Cada um na sua

Historiador diz que Curitiba ainda é uma cidade polarizada

Curitiba completa hoje (29) 320 anos de fundação. Nesses mais de três séculos de história a capital paranaense passou pelo cotidiano rural, a chegada de imigrantes europeus e viveu a migração de brasileiros de diversas partes do país, como paulistas, mineiros, baianos, gaúchos, catarinenses e próprios paranaenses vindos do interior do estado. Diante dessa estrutura de formação da cidade, na opinião do antropólogo Carlos Balhana, Curitiba ainda é uma cidade polarizada em seu cotidiano.

Professor aposentado da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Balhana explica essa polarização da capital paranaense. “Curitiba passou por diversas mudanças de comportamento, desde a vida rural nas primeiras décadas da cidade, até a criação da capital do estado, quando recebemos a estrutura do governo e com ela a cultura, como teatro e literatura. Depois tivemos a imigração europeia, com a chegada dos poloneses, alemães, ucranianos, árabes, entre outros. E cada colônia vivia sua realidade e cotidianos, e assim Curitiba se polarizou de certa forma”, afirma.

Ainda de acordo com o professor, os bairros como Santa Felicidade, Abranches, Bacacheri, Hauer e o Centro, que receberam as colônias europeias, tinham em suas estruturas seus próprios polos rurais, comerciais e de lazer. “Assim como as coisas aconteciam na Rua XV de Novembro, também ocorriam nos bairros, onde as pessoas não precisavam vir ao centro para fazer suas coisas”, afirma Balhana.

Aliocha Maurício
Cena exuberante do Barigui: cidade tem outras belezas ocultas.

A religião, segundo o professor, também teve um papel fundamental para a polarização dos bairros e suas respectivas populações, já que com cada colônia vieram seus padrões e culturas relacionadas à Igreja. “Em Santa Felicidade o padre rezava a missa em italiano. Na região central era em alemão e assim com cada colônia. E como a Igreja à época era um entidade importante no que diz respeito à questões de comportamento e definições de estruturas sociais, esses aspectos influenciaram para que a cidade seguisse seu rumo de maneira dividida”, conta.   

Marco na mudança cultural

Para Balhana a cidade continuou crescendo de forma polarizada mesmo após a migração de pessoas de outros estados brasileiros e do interior do Paraná. Segundo ele, na virada da década de 60 para 70, Curitiba teve mudança brusca no que diz respeito aos aspectos sociais e comportamentais.

“Com vinda de famílias de outros lugares do Brasil, a nossa capital começou a crescer em direção a outras regiões da cidade. Principalmente na região sul com a implementação do plano diretor, que deu acesso direto aos polos norte, sul, leste e oeste de Curitiba. É aí que o curitibano tradicional, descendentes de europeus e acostumados às suas colônias teve que saber a lidar e a conviver com essas pessoas que têm outras referências culturais”, explica o antropólogo.

Aliocha Maurício
Marco zero, onde tudo começou.

“Hoje temos a Curitiba do centro, que é diferente da Curitiba dos bairros, que vivem suas vidas de maneira independente em todos os sentidos. No que diz respeito à cultu,ra até na questão comercial e econômica”, completa Balhana. Ainda segundo o antropólogo, o curitibano que vive na região central demora muito para ter contato com a vida dos bairros. “Mesmo com essa demora, vai chegar uma hora que, através do emprego ou outra circunstância, vai acabar interagindo com a Curitiba com a qual esse curitibano não está acostumado”, afirma.

Curitibano precisa conhecer mais sua cidade

Para o professor Carlos Balhana, os curitibanos precisam conhecer melhor sua cidade do ponto de vista histórico e territorial. “Eu ainda tenho costume de pegas as linhas do expresso e cruzar a cidade para observar melhor como e para onde a cidade está indo”, conta. “As pessoas precisam ir mais aos bairros para entender melhor a cidade e se comunicar e interagir com as pessoas. Chegou o momento de Curitiba criar uma unidade como uma metrópole, sem perder suas características e tradições, mas se conhecer melhor”, alerta.

Segundo o antropólogo, Curitiba e seus cidadãos estão passando por uma fase de transição, na qual a tecnologia realiza de certa forma a integração entre as diferentes regiões de Curitiba. “Acredito que a internet cumpre um papel fundamental para incentivar e ser o canal de conhecimento em relação à nossa cidade. Daqui a 30 anos, vejo um curitibano mais próximo da Curitiba como unidade e mais conhecedor da nossa história. Cabe ao governo e até a própria imprensa criar condições e meios para que o nosso passado e o contexto histórico em que vivemos mais próximos dos cidadãos”, conclui Balhana.

Aliocha Maurício
Carlos Balhana: em Santa Felicidade tinha reza em italiano e no centro em alemão.
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