Catracas livres

Tarifa zero em Curitiba não é utopia: sistema é viável e poderia ser aplicado

Imagem mostra um ônibus de Curitiba com uma estudante esperando para embarcar,
Foto: Arquivo/Tribuna do Paraná.

Pagar R$ 6 na passagem de ônibus de Curitiba pode pesar nas contas mensais de quem utiliza o transporte coletivo diariamente. Para os usuários, a implantação da tarifa zero significaria uma boa economia. O formato já é uma realidade em 84 cidades do Brasil, de acordo com levantamento da Agência Brasil, publicado em outubro de 2023.

Apesar da maioria das cidades que utilizam o modelo estar localizadas em São Paulo, o Paraná tem um representante da tarifa zero. Com 145 mil habitantes, o município de Paranaguá adotou o formato que garante a isenção da tarifa. Mas em Curitiba, será que a gratuidade da passagem de ônibus seria possível?

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Com 145 mil habitantes, o município de Paranaguá adotou o formato que garante a isenção da tarifa. Foto: Reprodução/Prefeitura de Paranaguá.

Em dezembro de 2023, após análise de 214 dias, a Comissão Especial do Transporte da Câmara Municipal de Curitiba (CMC) entregou um parecer final a respeito do tema. De forma geral, a comissão concluiu que sim, é possível aplicar a tarifa zero na capital paranaense. Entretanto, conforme o documento, a alternativa é viável a longo prazo e o município precisaria de auxílio para arcar com todos os custos. 

A comissão analisou dois pareceres. De um lado, o relator Bruno Pessuti (Pode) concluiu que a tarifa zero poderia ser implantada em algum momento, mas a longo prazo. Em contrapartida, o vice-relator Dalton Borba (PDT) afirmou que a gratuidade da passagem é totalmente viável, além de ser um direito da população.

Para entender mais sobre essa questão, a reportagem da Tribuna do Paraná conversou com os dois vereadores que apresentam diferentes pontos de vista.

Como seria possível implantar a tarifa zero em Curitiba?

Para Dalton Borba, algumas políticas públicas poderiam ser colocadas em prática para garantir a gratuidade da passagem. Em primeiro lugar, o vereador acredita que o município deveria promover um estudo interno com o objetivo de apurar o custo real do transporte em Curitiba.

“Porque hoje o custo é elaborado pelas concessionárias do transporte e é simplesmente chancelado pela Urbs (Urbanização de Curitiba). A Urbs não tem um controle real e efetivo. Ela tem uma planilha que a concessionária fornece unilateralmente e ela simplesmente chancela. Então o primeiro passo é esse, para saber qual é o custo real”, diz.

Além disso, o vereador lista algumas adaptações que poderiam auxiliar a colocar o modelo em prática, como vender propagandas para empresas privadas nos ônibus e nos tubos; transformar os terminais em pequenos centros comerciais, nos quais a prefeitura locaria o espaço para o pequeno empreendedor; refazer a engenharia fiscal da cidade para direcionar, mesmo que em pequena quantidade, IPTU, ISS e outros impostos.

Bruno Pessuti pensa que, mesmo a longo prazo, Curitiba seria incapaz de arcar sozinha com os custos do transporte coletivo, caso a tarifa fosse zerada.

“A gente fez um estudo aprofundado, inclusive, com algumas informações passadas pela Urbs. É inviável a tarifa zero no curto prazo no município de Curitiba, de maneira ampla e irrestrita para todo o município, tendo em vista que o próprio sistema hoje, da forma como é utilizado, já seria insuficiente a quantidade de recursos públicos para fazer com que a passagem fosse totalmente quitada pelo setor público. Hoje, o orçamento de Curitiba é de R$ 13 bilhões, já não suportaria o custo aproximado de R$ 1 bilhão, que é a estimativa de 2024 do custo do transporte coletivo”.

“A tarifa zero, gratuita para todos os usuários de Curitiba, dependeria de financiamento muito pesado e a cidade não teria condições de suportar isso sozinha, teria que ter apoio dos governos federal e estadual”, acrescenta Pessuti.

Borba discorda desse ponto, pois ele reflete que o orçamento da cidade poderia ser adequado para atender outras prioridades. “Não posso transformar essa pauta em uma pauta exclusivamente política. Mas, por exemplo, nessa administração, Curitiba gastou nos últimos dois mandatos do prefeito Rafael Greca o orçamento de transporte público de um ano inteiro em asfalto. E não foi asfalto novo, foi recapagem de vias públicas que estavam em boas condições”, afirma.

Um ponto que os dois vereadores citam como positivo e que pode alavancar a tarifa zero em Curitiba é o Sistema Único de Mobilidade (SUM), um projeto elaborado pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) que tem o objetivo de aumentar o orçamento da mobilidade urbana para que as cidades possam desenvolver o transporte de forma ampla para toda a população e sem depender totalmente da tarifa paga pelo usuário. A iniciativa segue em discussão no governo federal.

“Também é preciso considerar que o governo federal está atuando nessa perspectiva, na medida em que está criando, através de emenda constitucional, o SUM, o que implica no repasse de verba federal para os municípios”, detalha Borba. “Se houvesse o financiamento federal similar ao que existe na educação, por exemplo, poderia fazer com que a tarifa fosse reduzida”, completa Pessuti.

Foto: Ricardo Marajó / SMCS

Quais são as vantagens da tarifa zero

Todos os cidadãos terão acesso à cidade. Essa é o principal benefício da tarifa zero para Borba. “Principalmente daqueles que estão em situação de mais vulnerabilidade, você permite que esse público possa ter acesso a mais oportunidades de emprego, de empreendedorismo”.

