Estatização na Bolívia

Jorge Alvarado, presidente recém-nomeado da estatal de petróleo da Bolívia (YPFB), já anunciou um plano de estatização das refinarias do país. Começará por duas, que pertencem à Petrobras, e mais vinte postos de gasolina. Lembremo-nos da campanha ?o petróleo é nosso?, tocada pelos nacionalistas e a esquerda brasileiros, tendo como um de seus principais arautos o escritor Monteiro Lobato. Foi uma batalha heróica, que consolidou a estatização do nosso petróleo em mãos da Petrobras.

Na época, tratava-se de uma tomada de posição contra os interesses petrolíferos estrangeiros, que se cartelizavam nas mãos de multinacionais, em especial norte-americanas. E nós tínhamos, então, uma quantidade ínfima de petróleo. Essa luta teve um papel preponderante na caminhada pela independência econômica e mesmo política do Brasil e serviu para que acreditássemos que o nosso povo, através de seu governo, era capaz de implantar e tocar uma indústria estratégica tão importante.

Hoje, apesar de a Petrobras continuar sendo uma estatal, já abrimos as portas para capitais privados no campo da atividade petrolífera. Capitais nacionais ou estrangeiros, não importa. O mundo globalizado e a permanente carência de recursos indicou este novo caminho, já que, importador em grande escala de petróleo, o Brasil precisa chegar o quanto antes à auto-suficiência. E estamos quase lá.

O brado de ?o petróleo é nosso? perdeu o seu sentido econômico, conservando apenas pruridos ideológicos nacionalistas e esquerdistas que se esvaem quando até países com governos de esquerda admitem a necessidade de capitais e tecnologia estrangeiras para exploração petrolífera. No mais, o comunismo implodiu no leste europeu e até a China, que conserva o regime político marxista, faz uma abertura econômica sem xenofobia em relação ao capital estrangeiro.

As fileiras político-ideológicas em que se colocam Lula e o novo presidente da Bolívia, o índio cocaleiro Evo Morales, são as mesmas. Mas no país vizinho e amigo o papel de ?imperialista?, no linguajar dos nacionalistas estrábicos, quem exerce é o Brasil. Lá, a maior parte dos investimentos petrolíferos é brasileira. Temos refinarias e somos o maior consumidor do gás boliviano.

Lula apoiou abertamente a eleição de Morales e, com Hugo Chávez, da Venezuela, tenta atrai-lo para o grupo de países de governos socialistas que se forma na América Latina, em oposição ao capitalismo imperialista dos Estados Unidos, hoje sob o comando particularmente antipático de George W. Bush.

Em editorial que publicamos há algumas semanas já prevíamos uma situação paradoxal como a que agora se instala. Morales e o presidente da empresa estatal petrolífera boliviana, Alvarado, membro do Movimento para o Socialismo, repetem naquele país o mesmo ?slogan? de que tanto nos orgulhamos no passado. Dizem ?o petróleo é nosso?. E os interesses econômicos brasileiros na Bolívia, via Petrobras, estão ameaçados e se chocam com o estreito relacionamento político entre os governos dos dois países.

Vamos descobrir que o imperialismo capitalista que tanto condenamos quando era contra nós, precisa agora ser defendido quando nós é que somos olhados como vilões e os bolivianos se apresentam como vítimas defendendo suas riquezas.

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