Favela da Varginha

Papa Francisco critica estratégia de pacificação e fala das manifestações

Nesta quinta-feira (25), em plena Favela da Varginha, na zona norte do Rio de Janeiro, o papa Francisco fez um dos discursos de cunho social mais importantes de seu pontificado e convocou os jovens a continuar pressionando por melhorias, em um sinal de seu apoio aos manifestantes que tomaram as ruas do Brasil desde junho. Ele atacou a estratégia de “pacificação” das favelas no Rio de Janeiro, alertando que, enquanto a desigualdade social não for resolvida, “não há paz duradoura”.

O papa ainda completou: a grandeza de uma nação só pode ser medida a partir de como ela trata seus pobres, numa referência indireta à insistência do governo de vender o Brasil como uma das maiores economias do mundo e, ao mesmo tempo, não dar uma solução às suas favelas.

Francisco chegou a reconhecer os avanços sociais promovidos pelo governo. Mas alertou que isso ainda não é suficiente e que a pacificação de favelas, como a que ele visita, não pode ser feita com armas. “Quero encorajar os esforços que a sociedade brasileira tem feito para integrar todas as partes do seu corpo, incluindo as mais sofridas e necessitadas, através do combate à fome e à miséria”, disse.

Pacificação

“Nenhum esforço de pacificação será duradouro, não haverá harmonia e felicidade para uma sociedade que ignora, que deixa à margem, que abandona na periferia parte de si mesma”, declarou ainda o papa durante o discurso. E alertou: “Uma sociedade assim simplesmente empobrece a si mesma, perde algo de essencial para si mesma.”

O papa disse ainda que “somente quando se é capaz de compartilhar é que se enriquece de verdade”. “Tudo aquilo que se compartilha se multiplica. A medida da grandeza de uma sociedade é dada pelo modo como esta trata os mais necessitados, que não tem outra coisa senão a sua pobreza.”

Manifestações

Ele ainda manifestou seu apoio a todos aqueles no Brasil que lutam por mudanças sociais, em uma referência aos protestos que ganharam as ruas do País desde junho.

Atacando a corrupção e o fato de a periferia ser abandonada por políticos, o papa deixou claro que a Igreja vai apoiar o movimento mais amplo de exigências por melhorias. Fontes no Vaticano confirmaram que essa foi a forma pela qual o papa optou por lançar seu recado aos manifestantes. A opção foi a de evitar a palavra “protestos”, mas ainda assim fazer um apelo para que a pressão contra a classe dirigente continue.

“Aqui, como em todo o Brasil, há muitos jovens”, disse. “Vocês possuem uma sensibilidade especial frente às injustiças, mas muitas vezes se desiludem com notícias que falam de corrupção, com pessoas que, em vez de buscar o bem comum, procuram o seu próprio beneficio”, declarou.

“Também para vocês e para todas as pessoas eu repito: nunca desanimem, não percam a confiança”, insistiu.

Francisco ainda apelou à população que não se deixa “acostumar ao mal, mas a vencê-lo”. O papa ainda garantiu: “Vocês não estão sozinhos, a Igreja está com vocês, o papa está com vocês”.

Educação

O papa também aproveitou seu discurso na favela para voltar a defender alguns dos pilares do dogma da Igreja: a família e a vida, “que deve ser sempre tutelado e promovido”.

O papa pediu uma educação de qualidade e com valores, e não apenas um sistema que tem como metas “uma simples transmissão de informações com o fim de gerar lucros”.

Improvisos

O papa Francisco também fez improvisos pela primeira vez. Pelo menos seis vezes ele acrescentou trechos que não estavam na versão oficial. O primeiro improviso foi uma brincadeira com o público. Ele dizia que gostaria de bater em cada porta para tomar um “cafezinho”. “Não um copo de cacha&c,cedil;a”, brincou o papa.

Em seguida, quando referiu-se à expressão “colocar mais água no feijão”, ele dirigiu-se à plateia. “Se pode colocar mais água no feijão? Sempre”. Depois, no trecho em que falava sobre solidariedade, ele acrescentou que a palavra “quase parece um palavrão”.

Outro trecho não programado no discurso foi quando ele dizia que é preciso ver no outro um irmão e acrescentou: “e todos nós somos irmãos”. Em um momento de grande comoção na plateia, ele falou novamente fora do texto previsto: “Não deixemos entrar no nosso coração a cultura do descartável porque nós somos irmãos. Ninguém é descartável”.

No último improviso, quando dizia que existe “uma fome mais profunda”, o papa acrescentou: “fome de dignidade”. Apesar da chuva e da lama, que afastaram boa parte dos moradores da favela, as pessoas que deixaram suas casas para ver e ouvir o papa aplaudiram várias vezes e lamentaram quando ele disse que falaria uma última coisa e encerrou o discurso.

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