O parlamentar explica que durante as pesquisas a respeito do tema, ele identificou um relatório do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 2023, que aponta que uma das causas para evasão escolar no Brasil é devido aos custos do transporte público. Portanto, ele também supõe que a gratuidade da passagem beneficiaria a educação.

“A gente vai permitir que a criança ou adolescente deixe a escola porque não tem condições de pagar o transporte? Isso é um obstáculo direto ao desenvolvimento econômico, social e humano do município”.

Além da educação, o pedetista também destaca vantagens em outros pontos, como: alívio do trânsito, melhora da mobilidade, menos emissão de poluentes no meio ambiente e direcionamento do dinheiro da passagem para outros setores da cidade, como o comércio.

Pessuti também considera que a grande vantagem do formato é a facilidade de deslocamento das pessoas pela cidade. “Muitas vezes, uma família de baixa renda não tem condições de se deslocar porque o preço de uma passagem de ida e volta é equivalente a alimentos, dependendo do lugar onde a pessoa compra. Isso faz com que alguns grupos deixem de ter acesso à cidade”.

A tarifa zero tem desvantagens?

Pessuti não vê problemas no sistema da gratuidade da passagem em si. Caso o modelo fosse implantado, o que ele teme é a possibilidade de retirar recursos de alguns setores para aplicar no formato. “A desvantagem é justamente o fato de ter que tirar recursos que estão alocados em saúde, segurança, pavimentação, educação e colocar em um sistema de transporte coletivo. Claro, ajuda toda a população, não torna tão eficiente outros serviços, isso é o que poderia acontecer em curto prazo”, comenta.

“Temos que buscar financiamentos, programas sociais para que as pessoas que não tenham condições de pagar passagem sejam incluídas em programas sociais. Mas precarizar a execução de serviços como saúde, educação e segurança pública, talvez não seja o momento de priorizar a tarifa zero no município”, acrescenta.

Já Borba não enxerga nenhum problema no modelo. “Não vejo desvantagens porque a tarifa zero é uma prerrogativa que a gente deve encarar da mesma forma que a gente vê os serviços de saúde e ensino público. Esse é um serviço que cabe ao estado prestar, mas é claro que o cidadão escolhe se ele quer ou não. O transporte público é um mecanismo que dá acesso ao cidadão à cidade, isso é uma garantia de cidadania. As pessoas participam mais, conhecem o município, interagem mais”, conclui.

Mudanças possíveis na passagem de ônibus de Curitiba

Se ainda não é possível estabelecer a tarifa zero em Curitiba, o que dá para fazer em curto prazo?

Pessuti cita alguns programas que poderiam ser implantados em pouco tempo e que trariam economia para o bolso dos curitibanos, como o uso do cartão Curitiba + em todos os momentos, incluindo os horários de pico e a tarifa domingueira gratuita. “Também que algumas linhas, principalmente as que ficam em bairros periféricos da cidade, possam ser gratuitas em algumas situações, seja integralmente ou em alguns horários. Essas sugestões seriam possíveis de serem aplicadas em curto prazo”.

O vereador ressalta ainda a importância do bilhete único, modalidade que disponibiliza isenções ou tarifas mais baixas para quem precisa fazer mais de uma viagem, como uma das alternativas mais promissoras do sistema do transporte coletivo.

Borba relata que, no parecer final, a comissão entendeu que o transporte tarifa zero é possível em parceria entre município, estado e União e com o acréscimo e políticas públicas paralelas, como vendas de espaços comerciais em terminais de ônibus e propaganda em linhas.

Entretanto, ele reforça a viabilidade da gratuidade da passagem. “O tarifa zero é um caminho sem volta. O que falta e esse é meu ponto de vista que deixei muito claro no meu relatório, falta vontade política.Se temos alguns obstáculos hoje, eu os considero muito mais políticos do que obstáculos técnicos”, conclui.

Passagem de ônibus em Curitiba atualmente custa R$ 6. Foto: Arquivo

Futuro do transporte coletivo de Curitiba: nova concessão em 2025

No modelo de contrato atual, as concessionárias que prestam o serviço de transporte coletivo para Curitiba recebem de acordo com cálculos da tarifa técnica, que leva em consideração o número de passageiros pagantes e a quilometragem média mensal do transporte.

Em 2025, uma nova concessão do transporte coletivo será realizada em Curitiba. Por isso, os parlamentares também deram sugestões para os novos contratos que serão formalizados daqui um ano.  

“Hoje o que nós temos é um modelo que a concessionária executa uma atividade que só ganha. Ela não perde nunca. Se tiver um milhão de passageiros por dia ou um único passageiro por dia, ela ganha e é remunerada para isso. Então é um contrato extremamente oneroso”, afirma Borba.

“Essa nova concessão poderá separar custos que hoje compõe toda a tarifa, fazendo com que ela fique mais barata. O modelo que está sendo adotado em São José dos Campos pode ser um dos modelos adotados em Curitiba”, sugere Pessuti. Nesse formato, são separadas da tarifa cobrada do usuário itens, como aquisição, gestão da frota e abastecimento, cabendo a tarifa apenas operação técnica.

“Se essas medidas fossem adotadas, a cidade poderia reduzir a tarifa em até 50%, o que já seria uma boa solução para a maior parte da população”, acrescenta o relator.

E aí, URBS?

Por meio de nota, a Urbanização de Curitiba (Urbs) destacou que Curitiba é referência nacional e internacional em transporte público e oferece para os moradores da capital e Região Metropolitana o serviço mais integrado do Brasil.

“O modelo do transporte coletivo da capital está presente em mais de 200 países pelo mundo, graças a inovações como corredores exclusivos (canaletas), ônibus biarticulados, terminais e estações-tubo”, acrescenta comunicado.

Apesar de diversas ideias apontadas pela comissão, nenhuma mudança ou readequação do sistema atual ainda foi oficializada.

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