Autoritários ameaçam governo

Brasília – O procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, vê com preocupação o embate, no governo, entre setores comprometidos com a democracia e um grupo com viés fortemente autoritário. Segundo Fonteles, essa contradição do governo está presente em todas as instituições do País, inclusive na família.

Fonteles acredita que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva – que a seu ver "não tem viés autoritário" – ficará ao lado dos segmentos democráticos contra os segmentos reacionários de sua equipe. "Torço para que ele consiga mostrar que o caminho não é esse", disse. Segundo Fonteles, foi o governo – e não a imprensa, como insinuou o ministro interino do Planejamento, Nelson Machado – que produziu "uma tempestade em copo d’água" ao baixar portaria que obriga o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) a entregar 48 horas antes aos ministérios os dados das pesquisas estruturais.

Com isso, a seu ver, o governo deu a falsa idéia de cerceamento da informação. Quanto à tentativa de restrição à divulgação do conteúdo pesquisado, o procurador é radicalmente contra. "Quem se sentir prejudicado que venha a público e coloque sua divergência. Assim se vive a democracia", enfatizou. Em menos de 20 meses de mandato, Fonteles mudou o caráter operacional do Ministério Público, batendo de frente com as estrelas da instituição e imprimindo normas de atuação baseadas na integração e na ampliação de resultados. "Quem é estrela é artista, e nós, no MP, não somos artistas, somos servidores públicos", afirmou. Outra de suas preocupações foi combater uma certa tendência à arrogância. "Na minha instituição, estou mostrando que o útil para a sociedade é não ser autoritário."

Fonteles disse que quando seu mandato terminar no dia 30 de junho próximo não vai disputar a recondução ao cargo. Ele aproveitou também para comentar a afirmação do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Nelson Jobim, de que os membros da Justiça devem servir mais ao cidadão e menos às vaidades pessoais. "Nós todos, membros do Ministério Público e magistrados, temos de ter na cabeça que somos servidores públicos. Não podemos nos sentir acima do público. O magistrado só existe quando provocado, pois não pode agir por si próprio. Aqui e acolá, tanto na magistratura como no MP, há esses espasmos de pessoas que se sentem acima do corpo social. Nós servimos ao corpo social", disse.

Apesar de apontar a existência de pessoas que agem dessa forma, acima do corpo social, ele acredita que este seja um comportamento em extinção. E atribui isto a democratização do País. "Daí eu ser favorável ao Conselho Nacional da Magistratura e do MP (controle externo). Se você vai servir à comunidade, por que você vai temer o parlamento, que representa a comunidade? Não é para invadir a sua convicção. Mas para apontar falhas. Isso propicia o diálogo. Isso é ser republicano. Fazer-se visível para a comunidade", afirmou.

Este não é o caminho

Cláudio Fonteles diz que se mantém otimista mesmo quando o governo federal demonstra a intenção de dar passos no sentido de tentar um controle da sociedade, com iniciativas como a lei da mordaça no Ministério Público e, mais recentemente, a censura prévia à divulgação de pesquisas pelo IBGE. "Eu não atribuo isso ao Executivo como um todo. Em toda instituição – na minha também e até numa família – existe aquele com um viés autoritário e aquele outro adepto do diálogo aberto, que admite o exame da sua conduta", disse ele.

Ele afirma que o governo federal também tem essa contradição, assim como o MP e a instituição familiar. "Existem nele aqueles com viés fortemente autoritário e aqueles que não o têm. Na minha instituição, estou mostrando que o útil é não ser autoritário. Eu torço para que o presidente Lula, que não tem esse viés, consiga imprimir o rumo democrático nos setores da sua equipe com viés autoritário. Acredito que conseguirá mostrar que o caminho não é esse."

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