Severino e Alencar unidos contra juros

Brasília – O presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, anunciou ontem, na reunião de líderes, que vai criar uma comissão especial para estudar mudanças nas normas sobre taxas de juros. A proposta já ganhou até mesmo o apoio do vice-presidente, José Alencar.

Entre as propostas apresentadas por Severino, está a possibilidade até de se retirar do Comitê de Política Monetária (Copom) a competência exclusiva de controle da taxa de juros. Severino informou que, até que a comissão se instale e produza um relatório, ele decidiu apresentar um projeto de lei complementar que obriga o presidente do Banco Central a comparecer à Câmara e ao Senado para apresentar os dados e tendências de inflação que justifiquem a decisão.

Alencar, por sua vez, afirmou ser favorável à proposta de tirar do Copom a exclusividade na decisão sobre a Selic, defendendo maior representatividade no Comitê, sugerindo a participação de representantes do setor produtivo. ?Não podemos permitir que não seja posto como objetivo principal o desenvolvimento e o enriquecimento nacional. As taxas de juros altas são instrumentos que inibem o investimento e o consumo?, disse.

De acordo com a proposta de Severino, a audiência no Congresso deverá ser feita no prazo de dez dias úteis depois do anúncio de novo aumento da taxa de juros Selic (a taxa de juros básica da economia) pelo Copom. O projeto prevê que o não-comparecimento do presidente do BC implicará em crime de responsabilidade. Severino explicou que o objetivo de sua decisão é estimular o debate no Congresso sobre os seguidos aumentos da taxa de juros.

Reação

Já o líder do governo na Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), questionou a eficácia da iniciativa. ?Minha dúvida diz respeito à própria Constituição, porque se é para trazer o presidente do Banco Central e depois o Congresso não vir a ter nenhum poder para corrigir, qual seria exatamente a função da vinda do presidente do Banco Central??, questionou. ?Trazer o presidente do Banco Central ao Congresso pra quê? Será que isso é compatível com o regime presidencialista? Prefiro crer que o conjunto do Congresso não se manifestará sobre isso e não creio que vá prosperar. É apenas uma proposta. A reformulação do Copom tem uma complexidade maior, não é um projeto de lei que vai resolver isso?, afirmou.

O líder da Minoria na Câmara, José Carlos Aleluia (PFL-BA), não vê que benefícios poderia trazer a limitação da atuação do Copom e do Banco Central. ?O Copom e o Banco Central apenas labutam com os erros do governo. Não entendo que limitando os movimentos do Copom e do BC você vai resolver o problema. O presidente está com o diagnóstico correto mas com a solução errada?, afirmou.

Já o líder do PP, José Janene (PR), disse que Severino não está propondo que o Congresso interfira na decisão sobre juros, apenas que tenha mais poder de fiscalização porque toda a sociedade paga juros. 

Brasileiro procura crédito mais barato, aponta BC

Brasília (AE) – Ao contrário do que disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o brasileiro não está acomodado em pagar juros altos. Mas, em vez de trocar de banco, como sugeriu o presidente, o consumidor tem procurado modalidades de crédito mais baratas. A prova está nos números divulgados ontem pelo Banco Central (BC) que mostram um crescimento de 10% dos empréstimos com desconto em folha em março último, chegando a R$ 15,421 bilhões. Ao mesmo tempo, os financiamentos via cartão de crédito caíram.

?O volume de empréstimos do cartão de crédito teve queda de 4,1% em março, em parte, por esta troca entre as modalidades de crédito?, disse o chefe do Departamento Econômico (Depec) do Banco Central (BC), Altamir Lopes. Os juros do empréstimo consignado são de 37,1% ao ano, contra 74,4% do crédito direto pessoal e taxas ainda mais elevadas em cartões de crédito.

Os empréstimos com o cheque especial, em contrapartida, continuaram a subir em março. ?Isto ainda é reflexo da procura deste instrumento de crédito para o pagamento de compromissos assumidos no final do ano passado?, explicou o chefe do Depec.

Os dados do BC contrariam outra afirmação do presidente Lula: a de que os juros altos não estão afetando o consumo. A média de empréstimos concedidos a cada dia foi de R$ 4,920 bilhões em março, contra R$ 5,202 bilhões em fevereiro. Ou seja, houve uma redução de 5,4% na contratação de crédito. O juro elevado estaria, portanto, inibindo decisões de tomar financiamento para consumir ou investir.

A retração atingiu pessoas físicas e empresas. O volume diário de crédito concedido no primeiro trimestre ainda está 5,2% maior do que o observado em igual período de 2004. No entanto o dado mais recente aponta para queda, depois de oito meses de elevações sucessivas da taxa de juros básica da economia.

 Os números divulgados ontem mostram que ficou mais caro para as empresas tomarem empréstimos para capital de giro e aquisição de bens. No primeiro caso, a taxa anual subiu de 27,9% em fevereiro para 28,4% em março. No segundo, a taxa passou de 25,6% para 26,6%. Para as pessoas físicas, foi registrado ligeiro recuo na taxa do cheque especial (56,3% para 55,3%) e no crédito pessoal (75,3% para 74,4%). No entanto, subiu o custo do crédito para aquisição de veículos (17,8% para 18,3%).

Dólar e altas taxas preocupam Furlan

Ribeirão Preto (AE) – O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, demonstrou preocupação com as altas taxas de juros praticadas no País e a desvalorização do dólar ante o real para o desempenho do setor calçadista brasileiro. Segundo o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Elcio Jacometti, os dois temas foram o centro da conversa entre ele e Furlan, anteontem, por telefone. ?Nós batemos um papo e eu mostrei para o ministro a situação do setor calçadista. O Furlan reconhece as dificuldades, é um grande ministro, mas não adianta culpá-lo, porque é apenas uma parte do sistema?, disse Jacometti. ?E o pior é que ele pouco pode fazer, já que as decisões são exclusivamente da equipe econômica. Quem ganha com dólar baixo e juros altos são os especuladores?, completou.

De acordo com a Abicalçados, apesar de o faturamento no primeiro trimestre de 2005 com as exportações ter crescido 8% ante o mesmo período de 2004, o número de pares comercializados caiu 12,6%. Entre janeiro e março deste ano, foram vendidos 60,16 milhões de pares de calçados brasileiros no exterior e, no primeiro trimestre de 2004, 67,75 milhões de pares. ?Ou seja, com a produção menor, o desemprego tem aumentado na indústria calçadista?, explicou Jacometti.

O setor estima que cerca de 5 mil empregados foram demitidos nas indústrias de calçados neste ano. Para compensar o dólar baixo, os calçadistas brasileiros reajustaram os preços, em dólar, dos produtos e o valor médio do par, comercializado a US$ 6,69 no ano passado, hoje é US$ 8,14, de acordo com a Abicalçados. O reajuste faz com que o País perca mercado para a China, de acordo com Jacometti.

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