Redução do juro em meio ponto frustra todo mundo

Brasília

– Após um período de 11 meses sem queda de juros, o Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) decidiu atender aos diversos segmentos da sociedade e reduziu – na reunião que terminou ontem – a taxa básica da economia brasileira – a Selic – em 0,5 ponto percentual, para 26% ao ano, sem viés, ou seja, até a próxima reunião, em julho, a taxa não poderá sofrer alteração. Desde julho do ano passado, os juros haviam subido de 18% para 26,5%. Essas política de restrição ao crédito levou a uma queda signiticativa da inflação, mas, ao mesmo tempo, deixou a economia brasileira muito próxima da recessão.

No primeiro trimestre, o PIB (Produto Interno Bruto, a soma das riquezas produzidas pelo país) recuou 0,1% em relação aos três últimos meses de 2002. Já a produção industrial desabou 4,2% em abril. Por isso, se o BC tivesse mantido a Selic estaria elevando ainda mais o aperto econômico e contrariando praticamente todos os segmentos da sociedade, inclusive a própria cúpula do governo.

O ministro da Fazenda, Antônio Palocci, por exemplo, já havia sinalizado, ainda que muito timidamente, que os juros deveriam cair acompanhando a queda da inflação. Palocci definiu como vitorioso o “esforço feito” para “tirar o Brasil da crise aguda”.

As pressões pela redução da Selic ainda tinham conseguido unir trabalhadores e empresários. Anteontem, um protesto organizado pela Força Sindical, a segundo maior central do país, reuniu pouco mais de 500 pessoas em um protesto contra os juros altos, em São Paulo.

E, nos últimos dias, até mesmo o setor bancário, que lucra com taxas elevadas por emprestar dinheiro ao governo, havia mostrado apoio à queda dos juros. O presidente da Febraban, Gabriel Jorge Ferreira, disse na segunda-feira “desejar” a redução da Selic porque, dessa forma, cresceria a demanda por crédito bancário.

Por último, a redução dos juros também já era esperada pelo mercado, uma vez que a expectativa para o índice oficial de inflação ?o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo)? dos próximos 12 meses é de 7,76%. Ou seja, um patamar abaixo da meta de inflação deste ano, de 8,5%.

O BC só vai expor todas as razões que o levaram a reduzir os juros na quinta-feira da próxima semana, data da divulgação da ata da reunião. Os juros continuarão em 26% ao ano pelo menos até o dia 23 de julho, quando o Copom concluirá sua próxima reunião.

Sem volta

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem, ainda em Assunção, antes de embarcar para o Brasil, que a redução dos juros decidida pelo Comitê de Política Monetária (Copom), faz parte do esforço de crescimento econômico do País. “Não tem mais volta”, disse Lula. Segundo ele, a inflação deixou de ser um “bicho-papão” e, por isso, os juros começaram a cair. “O mais importante é termos clareza que o Brasil, que estava sendo considerado pelo mundo econômico como um país sem solução, é visto, hoje, como uma nação com grande capacidade de crescimento”, falou o presidente.

O presidente voltou a rebater as críticas da oposição. “Fico imaginando que, se esta reunião de hoje (ontem) do Mercosul tivesse sido feita em dezembro do ano passado, não seria o mesmo clima”, analisou. Segundo ele, as mudanças no cenário político e econômico da América do Sul criaram o ambiente para a retomada do crescimento. “O Brasil, como economia maior do continente, tem importância muito grande na região”, disse Lula.

Lula irá se encontrar com o presidente George W. Bush, dos Estados Unidos, sexta-feira (20), mas avisou não ter procuração para falar em nome dos países da América do Sul. Disse, no entanto, que vai tratar de assuntos do Mercosul com os americanos. “Eu não perderia a oportunidade de, estando no país mais rico do planeta, falar sobre o quanto é importante ajudar os países mais pobres.”

Juros devem continuar a cair, garante Palocci

O ministro da Fazenda, Antônio Palocci, disse ontem em Assunção (Paraguai) que, se depender do governo, a taxa Selic não vai mais subir. “Vamos fazer todo o esforço para que os juros tenham uma queda consistente”, afimou, depois de participar da reunião de Cúpula do Mercosul na capital paraguaia.

