Fraude copiava ?anões do Orçamento?

As fraudes reveladas pela Operação Sanguessuga repetem, em sua essência, as que vieram à tona durante a célebre CPI dos Anões do Orçamento, entre 1993 e 94. Como as de hoje, as dos anos 90 consistiam em destinar dinheiro do Orçamento da União para emendas aparentemente inocentes. Verbas para ajudar escolas, fundações beneficentes e associações culturais eram aprovadas – às vezes, quando a versão final do Orçamento já tinha sido votada – e em seguida o dinheiro seguia para a conta bancária dos parlamentares.

A diferença é que a fraude dos anões foi bem mais sofisticada: o comandante do esquema era o próprio presidente da Comissão Mista do Orçamento, o então deputado João Alves (sem partido-BA). Seu auxiliar direto na operação era outro parlamentar veterano, o maranhense Cid Carvalho (PMDB) e os beneficiários eram mais diversificados. Em comum, o objetivo final da operação: desviar para uso privado um volume de recursos que chegou ao equivalente a dezenas de milhões de dólares.

O escândalo veio a público quando o País começava a se recuperar do impeachment do presidente Fernando Collor. Ao final de três meses de trabalho, presidida por Benito Gama (PMDB-BA) e relatada por Roberto Magalhães (PFL-PE), a CPI propôs o indiciamento de 17 deputados e um senador. Seis foram cassados, quatro renunciaram antes e oito foram absolvidos.

Enquanto o esquema funcionou, o mentor da operação, o próprio João Alves, remeteu o equivalente a cerca de US$ 53 milhões para diferentes ?projetos? de seus currais eleitorais na Bahia. Na verdade, tudo ia para suas contas bancárias. Ele sustentava, para explicar tamanha fortuna, que havia ganho na loteria cerca de 100 vezes. Seu imediato Cid Carvalho ?ajudou? uma fundação de Imperatriz, no Maranhão, também sua base eleitoral. Carlos Benevides (PMDB-CE) fez o mesmo com US$ 3,2 milhões durante cinco anos.

Entre outros casos revelados pela CPI estava o de um político fluminense, Fábio Raunheitti, que mandou o equivalente a US$ 14,9 milhões para faculdades particulares dele mesmo, no Rio; e a deputada Raquel Cândido criou uma associação em Goiás para a qual mandou o equivalente a cerca de US$ 800 mil.

Em viagem oficial ao Paraguai, o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), só deverá tratar do assunto no sábado, depois que conhecer oficialmente o processo da Polícia Federal. Na Câmara, no entanto, há suspeitas de que muitos deputados podem estar envolvidos nas denúncias de formação de quadrilha para desviar dinheiro público em licitações fraudulentas para a compra de ambulâncias para as secretarias de Saúde de diversos municípios. Os deputados só podem ser presos em flagrante e em caso de crime inafiançável. Os processos contra eles correm no Supremo Tribunal Federal (STF).

Congresso rejeita idéia de CPI

Brasília (AE) – As denúncias envolvendo parlamentares em mais um esquema de corrupção não devem motivar a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o caso. Entre as razões, estão a desmoralização da Câmara dos Deputados, que já absolveu 10 dos deputados envolvidos no mensalão, e o calendário eleitoral. ?Eu acho difícil nova CPI para apurar essa denúncia até porque, a partir de junho, os deputados já estarão em campanha eleitoral em seus estados?, afirmou o senador Delcídio Amaral (PT-MS), ex-presidente da CPMI dos Correios. Para o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), ex-relator da mesma CPI, a saída seria o Congresso investigar esses parlamentares somente no ano que vem, depois das eleições. ?Este ano eu acho difícil, mas nós podemos fazer isso no ano que vem?, observou.

Mesmo que houvesse tempo hábil e disposição política para realizar as investigações em torno da participação dos parlamentares, há quem duvide da efetividade do processo. O senador Alvaro Dias, líder da minoria no Senado, lembrou que até aqui o Congresso tem realizado com sucesso o trabalho de apurar as denúncias, mas tem sido pouco efetivo no momento de punir os envolvidos. ?A verdade é que o Congresso apura, através de suas CPIs, mas a Câmara dos Deputados acaba absolvendo. Esse Congresso perdeu a credibilidade?, indignou-se o senador.

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