Lula propõe criação de livre comércio com G-20

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva propôs a criação de uma área de livre comércio entre os países do G-20. A proposta foi feita durante encontro em Brasília com ministros dos países do grupo – 19 países, entre eles, China, Índia e África do Sul.

“Creio que poderemos ser mais ousados e pensar no lançamento de uma área de livre comércio entre os países do G-20, aberta a outros países em desenvolvimento”, afirmou o presidente aos ministros. Não estavam presentes, no momento, o comissário para Comércio da União Européia, Pascal Lamy, nem o diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Supachai Panitchpakdi, que participaram da reunião, mas não do encontro com o presidente.

Os dois souberam da proposta na entrevista coletiva no encerramento da reunião do G-20, no Itamaraty. O diretor-geral da OMC não quis comentar a idéia do presidente, e o comissário da União Européia não escondeu um sorriso antes de responder. “Nós gostamos de livre comércio. Nós fazemos negociações preferencialmente de forma multilateral, mas também negociamos acordos bilaterais”, afirmou Lamy. Segundo fontes do governo brasileiro, a conversa com Pascal Lamy foi proveitosa e houve uma “certa” abertura. “Digamos que houve um aumento da boa vontade”, resumiu o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues.

Lula disse que o assunto poderia voltar a ser discutido na próxima reunião do G-20, marcada para junho, durante a 11.ª Reunião da Unctad (agência das Nações Unidas para comércio e desenvolvimento), em São Paulo. “Peço que reflitam com carinho nessas idéias”, disse Lula. O presidente disse que a área de livre comércio dos países em desenvolvimento não era “para deixarmos de lado os mercados dos países desenvolvidos, que continuarão a ser fundamentais”.

Depois, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, lembrou que o Brasil obviamente não iria deixar de negociar com os países desenvolvidos, porque metade das exportações brasileiras vai para União Européia e Estados Unidos. “É uma idéia ousada, corajosa, para reflexão. Não quer dizer que ela vai acontecer imediatamente. Mas se você não falar elas não acontecem nunca”, afirmou Amorim.

Segundo Amorim, os ministros não discutiram o assunto na reunião, e também souberam da idéia pelo discurso do presidente Lula. Tanto Lula em seu discurso quanto Amorim na entrevista aos jornalistas lembraram que o Mercosul já está em negociação com vários grupos de países que integram o G-20. “O Mercosul já está negociando com a África do Sul e com a Índia. O Egito propôs começar a negociar conosco. Estamos em vias de concluir um acordo com Comunidade Andina. Já existe muita coisa com os países em desenvolvimento”, afirmou. “Mas é claro que isso não dispensa a OMC.”

Protecionismo

Lula voltou a criticar o protecionismo dos países desenvolvidos na área agrícola. “As posições definidas pelo G-20 conduzem ao fim das atuais distorções do comércio agrícola, e trarão melhores condições de vida para bilhões de agricultores em todo o mundo”, afirmou. “Lutamos pela eliminação dos subsídios à exportação e medidas equivalentes, bem como os subsídios internos à produção, e queremos também melhorar as condições de acesso aos mercados dos países desenvolvidos.”

França reconhece importância

Brasília

– O presidente da França, Jacques Chirac, encaminhou mensagem, por intermédio de seu ministro do Comércio, François Loos, aos representantes dos 19 países em desenvolvimento reunidos em Brasília, na qual reconhece a importância do G-20.

Mas questiona o grupo sobre temas considerados emblemáticos, como conciliar, na negociação agrícola, os interesses contraditórios dos países em desenvolvimento, representados, de um lado pelos que querem preservar uma agricultura de subsistência e, por outro, pelos que querem se beneficiar de vantagens comparativas. “Como os países emergentes, dos quais os G-20 é símbolo, podem assumir a sua parte de responsabilidade na negociação em relação aos países mais pobres?”, indaga o presidente francês em sua correspondência aos ministros. “Resta formular soluções que fortaleçam a confiança dos membros no processo de negociação, ponto particularmente importante para a África”, diz a carta.

