Se livrar das amarras e investir

São

Paulo – O governo poderia aumentar seu investimento, mesmo realizando o ajuste combinado com o Fundo Monetário Internacional (FMI), se o orçamento fosse mais flexível. O governo reconhece esse problema e tem o compromisso de completar, até o final de junho, um estudo sobre as implicações da rigidez orçamentária. Esse compromisso é mencionado na carta de intenção enviada ao diretor-gerente do FMI, Horst Köhler, em 21 de novembro.

Não é só o acordo com o Fundo que limita a capacidade de investir do governo. O primeiro obstáculo, e talvez o mais importante, é a estrutura do orçamento público. O item 9 da carta de intenção tem como título “flexibilidade orçamentária e investimento”. O ministro da Fazenda, Antônio Palocci, e o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, observam na carta que o governo só pode realizar “de forma discricionária”, isto é, segundo seu critério, menos de 15% das despesas primárias, isto é, dos gastos não financeiros.

“O resultado dessa rigidez”, afirmam, “é que uma parcela pequena do orçamento tem de suportar a maior parte de qualquer ajuste fiscal”. Em outras palavras: o ajuste é feito muitas vezes por meio de “cortes nos gastos mais produtivos e com maior capacidade de estimular o crescimento”.

A maior parte das verbas orçamentárias é legalmente carimbada. Parte da arrecadação é transferida a Estados, municípios e regiões. Há também porcentagens obrigatórias de gastos em educação e saúde, que se repetem ano após ano, sem depender de planejamento especial. Além disso, os salários e encargos sociais são dificilmente comprimíveis porque o governo tem pouca liberdade na administração de pessoal.

O excesso de vinculação “tende a tornar a política fiscal pró-cíclica e a diminuir o escrutínio da qualidade das despesas vinculadas”. Em linguagem mais simples: como o governo tem pouca liberdade para definir as despesas, a política fiscal tende a agravar a situação quando a economia vai mal. Além disso a obrigação de manter certa distribuição de verbas dificulta o controle de qualidade dos gastos públicos. Os autores da carta reconhecem, ainda, que faltam indicadores de desempenho que permitam avaliar os resultados da execução orçamentária.

Para tornar o orçamento menos engessado, o governo teria de enviar ao Congresso um projeto de emenda constitucional. Além disso, teria de avançar, provavelmente, numa reforma da administração pública. São questões politicamente complicadas e não há, na carta, nenhum compromisso desse tipo. Há apenas a promessa de completar, até o fim do semestre, um estudo sobre o assunto. Esse estudo, segundo a carta, é justificado tanto pelo objetivo de melhorar o gasto de governo quanto pela intenção de introduzir o ajuste cíclico na política fiscal.

O ajuste cíclico, segundo anunciou há poucos dias o ministro da Fazenda, será adotado provavelmente a partir de 2005. A idéia é realizar um esforço extra, nos anos de crescimento econômico, para criar uma reserva financeira. Essa reserva deve permitir gastos maiores nos anos de atividade mais fraca. Em tese, essa política deve atenuar as oscilações econômicas. Mas a eficiência dessa política, segundo dão a entender os autores da carta, dependerá em boa parte da qualidade dos gastos.

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