Conservadorismo exagerado

Sempre se imaginou que se o Brasil tivesse um governo do PT aconteceria uma revolução pelo voto. Ou uma revolução de verdade, uma vez abertas as portas do poder, nem que fosse por um golpe. E pensou-se em um governo com Lula, líder inconteste do Partido dos Trabalhadores e candidato à presidência até por usucapião, tantas vezes disputou a chefia da nação.

Hoje, Lula é presidente, mas depois da reforma do ministério que empreendeu, abrigando o PMDB e descartando muitos ministros petistas, além das estranhas alianças que fez quando candidato, para eleger-se, a tal da revolução pelo voto, pelo golpe ou como quer que se a imaginasse, não aconteceu. E parece que não acontecerá mesmo. O governo Lula é tudo, menos petista, considerado o ideário do partido, montado ao longo de mais de duas décadas e desmontado em poucos meses de poder. A atual administração federal é conservadora. Ultraconservadora, melhor dizendo.

Até o megainvestidor internacional George Soros, que já foi patrão de Armínio Fraga, o ex-presidente do Banco Central do Brasil tão combatido pelos petistas e demais opositores do governo Fernando Henrique Cardoso, identifica esse ultraconservadorismo. Soros, que era apontado como um abjeto especulador sem escrúpulos, embora na realidade seja um esperto, inteligente e eficiente administrador de fundos, respeitado em todo o mundo, acaba de dizer que o governo Lula está demasiadamente associado à entidade sem rosto chamada mercado. “A equipe de Lula tem excessivo desejo de ganhar a respeitabilidade do mercado financeiro” e, por isso, “segue uma política ortodoxa demais”, diz o megainvestidor.

Ele critica a atual política econômica. Para ele, tanto a política fiscal como a monetária são restritivas. Alude aos elevados juros de 16,5% e ao superávit fiscal de 4,25%, que agrada e até bajula o Fundo Monetário Internacional. Soros acha que o governo Lula deveria ser “um pouco mais agressivo no estímulo ao crescimento, aproveitando a disponibilidade de liquidez internacional”. Para ele, como não há “inflação de custos de produção”, acaba havendo “uma inflação em ativos financeiros”.

Há capital sobrando no mundo, em busca de onde investir e o Brasil deveria aproveitar essa folga que lhe permite ser menos conservador em sua política de juros e fiscal.

Sendo menos conservador, o que na prática significa praticar juros mais baixos e superávits menores, o governo Lula ensejaria o crescimento econômico de que tanto necessitamos, em especial para reduzir o seu efeito maior: o desemprego e a queda do poder aquisitivo dos trabalhadores.

O diretor do Departamento de Estudos e Pesquisas Econômicas da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Cláudio Vaz, parece matar a charada ao analisar a manutenção da Selic em 16,5%, quando o mercado esperava queda dos juros. Disse ele que o governo duvida da solidez da economia brasileira. E que isso leva a indústria a ficar com um pé atrás. “Não vamos elevar a produção apostando na retomada da atividade, como fizemos em 2002. Se nem o governo parece acreditar na economia, por que a indústria acreditaria?” – pergunta o economista da Fiesp.

Ele acha que o Brasil deveria estar discutindo como consolidar o crescimento econômico para 2005 e 2006, pois este primeiro trimestre de 2004 será marcado por um atraso no processo de recuperação do nível de atividade econômica.

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