Reforma tem vida útil de 11 anos, aponta estudo

Brasília

– A próxima reforma da Previdência tem data marcada: 2015. Apresentada na quinta-feira passada, a proposta de reforma em tramitação no Congresso detém a explosão, mas deixa ativada a bomba do déficit da Previdência Social.

Como obriga o funcionário público a trabalhar por mais tempo em troca da aposentadoria integral, o novo texto é mais vantajoso para os cofres públicos nos 11 próximos anos se comparado à proposta originalmente enviada pelo governo. Mas os gastos voltam a explodir quando as aposentadorias já estarão concedidas. A nova reforma tem vida útil de 11 anos. E essa é a conclusão expressa em gráficos e estudos feitos pelo próprio Ministério da Previdência Social.

Na discussão da reforma, o governo fez simulações em que descreve três diferentes cenários para sete estados: Bahia, Ceará, Sergipe, Amazonas, Goiás, Tocantins e Maranhão. Neles, é medido o impacto da proposta original (cenário 2) e da recém-desenhada (cenário 3) em comparação ao regime atual (o cenário1). Em todas as análises, a primeira versão da reforma -sem o direito à aposentadoria integral – seria mais eficiente a longo prazo. Já o novo texto representa, em média, uma queda de cinco pontos percentuais nessa expectativa de economia. Somando-se as perdas, os Estados estão deixando de economizar R$ 3.630.641.180,00.

Segundo os estudos do Ministério, a Bahia economizaria R$ 4,6 bilhões – 21% do déficit -com a proposta original. Esse valor cai para R$ 3,4 bilhões, 15,49% de economia, com a nova reforma. “Se deixarmos como é hoje, é muito pior. Mas a nova proposta não é tão eficiente quanto a primeira”, resume o secretário de Administração da Bahia, Marcelo Barros.

Economia

Em Tocantins, a redução de economia supera dez pontos percentuais. Em Sergipe, é de R$ 292,4 milhões. No Amazonas, R$ 290,8 milhões. “Não gostaria de ser responsabilizado pela explosão de um déficit no futuro”, alega o governador Eduardo Braga (PPS-AM). O Estado de Goiás deixaria de “ganhar” R$ 495,3 milhões, com a perda concentrada entre 2020 e 2025. “Preferia uma reforma de maior fôlego”, diz Marconi Perillo (PSDB).

Pelos gráficos, esse crescimento de despesas será significativo por volta de 2023, o que exigiria outra reforma. O ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, já teria admitido, em reuniões da base, a hipótese de nova reforma caso o Brasil não tenha expressivo crescimento econômico. “Também se o Brasil não tiver crescido até 2023, acabou”, disse o vice-líder Vicente Cascione (PTB-SP), na saída de um café da manhã. Pelas mesmas contas, a nova proposta representa menos R$ 1,7 bilhão nas projeções de economia da União. O vice-líder do governo, Professor Luizinho (PT-SP), encara a idéia de nova reforma com naturalidade. “É da natureza da Previdência”, justifica.

Os números do governo são projetados até 2032, levando-se em conta a paridade, integralidade e redução de 50% da pensão só acima de R$ 2.400,00 (antes da nova proposta, com redução de 30% sobre o que exceder R$ 1.058,00). Alguns estados já calculam suas perdas. No Distrito Federal, ela será de R$ 800 milhões. No Rio Grande do Sul, de R$ 1,4 bilhão. “Não resolveremos o problema num passe de mágica”, defende o presidente do Instituto de Previdência do Estado, Otomar Vivian.

Em Minas, a situação é igualmente delicada. Sem qualquer mudança, o déficit em 20 anos chegará a R$ 21 bilhões. Pela primeira proposta enviada ao Congresso, cairia para R$17 bilhões, ou 23%, em 20 anos. Pela nova, será de R$19 bilhões. “Se não fizermos nada, daqui a cinco anos Minas Gerais pára de pagar aos aposentados, que terão seus direitos, mas não terão os recursos para receber”, pondera o governador Aécio Neves (PSDB).

