PF abre inquérito para apurar culpa de pilotos

Cuiabá (AE) – A Polícia Federal (PF) informou na tarde de ontem que, por determinação do Ministério Público, foi aberto um inquérito para apurar eventual prática de homicídio culposo e atentado contra segurança de transporte aéreo sobre o acidente envolvendo um jato Legacy com o Boeing da Gol, vôo 1907, no qual morreram 155 pessoas. Segundo a PF, a investigação vai apurar a suspeita de que os americanos Joseph Lepore e Jan Paul Paladino, piloto e co-piloto do Legacy, possam ter adotado uma conduta arriscada na condução da aeronave.

Em cooperação com a Polícia Civil do estado de Mato Grosso, que também abriu inquérito para apurar o caso, a Polícia Federal já recebeu a cópia de todos os procedimentos de investigação local. O delegado responsável pelo caso, Renato Sayão Dias, e mais dois auxiliares, deverão ir a Brasília amanhã para reunir mais informações junto a outros órgãos, como a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a Aeronáutica.

O inquérito vai apurar a eventual ocorrência de dois crimes: um previsto no artigo 121 do código penal (homícidio culposo ou dolo eventual) e outro previsto no artigo 261 do mesmo código (atentado contra segurança de transporte aéreo). Por enquanto os inquéritos local e federal correm em paralelo, mas é esperada uma discussão na Justiça de Mato Grosso sobre qual esfera terá competência para apurar o caso até o fim.

Legacy enganou controle

Os peritos da Aeronáutica não têm dúvidas de que o jato Legacy enganou os controladores de vôo do Cindacta 1, em Brasília, e provocou a maior tragédia da aviação civil do país: a queda do Boeing da Gol, na sexta-feira passada. Todas as informações da Aeronáutica mostram que os pilotos americanos do Legacy voaram com o transponder desligado – aparelho que identifica o avião no radar e integra o sistema de alerta anticolisão, impedindo que os controladores de vôo vissem os dois aviões na mesma rota e evitassem a colisão.

Mais grave e misterioso: a Aeronáutica quer saber por que o piloto do jato não atendeu aos inúmeros chamados que a torre do Cindacta 1 fez até o momento do choque. Quer saber também como, após a colisão, não só o transponder voltou a funcionar como o piloto passou a chamar a torre, narrando o choque com um objeto não identificado pelo mesmo rádio que não havia atendido até então. ?Muito provavelmente, ele havia diminuído o volume do rádio. Ele (o avião) começou a ser chamado pela torre de Brasília e não respondia. A resposta veio, como por milagre, após o impacto?, disse um oficial.

Outro fator que pode ter contribuído para o acidente é uma improvável falha de comunicação. A regra é cumprir o plano de vôo. Para alterá-lo, é preciso pedir autorização. Assim, a torre entendia que o Legacy não ia descumpri-lo. Ele estaria em sua aerovia e não havia por que avisar ao Boeing sobre a existência de alguém em sua rota.

FAB procura não apontar responsáveis

Brasília (AE) – Em um comunicado divulgado ontem, a Força Aérea Brasileira (FAB) reitera que não existe confirmação em relação a possíveis responsáveis pelo acidente com o Boeing da Gol que matou 155 pessoas. ?Seria prematuro atribuir possíveis responsabilidades ou estabelecer qualquer juízo de valor e tecer comentários neste momento, uma vez que as investigações estão em andamento?, informa a nota.

De acordo com o comunicado, cerca de 90 militares trabalham na área da Fazenda Jarinã para prosseguir nos trabalhos para localização e remoção das vítimas. Outros 100 militares estão no Campo de Provas Brigadeiro Velloso, na Serra do Cachimbo.

Ontem, uma aeronave VU-9 Xingu foi engajada na operação para prestar apoio logístico. No total, oito aeronaves, das quais cinco helicópteros, estão sendo empregadas.

Parentes pedem comissão independente

Brasília (AE) – A comissão de familiares dos passageiros que estavam a bordo do Boeing 737-800 da Gol que caiu sexta-feira passada na Serra do Cachimbo, matando 155 pessoas, deve se encontrar hoje com representantes da Associação de Vítimas de Acidentes Aéreos. O encontro, marcado para 18h, deverá ocorrer no hotel onde parte dos familiares das vítimas do avião da Gol está hospedada.

O empresário Mauro Calais Siqueira, um dos integrantes da comissão, afirmou que o encontro foi marcado a pedido dos próprios familiares. ?Nossa intenção é trocar experiências, saber quais foram os erros, os acertos de pessoas que já passaram por uma situação como a nossa?, disse.

A principal questão que será abordada, afirmou Siqueira, é a possibilidade de se exigir que uma comissão independente internacional acompanhe as investigações do acidente. Este pedido já havia sido feito para o ministro da Defesa, Waldir Pires. ?Queremos saber se isso já foi feito antes, quais os passos que devem ser seguidos?, afirmou Siqueira.

O empresário, irmão do passageiro Plínio Siqueira, disse não estar convicto de que a investigação comandada por brasileiros é isenta. ?Há sempre um filtro político na divulgação das informações. Isso nos deixa preocupados?, afirmou. Um dos fatos que mais incomodou a comissão foi a forma como os dados são divulgados. ?Soube que a caixa-preta havia sido encontrada. Mas havia recomendação que somente um militar de alta patente deveria fazer o comunicado oficial?, disse.

De acordo com a comissão, ontem 34 corpos encontrados deveriam estar na base instalada na Serra do Cachimbo para serem transferidos para o IML de Brasília.

Jornalista faz críticas às investigações

São Paulo (AE) – Durante entrevista para um programa matinal da rede de televisão NBC, o jornalista americano Joe Sharkey, que trabalha no jornal The New York Times, pôs sob suspeita as investigações brasileiras sobre a colisão entre o Legacy, em que ele estava, e o Boeing da Gol, que acabou caindo após o choque em Mato Grosso. ?Nós precisamos ter cuidado com as evidências coletadas pelas autoridades brasileiras sobre o acidente.?

Ele disse ainda acreditar que os pilotos do jato, que ficaram com os passaportes retidos no Brasil, correm ?algum tipo de perigo?. Mas não fez nenhum comentário adicional sobre a questão. Joe Sharkey era um dos cinco passageiros do Legacy, que nada sofreram. Sharkey veio ao Brasil para fazer uma reportagem sobre o mercado de aviação no país a convite da empresa norte-americana que adquiriu a aeronave de pequeno porte.

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