As sementes da discórdia

Elas não são propriamente uma novidade, já que há 150 anos existem registros dos primeiros estudos sobre o cruzamento de espécies, mas as sementes de organismos geneticamente modificados (OGMs), apelidadas de “sementes da discórdia”, são agora motivo de preocupação para alguns fazendeiros.

O fazendeiro goiano José Alves de Almeida, o Zé Bentinho, 64 anos, é um desses senhores do campo que estão muito desconfiados. Médio produtor de grãos e grande distribuidor de leite, na região de Itaberaí, distante 95 quilômetros de Goiânia, ele mostra com orgulho os 200 hectares de plantações de milho e soja convencional que tem na sua fazenda. Não lê jornais, nem costuma acompanhar o noticiário da TV, e nunca recebeu qualquer informação sobre organismos geneticamente modificados. “A gente não tem muito noção sobre o que é transgênico porque isso aí vem lá dos Estados Unidos e a gente não está muito acostumado. Acho até que pode ser bom, mas primeiro é preciso provar que não prejudica a saúde ou o meio ambiente”, diz Zé Bentinho.

A tese do fazendeiro, que é compartilhada pelos trabalhadores que lidam com as suas terras, é a de que o assunto transgênicos deveria ter sido tratado com mais importância há mais tempo, mas todos “empurraram a discussão com a barriga e agora, é uma realidade que está aí para todos verem”, diz. De acordo com o fazendeiro, os produtores que estão se dedicando ao cultivo de transgênicos devem ser obrigados a informar a população sobre o tipo do produto que estão vendendo.

Zé Bentinho conta que na sua produção de milho, por exemplo, iria economizar pelo menos R$ 10 mil, por mês, em herbicida, se a plantação tivesse sido com sementes transgênicas. Ele está indignado pelo fato de preferir produzir aquilo que considera o mais honesto e observar que muitos estão ganhando dinheiro porque comercializam produtos que tiveram um custo muito mais baixo e podem provocar danos à saúde das pessoas e dos animais.

Para o presidente da Comissão Nacional de Cereais, Fibras e Oleaginosas da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Macel Caixeta, a regulamentação da Lei dos Transgênicos é uma necessidade urgente, porque os agricultores estão perdidos sem saber o que fazer com relação à produção dos transgênicos. “Há necessidade que venha essa lei para que o produtor tenha a livre iniciativa do plantio”, comenta.

Caixeta diz também que é importante demarcar os territórios livres dos transgênicos para não inserir o Brasil num mercado que ainda não é seguro. “O mundo está exigindo produtos rotulados”, lembra.

A saga dos transgênicos

Os primeiros estudos sobre cruzamento de espécies foram registrados há 150 anos, por João Gregório Mendel, quando ele cruzou uma ervilha de flor vermelha e casca lisa com outra de flor branca e casca rugosa. O resultado: ervilhas de flor vermelha e casca lisa e outras de flor branca com casca rugosa. Mendel comprovou, assim, que o DNA pode ser transmitido de uma geração a outra a partir de um segmento, ou seja, um único gene.

Depois, os cientistas tornaram-se capazes de transferir genes de um ser para outro em laboratório. Puderam, então, agregar novas características, como resistência a venenos e antibióticos. Os organismos criados a partir desse processo foram chamados de geneticamente modificados ou transgênicos. A primeira aplicação comercial do processo foi em 1982, na produção de insulina sintética para o tratamento de diabetes.

A indústria diz que uma planta transgênica que resiste a um herbicida, por exemplo, deixa de gastar suas energias para o controle das pragas que a circundam e pode se desenvolver com mais vigor. Por outro lado, os ambientalistas advertem que as experiências podem provocar situações incontroláveis, como o desequilíbrio ambiental devido à possibilidade de uso indiscriminado de venenos na lavoura. (Cláudia Paiva, da Agência Brasil)

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