O ministro observou que o Comitê de Política Monetária (Copom) não toma decisões voluntárias. “(O Copom) toma decisões a partir do que acontece na economia real, no comportamento dos preços. Cada vez mais é preciso que os agentes econômicos olhem para a frente e tomem decisões pensando na inflação futura, e não passada. Se isso acontecer, é seguro que essa trajetória de queda possa continuar”, acrescentou o ministro.

Palocci disse que a redução da taxa Selic em meio ponto porcentual é um sinal efetivo de que a inflação caminha definitivamente para as metas estabelecidas pela equipe econômica. “Isso significa que estamos vencendo, de forma efetiva, a luta contra a inflação, e criando as condições para o Brasil crescer”, afirmou.

Segundo ele, o Copom olhará nas próximas reuniões se o País se comportará em torno da disposição de enxergar a inflação futura e não a inflação passada, ou seja, a decisão de hoje é o primeiro sinal do Banco Central de que as futuras decisões não dependem mais apenas do Comitê. Se tudo isso acontecer, esse movimento econômico puxará os juros para baixo.

Indagado se a magnitude da redução era suficiente para a retomada do crescimento econômico, Palocci insistiu em que esse corte é o início de um processo de redução dos juros. Ao ser perguntado se a queda dos juros poderá calar os insatisfeitos, Palocci disse não acreditar que o Copom e a equipe econômica queiram calar a boca de alguém.

“Vemos como muito salutar o debate econômico. Entendo que as pessoas e os agentes econômicos não podem só cobrar as decisões. As pessoas têm de agir nas suas áreas para fazer com que os indicadores econômicos caminhem bem”, disse o ministro. “Vamos continuar recebendo as críticas, mas vamos continuar agindo com a certeza de que um combate a inflação como esse é para que não tenhamos que tomar medidas piores mais tarde, se formos lenientes neste momento.”

Impacto psicológico, mas sem efeito prático

Empresários e economistas ouvidos por O Estado foram unânimes em opinar que a redução da Selic foi tímida. Na avaliação deles, o aspecto positivo do corte nos juros é a sinalização de tendência de queda progressiva nas próximas reuniões do Copom, porém para a economia brasileira o impacto será praticamente nulo.

“Foi uma decisão razoável, poderia ser mais ousada”, reagiu o presidente da Federação das Associações Comerciais, Industriais e Agrícolas do Paraná (Faciap), Jefferson Nogaroli. Para ele, o recuo é positivo por sinalizar que os juros vão continuar caindo, permitindo a retomada do crescimento econômico. “Mas para o consumidor, até um ponto de queda não significa queda, porque no Brasil ele paga juro de 150 a 200% ao ano”.

O presidente da Associação Comercial do Paraná (ACP), Marcos Domakoski, se disse decepcionado com o resultado do Copom. “Apoiamos as medidas de austeridade fiscal do governo Lula. A resposta está aí, com o câmbio, inflação e risco-Brasil caindo. Mas baixar só meio ponto na Selic não traz o devido refresco para o comércio, indústria e toda economia do Paraná”, declarou.

Para o presidente do Conselho Regional de Economia do Paraná (Corecon/PR), Norberto Ortigara, o corte foi “ridículo” e “cosmético”. “Dar viés ou baixar meio ponto não muda o quadro. O choque deveria ser mais substancioso, entre cinco a dez pontos percentuais, para mexer com a economia e baixar o custo de quem produz. A gente até entende o governo, mas o País precisa voltar a crescer. Do jeito que está a situação, o ano está perdido”.

Na avaliação do economista Vamberto Santana, professor da UFPR e assessor da Federação do Comércio do Paraná, “a redução deve trazer no mínimo um efeito psicológico positivo no sentido de contenção de preços”. “O governo chegou no limite do que poderia segurar na economia a partir da taxa de juros. A continuidade da queda é importante para o desempenho sadio das atividades econômicas e para sinalizar ao consumidor que terá perspectivas de melhoria do seu poder aquisitivo.”

“O Banco Central continua conservador, apesar de todos os indicadores econômicos apontarem que há condições de uma redução maior”, apontou o empresário Roberto Fregonese, presidente do Sindicombustíveis/PR. “Na verdade o efeito da redução é mais psicológico que efetivo. 26% de juros ainda é muito alto e, a princípio, não reflete absolutamente nada para a economia.”

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