Déficit deixa o Brasil mais vulnerável, dizem analistas

O expressivo crescimento do déficit em conta corrente nos últimos meses já influencia a cotação do dólar e deixa o Brasil mais vulnerável aos humores da economia global. Por enquanto, 10 entre 10 analistas avaliam que o rombo pode ser coberto facilmente, o que afasta o risco de uma crise. Mas muitos já alertam que a continuidade do atual ritmo de alargamento do rombo poderá afetar a expansão do País a partir de 2011.

Em dezembro, o saldo negativo alcançou US$ 5,9 bilhões, um recorde mensal desde que a estatística começou a ser feita, em 1947. No ano passado todo, o buraco chegou a US$ 24,3 bilhões, o equivalente a 1,55% do Produto Interno Bruto (PIB). Para 2010, a expectativa do Banco Central (BC) é de que o déficit seja de US$ 40 bilhões. No mercado, porém, há projeções de até US$ 60 bilhões, mais de 3% do PIB.

A conta corrente sintetiza as relações de uma nação com o exterior. Inclui a balança comercial (exportações menos importações), a balança de serviços (como royalties que multinacionais mandam para suas matrizes) e as transferências unilaterais (dinheiro que estrangeiros que vivem aqui remetem para seus países e brasileiros que moram lá fora mandam para cá). Quando a conta corrente é deficitária, o país precisa financiá-la.

Hoje, não há problemas, pois o Brasil é o queridinho do mercado financeiro global. Só de Investimento Estrangeiro Direto (IED) o BC espera US$ 45 bilhões em 2010, o que não está muito distante da média do mercado. Há, ainda, outras fontes potenciais de atração de dinheiro, como aplicações em títulos públicos e ações brasileiras. A essas atenuantes devem-se acrescentar as reservas do País, de US$ 241 bilhões.

Liquidez

“O que assistimos hoje é uma expansão de liquidez que proporciona uma oportunidade, infelizmente temporária, para que vários países emergentes tenham um crescimento mais acelerado do que o permitido pelos seus próprios meios”, sintetizou o ex-presidente do BC Affonso Celso Pastore.

O raciocínio do economista toma por base a conjuntura global. Com os países desenvolvidos em crise, com perspectivas de baixo crescimento por vários anos, os emergentes se tornaram os consumidores de última instância do mundo. Significa que, ao menos por ora, não terão problemas para financiar rombos na conta corrente.

“Como vejo uma conta financeira forte em 2010, acredito que novamente haverá sobra de dólares, o que implicará num aumento das reservas internacionais em cerca de US$ 20 bilhões”, afirma o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges. “Ninguém está discutindo solvência, mas pode haver volatilidade. Por quê? Com três meses seguidos de enfraquecimento da entrada de capitais, haveria pressão no mercado de câmbio”, diz o economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da MB Associados.

O professor da PUC de São Paulo Antonio Corrêa de Lacerda é outro que não vê grande risco no curto prazo. Mas também faz um alerta. “Deveríamos evitar essa trajetória porque pode não ser problema em 2010, 2011, mas à frente poderá ser.”

O risco é o de que uma mudança nos humores do mercado global reduza o fluxo de capitais. Isso faria o dólar se valorizar, o que provavelmente impactaria a inflação. Para evitar a escalada dos preços, o BC teria de elevar a taxa de juros, o que esfriaria a atividade econômica.