Construir a dignidade

Uma semana depois da eleição que obrigou Lula e Alckmin a se postarem no partidor para nova e, desta vez, curtíssima carreira em busca dos votos de 126 milhões de brasileiros, ainda não foi possível ouvir um pálido rumor do que pretendem os dois candidatos em termos de efetivo crescimento econômico do país.

O dossiê Vedoin, supostamente recheado de graves acusações a José Serra, candidato tucano eleito para o governo de São Paulo, ainda enche as páginas dos jornais e estimula a troca de estilhaços entre os postulantes ao cargo máximo da República, como se não houvesse temas de interesse da nação. O tal dossiê visava, na versão que o governo e seu desastrado partido não puderam desmentir, dar fôlego a Aloizio Mercadante, mas não apenas foi um tiro na água, como se revelou letal para a humilhação do senador até então campeão de votos. E, numa conseqüência ainda mais ruinosa, levou a escolha do presidente para o segundo turno.

No esforço desabrido por apoios de última hora, tanto Lula quanto Alckmin mergulham sem pudor num exercício próximo do paroxismo. Lula conquistou o apoio do candidato do PMDB ao governo do Rio, Sérgio Cabral Filho, acenando com a extensão do Bolsa Família para até um milhão de pessoas no estado, ao passo que o tucano procura tirar vantagens da adesão do casal Garotinho e Rosinha Matheus, ela governadora a ser substituída em janeiro.

Quando Garotinho e sua mulher anunciaram o apoio a Alckmin, a candidata do PPS, deputada federal Denise Frossard, que disputará o segundo turno com Cabral, queimou-se na parada e declarou preferir anular o voto a dá-lo ao tucano que permitira em seu ninho o pouso da citada parelha. Logo se arrependeu e voltou atrás.

Durante o primeiro turno, pouco ou nada foi dito, especialmente pelo candidato à reeleição, sobre o projeto para o crescimento sustentado, hoje uma abstração à beira da irresponsabilidade. O crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) foi tão inexpressivo que nesse ponto a gestão Lula não conseguiu se diferenciar – como ele adora afirmar – dos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso. Na ocasião, o PIB cresceu em média 2,3% e sob o ex-metalúrgico o índice não será maior que 2,8%. Uma tragédia para os milhões de desempregados, sem moradia decente, sem escola ou acesso aos bens elementares da vida, como alimento, saúde e saneamento, para arranhar a superfície da problemática perene.

O drama do governo Lula só não foi maior porque o país não foi tão vulnerável ao ambiente econômico global, com o controle da dívida externa. A inflação, que chegou a 12,53% no último ano de FHC, hoje está em torno de 3% e as exportações evoluíram de US$ 60 bilhões em 2002 para US$ 130 bilhões este ano. Mas ainda temos 40 milhões de pessoas cuja fonte de renda é o assistencialismo, a única bandeira visível do presidente. O governo gasta com elas cerca de R$ 8 bilhões por ano, mas não lhes acena, pelo menos no curto prazo, com trabalho, emprego e renda, condições mínimas para a fruição de padrões civilizados, capazes de torná-los homens e mulheres dignos.

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