade do governante. O povo que sofra, desde que vote e eleja até mesmo os responsáveis por seus sofrimentos. É imprescindível para o aperfeiçoamento da nossa incipiente democracia que se ensine ao povo organização social e política, preferentemente nas escolas. Um be-a-bá de como funciona o sistema. O que é de responsabilidade do executivo federal, dos governos estaduais e das prefeituras. O que é missão do Congresso e nele, da Câmara e do Senado. O que fazem ou deveriam fazer as assembléias legislativas, para que servem as câmaras de vereadores. Assim, o eleitorado se tornaria capaz de identificar responsáveis quando está sendo prejudicado.

Hoje, o poder faz o povo sofrer até mesmo por falta de medicamentos e silencia sobre uma greve em setores essenciais. Silenciando, acaba conseguindo votos para os seus comandantes. O povo acaba votando em seus algozes e os elege ou reelege.

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