Mercado de trabalho explica medida

Rio  – Fabio Bertranou acredita que a contribuição dos inativos tem base em mudanças demográficas e no mercado de trabalho, mudanças estas que vêm transformando a base de financiamento de sistemas previdenciários mundo afora. Em países como o Brasil, somam-se às mudanças programas que competem pelas receitas tributárias.

“Assim é razoável que a sociedade brasileira coletivamente decida recolher novos impostos em rendas domésticas. Idealmente, o imposto sobre a renda deve ter uma estrutura progressiva, de modo a não ferir aposentados de baixas rendas”, comenta. Uma tendência mundial, segundo Bertranou, é a unificação de elegibilidade para aposentadoria e pensão. “Alguns país ainda mantêm idades distintas de aposentadoria para mulheres e homens. Mas têm havido numerosas iniciativas para unificá-las, como na Argentina, por exemplo. Outros têm a mesma idade para aposentadoria de homens e mulheres, como o Uruguai.”

Este, prossegue o economista, é um argumento forte em países que têm introduzido esquemas de capitalização individuais, nos quais a aposentadoria mais cedo é penalizada no modo de acumulação da poupança: trabalhadores que acumulam menos têm benefícios reduzidos. Mas ele acredita que deveria prevalecer algum tipo de ação afirmativa (termo que designa programas de proteção a minorias nos Estados Unidos, em termos de competição no mercado de trabalho) no que diz respeito às mulheres, para compensá-las por seu trabalho não-pago e/ou pela discriminação sofrida em seu ciclo de vida produtiva.

Debate

Sobre a ausência de debate a respeito da inclusão da massa trabalhadora que está fora da Previdência no Brasil, isto é, cerca de metade da população ativa, Bertranou acha que qualquer reforma deveria levar em conta a extensão da proteção social aos trabalhadores e famílias tradicionalmente excluídos. “A previdência é um instrumento de inclusão social poderoso. O Brasil tem muitas experiências interessantes de extensão de proteção social, como, por exemplo, o programa de pensões para os trabalhadores rurais”, avalia.

Outros países têm tentado enfrentar este objetivo estendendo tanto os programas de previdência social com contribuição quanto esquemas de assistência social sem contribuição.

Alencar volta a contrariar deputados

Brasília

  – Além de voltar a criticar os juros altos, o vice-presidente José Alencar contrariou ontem os líderes do governo ao afirmar que o relatório da reforma da Previdência ainda poderá ser mudado no Congresso. Alencar disse que o governo gostaria de fazer as mudanças ideais no regime de Previdência mas que nem sempre é possível agradar a todos. “Reforma é assim mesmo, agrada a uns e desagrada a outros. O importante é que o texto está no Congresso, que é soberano. Graças a Deus, nosso regime é democrático. Esse mesmo Congresso pode e vai discutir o projeto, apresentar emendas que possam aperfeiçoá-lo e depois votar, decidir”, comentou.

“Inativos devem contribuir”

Rio

– A contribuição dos servidores inativos é necessária, e a distinção de classes no funcionalismo, para a aposentadoria, não é uma idéia estranha aos países latino-americanos, segundo disse o economista argentino Fabio Bertranou, especialista em previdência social do Escritório Sub-Regional para o Cone Sul da América Latina da Organização Internacional do Trabalho (OIT), com sede no Chile.

Sobre um dos pontos polêmicos da proposta de reforma da Previdência no Brasil, os privilégios dos magistrados, Bertranou menciona o caso da própria Argentina, onde juízes não pagam Imposto de Renda: “Muitos países latino-americanos têm regimes especiais e privilégios para alguns servidores. Na Argentina, os magistrados não são obrigados a pagar imposto de renda, algo que pode ser visto como bastante injustificável e questionável sob uma perspectiva de igualdade”, comenta.

Mas o economista frisa que tal distinção, isto é, o que ele chama de regime especial, poderia ser complementar de um regime geral unificado, baseado em princípios de solidariedade e regras padronizadas para benefícios e condições de elegibilidade. A adoção de regras flexíveis é uma tendência mundial, segundo o economista, para a definição de aposentadoria e benefícios.

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