Brasília (AG) – Acostumados a enfrentar os inúmeros impasses que já ocorreram dentro do bloco comercial, mas com o cuidado de evitar que as divergências comprometam a imagem do Mercosul perante a comunidade internacional, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai vivem um dilema inédito. Ao tentar minar a candidatura do uruguaio Carlos Pérez del Castillo ao posto de diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), lançando o seu próprio candidato – o embaixador Luiz Felipe de Seixas Corrêa – o Brasil acabou ficando completamente isolado no Cone Sul.
Mesmo constrangidos, Argentina e Paraguai revelam que estão ao lado de Castillo, porque acertaram o apoio antes de o Brasil se manifestar.
Diante disso, o governo brasileiro agora espera que os parceiros argentinos e paraguaios pelo menos incluam o nome de Seixas Corrêa na lista de preferências que começa a ser entregue nesta segunda-feira, em Genebra, na Suíça, ao conselho geral da OMC.
?O ideal seria se fosse um só candidato no Mercosul, mas não podemos deixar de apoiar o Uruguai, porque eles votaram a nosso favor num posto da Organização dos Estados Americanos (OEA)?, explica o embaixador do Paraguai no Brasil, Luis Gonzalez Árias.
As autoridades argentinas já afirmavam, informalmente, quem é seu favorito. Porém, o apoio foi oficializado somente no início da semana passada, com uma nota do Ministério das Relações Exteriores do país vizinho.
Castillo também tem a seu lado o México. Fora isso, os demais países da América do Sul, especialmente a Venezuela – que tanto tem se beneficiado do discurso político favorável do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a seu colega Hugo Chávez – ainda não se decidiram.
?Esperamos que o Uruguai e a Argentina, durante as consultas, também digam que apóiam o Brasil. Ou seja, que estão fechados com o Castillo, mas que não são contra nossa candidatura?, diz Seixas Corrêa.
Para driblar esses entraves e, ao mesmo tempo, evitar dissabores futuros, o Brasil faz uma intensa campanha em todo o planeta. Até agora, ela tem como saldo o apoio da China e da Índia, países que dividem com os brasileiros a liderança do exitoso G-20 – grupo de nações em desenvolvimento que brigam pelo fim das barreiras e dos subsídios agrícolas nas negociações da OMC.
Convicto de que, num primeiro momento, os países africanos estão fechados com o ministro de Negócios Estrangeiros das Ilhas Maurício, Jaya Krishna Cuttare, o chanceler Celso Amorim intensifica a campanha numa peregrinação à África. Ele aposta que, numa segunda etapa, todos esses países ficarão ao lado do Brasil.
Países entregam lista de ?preferências?
Mesmo diante de todas as dificuldades, o Brasil conseguiu obter importante vantagem na última quinta-feira. Ao criar as regras para a primeira parte da consulta a ser feita aos 148 países-membros da Organização Mundial do Comércio (OMC), a partir desta segunda-feira, a presidente do conselho geral do organismo, a queniana Amina Chawahir Mohamed, determinou que cada associado entregue uma lista de preferências, no plural.
?O fato de a palavra preferências vir no plural é fundamental. Esperamos que, nessa primeira rodada de consultas, os países coloquem o nome do embaixador Luiz Felipe de Seixas Corrêa, sem indicar ordem de precedência na lista?, revela o subsecretário para Assuntos Econômicos e de Integração do Itamaraty, Clodoaldo Hugueney.
Segundo Hugueney, o objetivo da primeira rodada é selecionar só três candidatos até meados de maio. Além de Seixas Corrêa, o uruguaio Pérez del Castillo e Jaya Cuttare (das Ilhas Maurício), está no páreo o francês Pascal Lamy, ex-comissário de Comércio da União Européia (UE). A expectativa é de que a divisão no Cone Sul e no mundo em desenvolvimento seja diluída e o nome do brasileiro prevaleça nas preferências.
Como a escolha do novo diretor-geral da OMC deve ser por consenso, haverá uma segunda rodada, cujas regras ainda são desconhecidas. Devem pesar, na avaliação dos associados, a visão que cada candidato tem da OMC e seu papel no mundo globalizado.
?Provavelmente, o conselho geral terá de formular nova pergunta que facilite novas eliminações?, diz Hugueney.
Outra aposta do governo brasileiro é a Cúpula de Chefes de Estado América do Sul-Mundo Árabe, nos dias 10 e 11 de maio. Como o encerramento do processo eleitoral na OMC está previsto para o fim do mês que vem, os contatos com os árabes e os sul-americanos indecisos, com a intervenção direta do presidente Lula, podem ser decisivos.
Em termos de coesão regional, quem se beneficia é Lamy, que tem o apoio de toda a UE.
?Os 25 países da UE estão fechados com Lamy?, avisa Jorge Aznar, um dos representantes da UE no Brasil.
Já os EUA só vão revelar o seu candidato na última hora. A decisão estaria vinculada a um processo de barganha. Em troca do apoio a Seixas Corrêa, poderiam obter vantagens na negociação para criar a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Em pauta, investimentos, serviços, propriedade intelectual e compras governamentais.