Lula e Chirac evitam falar das crises de Brasil e França

Paris – Os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e da França, Jacques Chirac, recusaram-se ontem, em Paris, a discutir as crises que os dois países atravessam por motivos diversos. Lula, ao dar razão a Chirac, que havia dito não ter o costume de comentar questões de política interna durante reuniões internacionais, acrescentou à resposta uma promessa: ?Os problemas brasileiros tratarei com muito prazer, mas quando chegar ao Brasil?. Lula permanecerá no seu apartamento de São Bernardo do Campo, no Grande ABC (SP), durante o fim de semana.

Durante uma rápida entrevista dos dois líderes para a imprensa, Chirac manifestou mal-estar com uma das perguntas, respondendo com ironia a interrogação de uma jornalista sobre uma reflexão da impopularidade dele e a crise de corrupção no Brasil: ?Vejo que você esteve, particularmente, interessada sobre tudo o que conversamos, os temas e os acordos assinados e que lhe encantam?. Já Lula disse que os três dias passados na capital francesa foram demasiadamente fortes para que se pudesse formular dezenas de perguntas sobre as relações com a França, lembrando que as dificuldades internas francesas seriam tratadas pelo presidente do país depois da partida dele.

Subsídios

Chirac voltou a acusar os Estados Unidos como os únicos culpados pela manutenção dos subsídios agrícolas. Ele reafirmou que a França não mudará ?uma vírgula? o Programa Agrícola Comum (PAC), ao ser perguntado sobre o contencioso entre os dois países, depois de definir como excelentes as relações econômicas atuais entre o Brasil e a França. Para Chirac, a culpa não é da França, nem da Europa, nem do Brasil, mas sim dos EUA.

?Entendo, perfeitamente, a posição do presidente Lula e suas críticas, mas sei que ele entende a posição da Europa, pois há um ano, os europeus decidiram a supressão total dos subsídios à exportação, mas só aplicarão essa decisão na medida que outros grandes países industrializados façam o mesmo. No momento, o que esperamos não é uma decisão já adotada pela Europa, mas sim uma decisão que não foi ainda tomada pelos norte-americanos?, disse. Segundo Chirac, ?os amigos brasileiros esforçam-se hoje para obter dos norte-americanos o mesmo avanço feito pela Europa, pois não trata de um conflito do Brasil com o continente europeu, mas sim entre os Estados Unidos e o resto do mundo?.

Lula declarou que considerava importante o fato de a proposta do G-20 ter sido considerada uma boa base de negociação com os EUA e a Europa. O presidente voltou a citar a experiência de líder sindical para defender a negociação, dizendo que passou a vida negociando acordos salariais e que, às vezes, quando reivindicava um reajuste de 1% e só conseguia 0,5%, era um passo importante. O G-20 reúne ministros das finanças e Bancos Centrais (BCs) dos principais países ricos e emergentes, que representam, juntos, cerca de 90% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial.

Referindo-se a Chirac, considerou normal que cada um defenda o próprio interesse. ?Caminhamos?, de acordo com Lula, ?para defender gestos que permitam que a parte mais pobre do planeta possa participar do mundo econômico em desenvolvimento?. ?Uma hora é o Brasil que não quer ceder e outra hora é a França, mas, de repente, nessa luta de braço, em certo momento, alguém vai ceder?, acredita. Lula está convencido de que as coisas avançam, não na velocidade que gostaria, mas lembrou que se trata de uma política de convencimento. Finalmente, o presidente afirmou achar que poderia voltar para o Brasil dizendo que os países ricos são os culpados e não querem ceder, mas que ninguém cede nada simplesmente por ceder. ?É por isso que queremos conquistar pouco a pouco, convencendo-os da necessidade de ceder.?

Lula acertou, durante reunião com Chirac, a compra de aviões Mirage 2000-C usados para a Força Aérea Brasileira (FAB).

14-Bis

O último compromisso de Lula em Paris foi a visita ao Museu do Ar e do Espaço, em Le Bourget – nos arredores da capital francesa – onde se encontra uma réplica do 14-Bis. Custeada pela Embraer, a cópia do protótipo pioneiro de Santos Dumont, que fez seu primeiro vôo em 23 de outubro de 1906, foi construída em Goiás e doada pelo governo brasileiro ao presidente da França, Jacques Chirac. A partir de agora, ficará exposta no Museu.

Lula chegou acompanhado de seus ministros e foi recebido pelo diretor do museu, Gerard Feldzer, de quem ganhou uma cópia da medalha que Santos Dumont recebeu em 1906 do Aeroclube da França. Lula subiu no 14-Bis e posou para os fotógrafos. O presidente ganhou de Chirac um relógio Cartier, no valor de E$ 10 mil, feito especialmente para o Ano do Brasil na França, que tem no design o brasão da República brasileira. Foi uma edição limitada de 20 exemplares. O número um foi dado ao presidente.

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