Aumentam os trabalhadores que comandam fábricas

Das mais de 108 mil empresas abertas no Paraná nos últimos três anos, cerca de 32% fecharam as portas, segundo dados da Junta Comercial. Algumas das que continuam funcionando passaram por mudanças significativas no comando, onde os trabalhadores de chão-de-fábrica hoje ocupam o cargo da diretoria. São as chamadas empresas recuperadas, uma modalidade que vem crescendo no Brasil nos últimos vinte anos. Para conseguir se manter, os trabalhadores se alinharam aos movimentos sociais chamados ?Economia Solidária?, que priorizam uma gestão coletiva e envolvimento em questões de natureza social, ambiental e política.

O principal motivo que leva os trabalhadores a assumir uma empresa é enfrentar o desemprego. Quase a totalidade desses empreendimentos está seriamente comprometido com problemas financeiros e legais; e o processo para se chegar essa nova administração não é nada fácil, e pode durar muitos anos. Um dos exemplos bem sucedidos de empresas recuperadas no Brasil é Cipla, de Joinville (SC), no mercado desde 1963, sendo considerada hoje uma das maiores indústrias de plástico da América do Sul. Há quatro anos ela passou a ser administrada pelos trabalhadores, que nesse tempo conseguiram aumentar o faturamento mensal de R$ 900 mil para R$ 3,5 milhões.

Porém, os trabalhadores só não estão tranqüilos porque não conseguiram ainda liquidar toda a dívida de R$ 600 milhões, dos quais, 85% são com impostos e previdência social. O assessor da Cipla, Antonio Hélio Pereira lembra que o processo de ocupação da fábrica se deu após um longo período de atrasos salariais. ?Na década de 90 houve a primeira tentativa de greve, mas que resultou na demissão de 137 trabalhadores. Menos de um ano depois ocorreu outro movimento, e dessa vez os padrões admitiram que não tinham como pagar os atrasados e abriram mão das ações da empresa?, lembra.

Com a fábrica nas mãos, os trabalhadores negociaram com o Ministério do Trabalho os salários atrasados e foram pagando os fornecedores aos poucos. Hoje, os cerca de 800 funcionários são os que decidem os rumos da fábrica, através de assembléia e comissões eleitas por eles. O que vem inviabilizando o projeto, garante Pereira, são as dívidas com o governo. ?Nós já identificamos que a única saída para manter os empregos é a estatização, ou seja, o governo assume a fábrica em troca dos impostos?, falou. No entanto, mesmo com a avaliação de três bancos estatais de que a empresa é viável, o governo não toma uma posição.

A falta de apoio do governo às empresas recuperadas também é uma reclamação dos trabalhadores da Cooperbotões – Cooperativa de Produção Industrial de Trabalhadores da Nova Diamantina Importação e Exportação – de Curitiba. Ocupada desde 2004, a antiga fábrica de botões Diamantina Fossanese, mantém hoje 94 dos 200 funcionários, que conseguiram recuperar a empresa que já teve sua falência decretada pela justiça. O atual presidente – e ex-porteiro -, Carlos Alberto Fontana afirma que eles já conseguiram provar que têm condições de tocar o empreendimento, mas mesmo assim, não conseguem acesso aos incentivos fiscais que o governo oferece para as grandes empresas. ?Os bancos não dão apoio, porque a única coisa que temos como garantia são os trabalhadores?, disse.

Luta x competência

Entre tantas dificuldades enfrentadas por quem decide entrar no processo de recuperação da empresa, é provar e administrar a competência. O coordenador no Paraná da Agência de Desenvolvimento Solidária da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Sérgio Athayde afirma que esse processo é complicado pois ?os assalariados subordinados geralmente são alienados aos demais setores da empresa, e ficam esperando o final do mês para ganhar seu dinheiro. Quando isso muda é dolorido, e se ficar sem a retirada começa a questionar a validade de tudo?.

Segundo Carlos Alberto Fontana, a conquista da credibilidade dos clientes também é algo difícil. Ele afirma que 50% dos clientes antigos voltaram a comprar da Cooperbotões, porém entende que esse ainda é um processo lento. ?O objetivo da cooperativa é crescer, mas acima de tudo dar trabalho e renda?, ponderou. No caso deles, a maior dificuldade tem sido as intermináveis brigas judiciais, que volta e meia deixam a fábrica fechada.

Em um levantamento feito sobre as empresas recuperadas por trabalhadores no regime de autogestão pela economista da área de planejamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Thaís Juvenal apontou que as formas de gestão adotadas dentro desse modelo são modernas, pois buscam maior flexibilidade e maior participação. ?A viabilidade das empresas autogestionárias está primeiramente associada à capacidade de organização dos trabalhadores. A montagem de uma estrutura organizacional que inspire confiança aos clientes, fornecedores, credores e, até mesmo, aos próprios trabalhadores envolvidos é que permite que a empresa supere as dificuldades iniciais?, disse.

O mesmo estudo também apontou que de todas as empresas que receberam apoio do banco, 70% delas conseguiram se manter adimplentes com a instituição. Já a Associação Nacional dos Trabalhadores e Empresas de Autogestão (Anteag) estima que hoje no Brasil existem 450 empresas recuperadas, que juntas faturam US$ 500 milhões por ano. 

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