Destacando que a França sempre foi a favor do multilateralismo e que a União Européia já demonstrou “antes e durante Cancún”, a sua flexibilidade com relação às negociações, Chirac concordou com a necessidade da retomada das negociações na Organização Mundial de Comércio. “O relançamento das negociações supõe sinais positivo por parte de todos os atores principais”, comentou na correspondência.

Presidente aponta cenário positivo

Brasília – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aproveitou ontem a cerimônia de lançamento da conta popular de número um milhão da Caixa Econômica Federal (CEF) para traçar um cenário positivo para 2004, com uma agenda voltada para o crescimento e o desenvolvimento. Lula, que repetiu o discurso do ministro da Fazenda, Antônio Palocci, feito no início da semana, prometeu “juros declinantes e sem retrocesso” e lembrou que o “cenário inovador para 2004” será possível porque neste primeiro ano foram tomadas “medidas necessárias, duras e que exigiram sacrifícios.”

Usando as tradicionais comparações com o futebol, o presidente falou do futuro. “Isso aqui é como um time, que estava com medo de perder o jogo, entrou, marcou um, marcou dois gols, e agora, o técnico pode dizer: vamos pro ataque agora porque dá para a gente fazer mais e, quem sabe até golear os adversários”, declarou, entusiasmado.

Sinalizando ainda que novas mudanças virão depois da popularização do mercado e da massificação do crédito a custos baixos, o presidente acrescentou: “como disse o companheiro Jorge Mattoso (presidente da Caixa Econômica Federal), essa engrenagem poderosa apenas começa a girar.”

Ao lembrar que o seu governo está construindo “uma República de iguais” e que “o crédito para o consumo é uma alavanca indutora do investimento, que multiplica o emprego, expande a renda e gera nova poupança para realimentar a cadeia sustentável da economia”, o presidente Lula falou da importância da inclusão bancária e dos planos para 2004. O Brasil, afirmou, está diante de “uma combinação inédita da história recente do nosso País, de uma política monetária de juros declinantes e sem retrocessos, num ambiente de estabilidade de preços, num avanço sustentável do comércio exterior e uma estratégia vigorosa de massificação e expansão do crédito popular.”

No discurso, parte feito de improviso, parte lido, Lula disse que todos sabem que “não é a ferramenta que faz a política, mas que, sem ela, nenhuma idéia sai da teoria e chega à prática”, ao comentar que “o horizonte internacional também é favorável e que já não se trata apenas de uma convergência fortuita, pois trabalhamos metodicamente para isso”. Em seguida, passou a elogiar o “querido companheiro Palocci”.

Segundo Lula, “se não fosse a paciência de um médico que trata de um paciente enfermo de gravidade, que tem de tratar com carinho, quem sabe a gente não estivesse aqui, agora, festejando, a tranqüilidade que estamos festejando.”

Críticas

Lula salientou que o governo está oferecendo crédito mais barato para quem nunca pôde entrar em um banco e aproveitou o discurso para criticar as financeiras que, na sua opinião, cobram juros abusivos da população mais pobre. “O fosso entre ricos e pobres no Brasil é maior do que revelam as estatísticas e elas não contabilizam a fatia mais importante da renda literalmente sugada pelas prestações escandalosas e crediários abusivos que o povo pobre é submetido”, observou. “O recurso financeiro deve servir à produção e ao consumo de massa” recomendou.

O presidente respondeu também aos críticos da iniciativa de abrir contas populares e desabafou: “Na hora de colocar o guizo no pescoço do gado, tem sempre que haver alguém com mais coragem”. Depois de sugerir uma meta de 13 milhões de contas até o final do governo, o presidente Lula comentou que a “popularização do mercado” é o oposto do que vinha ocorrendo até então, “com clientela elitizada e lucro cativo, gerado pelo endividamento público.”

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